Uma “bola de neve” para obrigar a sociedade civil a falar sobre o assunto. Em Portugal não existe, segundo os médicos.
A violência obstétrica é real e deve ser abordada pela sociedade civil.
Esse é o foco de ‘Parir’, um documentário que inclui testemunhos de dezenas de alegadas más práticas por parte dos médicos durante partos.
A obra espanhola já estreou. Durante a primeira exibição houve espectadores que não conseguiam ficar quietos, outros emocionaram-se, outros ficaram irritados com o que estavam a ver, relata o jornal El Pais.
Muito provavelmente, entre as mulheres que estiveram a ver, estariam algumas que pensaram: “Eu também passei por isto”.
A violência obstétrica é um acto executado na mulher sem a sua permissão, sem o seu conhecimento e/ou sem o seu consentimento, durante a gravidez, o parto ou o pós-parto; e também a violência física ou verbal que pode acontecer durante a gravidez, o parto ou o pós-parto.
‘Parir’ traz partilhas reais, ao longo de uma hora e meia, com denúncias cruéis (e gráficas) como esta: “Romperam a minha bolsa sem eu saber o que estava a acontecer. De repente começou a entrar muita gente na sala, fiz perguntas mas ninguém respondeu. Sem me avisarem, fizeram a manobra de Kristeller colocaram-se em cima da minha barriga”.
Outra mulher deveria ter falado menos, segundo os médicos: “Você não está a fazer a sua parte, está a começar uma cesariana. Não grite tanto, está a perder forças. Aqui você não grita”.
Outro excerto: “Trataram-me como uma criança pequena. Disseram que eu era uma queixinhas. Nada do que eu disse foi respeitado”.
A realizadora é Cláudia Reig, que demorou quatro anos a parir o ‘Parir’. A ideia inicial era abordar “quatro ou cinco partos” mas o alcance foi muito maior: quando pediram denúncias, só na primeira semana chegaram 150 relatos.
O documentário mostra também os casos que seguiram para tribunal. A advogada Francisca Fernández, que tratou dos processos, também passou por um parto complicado e viveu sob stress pós-traumático durante 4 anos.
As responsáveis pelo documentário esperam ter criado uma “bola de neve” para que o assunto seja abordado por todos: “Há que colocar um nome nesta realidade e há que abordá-la”.
O outro lado
Mas ‘Parir’ também mostra locais onde o parto é mais humanizado e com respeito pela mulher, como o Hospital de La Plana de Castellón.
Nesses “centros de parto”, não há sequer aspecto de hospital: uma casa ampla, medicamentos colocados de forma discreta e camas de casal para as grávidas.
O conselho é chegar ao hospital (ou a casa, se for essa a opção) com “mente aberta”: informada, disponível para receber sugestões mas também pronta para tomar decisões.
Em Portugal
Por cá, o caso já foi abordado publicamente há algum tempo, originando mesmo um movimento e manifestações.
Um cenário semelhante ao de Espanha: o movimento recebeu perto de 200 relatos de violência obstétrica em menos de duas semanas.
Mas, se de um lado fala-se em violência obstétrica, do outro nega-se esse cenário, evocando o pragmatismo médico, a solução imediata mais eficaz quando falta tempo ou quando faltam profissionais – ou ambos.
A Ordem dos Médicos portuguesa diz que “não se deu como provada nenhuma situação de violência obstétrica praticada por médicos em Portugal” e que não há “práticas de intervenções sem indicação médica ou sem consentimento informado”.
É o que dá Portugal, sua medicina da treta e seus médicos vassalos das farmacêuticas viverem ainda na idade média.
Neste como noutros aspectos, tenho orgulho do meu pais, quem não estiver bem, mude-se.