Fricção quântica. No grafeno, a água consegue “falar” com os eletrões

(dr) carbyneventures.com

Os resultados desta nova investigação podem motivar futuras aplicações em processos de purificação e dessalinização de água e até a computadores à base de líquidos.

Ao contrário de um sólido, que é constituído por átomos organizados numa nuvem de eletrões, a água é constituída por pequenas moléculas que se movem aleatoriamente e colidem constantemente umas com as outras.

No âmbito da Física, os mundos sólido e líquido interagem apenas através de colisões das moléculas do líquido com os átomos do sólido. No entanto, há pouco mais de um ano, um estudo teórico alterou este paradigma, sugerindo que, na interface água-carbono, as moléculas do líquido e os eletrões do sólido se empurram e puxam mutuamente, abrandando o fluxo do líquido.

Este efeito, denominado de “fricção quântica“, não passava da teoria. Até agora.

Um novo estudo – realizado por cientistas do Instituto Max Plank para a Investigação de Polímeros de Mainz (Alemanha), do Instituto Catalão de Nanociência e Nanotecnologia (Espanha) e da Universidade de Manchester (Reino Unido) –, concluiu que a água pode mesmo interagir diretamente com os eletrões do carbono: um fenómeno quântico muito invulgar na dinâmica dos fluidos.

Fricção quântica em ação

A equipa analisou uma amostra de grafeno, uma monocamada de átomos de carbono dispostos em forma de favo de mel, e utilizou impulsos ultracurtos de laser vermelho (com uma duração de apenas um milionésimo de bilionésimo de segundo) para aquecer instantaneamente a nuvem de eletrões do material.

Depois, monitorizou o seu arrefecimento com impulsos de laser terahertz, que são sensíveis à temperatura dos eletrões do grafeno.

Para sua surpresa, a nuvem de eletrões arrefeceu mais rapidamente quando o grafeno foi imerso em água, enquanto que a imersão do grafeno em etanol não fez qualquer diferença na taxa de arrefecimento.

“Isto foi mais uma indicação de que o par água-carbono é de alguma forma especial, mas ainda tínhamos de perceber o que se passava exatamente”, explicou Nikita Kavokine, do Instituto Max Planck, citada pelo SciTechDaily.

Uma das explicações plausíveis é que os eletrões quentes empurram e puxam as moléculas de água para libertarem parte do seu calor. No fundo, arrefecem por fricção quântica.

Acreditando no potencial desta teoria, os cientistas aprofundaram-na e concluíram que a fricção quântica entre a água e o grafeno pode mesmo explicar os mais recentes dados experimentais.

O que torna a água especial, neste caso, é o facto de as suas vibrações (hidrões) estarem em sincronia com as vibrações dos eletrões do grafeno (plasmões), fazendo com que a transferência de calor grafeno-água seja reforçada através de um efeito conhecido como ressonância.

As experiências confirmam assim o mecanismo básico da fricção quântica sólido-líquido, um avanço que poderá ter implicações nos processos de filtração e dessalinização, nos quais a fricção quântica poderá ser utilizada para ajustar as propriedades de permeação das membranas nanoporosas.

“O nosso sonho é ligar e desligar a fricção quântica”, completou Kavokine. “Desta forma, poderíamos conceber processos de filtragem de água mais inteligentes e até computadores à base de fluidos.”

O artigo científico foi recentemente publicado na Nature Nanotechnology.

Liliana Malainho, ZAP //

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