Inspirado em Portugal, o estado norte-americano do Oregon descriminalizou todo o tipo de drogas, em 2020, mas os resultados não foram os esperados: o consumo não abrandou e “as ruas são agora dos traficantes”.
Foi a 29 de Novembro de 2001 que entrou em vigor a lei que abriu a porta às mudanças nas políticas de drogas nacionais.
20 anos depois, o balanço é bastante positivo e, hoje, Portugal é um exemplo a nível mundial.
Em 2001, Portugal tinha o maior rácio de infeções por VIH da União Europeia, com mais de 3000 novos casos por ano, estando quase metade ligados ao consumo de heroína. Quase 1% da população nacional era viciada desta substância.
Dados da Agência Piaget para o Desenvolvimento (APDES) de 2019 apontavam para que o consumo da heroína e da cocaína afetasse apenas 0,3% da população. As infeções por VIH entre os toxicodependentes caíram para metade.
Hoje em dia, a política progressista e inovadora de Portugal é muitas vezes enaltecida nos meios de comunicação estrangeiros – como é exemplo a publicação desta sexta-feira do The New York Times.
Vários políticos de todos os cantos do mundo citam os nossos resultados como argumentos a favor da implementação de propostas semelhantes.
Em 2020, o estado norte-americano do Oregon votou a favor da descriminalização da posse de todas as drogas ilegais, incluindo heroína, cocaína e metanfetaminas, inspirado em Portugal.
Oregon tornou-se, assim, o primeiro estado norte-americano a ter uma lei do género, com uma maioria de 59% dos votantes a favor.
Embora tecnicamente não legalize nenhuma droga, a pena para posse de droga para consumo próprio passou a ser o equivalente legal a uma multa de trânsito. Quem incorrer neste crime tem a opção de pagar 100 dólares (cerca de 90 euros), ou aceitar ser encaminhado para reabilitação de toxicodependência.
Esta legislação aplica-se apenas a quem for apanhado com uma pequena quantidade de droga, para consumo recreativo. Aqueles que forem apanhados com uma maior quantidade, nomeadamente para tráfico, continua a enfrentar pena de prisão.
Quando, em 2020, German Lopez entrevistou os líderes da campanha de descriminalização, o jornalista do The New York Times conta que Portugal era citado com bastante frequência.
Realidades incomparáveis
Portugal prometia pôr Oregon na linha… e foi demasiado longe.
Se cá foi possível criar um sistema único – que é detalhado nesta reportagem da jornalista Adriana Peixoto do ZAP – que incentiva as pessoas a deixar as drogas; Oregon não delineou bem a sua estratégia e não há explicações claras de como a lei funciona.
Em Oregon, a medida começou, desde logo, a ser posta em causa e, como conta German Lopez, os resultados não têm sido bons. As mortes por overdose dispararam, e os consumidores de drogas invadiram espaços públicos em Portland.
“Às quatro da tarde, as ruas parem o centro dos traficantes. Não adianta chamar a polícia”, disse Jennifer Myrle, que tem um café no centro da cidade. Jennifer contou ao The New York Times que vê, frequentemente, seringas, vidro partido, fezes humanas e pessoas desmaiadas.
Em Oregon não há incentivos
“Precisamos de responder à pergunta: Por que razão as pessoas parariam de usar uma droga incrivelmente recompensadora se não há nenhuma consequência real?”, disse Keith Humphreys, um especialista em política de drogas da Universidade de Stanford, ao The New York Times.
Uma parte crucial da mudança em Portugal foi a tentativa de incentivar as pessoas a parar de usar drogas. Foram criados novos incentivos para procurar ajuda: como salas de consumo gratuitas, onde as pessoas são acompanhadas.
A sala assume-se como um espaço de supervisão de consumo injetado, mas é muito mais do que isso: fazem-se também rastreios e testes ao VIH, hepatites virais e sífilis, reencaminham-se os utentes para os serviços de saúde e são dadas consultas de enfermagem e atendimento psicossocial.
Em Oregon, só há multas, mas não resultam. Uma simples chamada telefónica a solicitar uma consulta, sem compromisso de tratamento, pode perdoá-las.
Não há consequências/incentivos reais. Alguns polícias, sabendo que as multas podem ser ineficazes, já nem as emitem – o que resulta num consumo de drogas contínuo.
A mudança em Oregon parece ter vindo a piorar o panorama daquele Estado, em relação ao consumo drogas. No entanto, os defensores da descriminalização, como explica o jornalista German Lopez, argumentam que a política do Oregon precisa de tempo: uma vez que a lei reservou dinheiro para melhorar o acesso ao tratamento de adições e esse dinheiro só foi disponibilizado recentemente.