Entraram em vigor esta quarta-feira alterações à lei que regula o direito ao protesto no Reino Unido, que agora prevê penas de prisão para quem perturbar a circulação pública. O Governo garante que o timing nada tem a ver com a coroação de Carlos III.
Grupos anti-monarquia que estão a planear protestos pacíficos durante a coroação de Carlos III estão a receber cartas do Governo britânico a explicar que podem incorrer em crimes, devido a uma nova lei de ordem pública que dá mais poder à polícia.
O Ministério do Interior britânico enviou uma carta ao grupo Republic onde afirma que as novas regras foram implementadas para evitar a “perturbação de eventos desportivos e culturais importantes”.
As mudanças à lei foram aprovadas esta terça-feira pelo rei e implicam que, a partir de hoje, os manifestantes que bloqueiem a circulação normal em estradas, aeroportos e ferrovias possam ser condenados a uma pena de prisão efectiva que pode chegar aos 12 meses.
Quem se prender a outras pessoas, a objectos ou a edifícios pode também ser preso durante seis meses ou ter de pagar uma multa sem valor limite. A polícia vai também poder desviar os protestantes se suspeitar que estes vão instaurar o caos.
O Governo garante ainda que o timing da entrada em vigor da nova lei é uma coincidência e que nada tem a ver com a coroação de Carlos III, marcada para o próximo sábado, dia 6 de Maio. Inicialmente, esperava-se que as mudanças entrassem em vigor apenas em Junho.
Uma fonte com conhecimento das discussões entre o Governo e a polícia contraria esta versão e revela ao The Guardian que a coroação foi um factor que levou a que a legislação fosse antecipada. “Acho que sim, e a Just Stop Oil tem estado bastante activa em Londres recentemente”, afirma.
Graham Smith, líder do grupo Republic, considera que a carta é “muito estranha”. “Mantivemos contato directo com responsáveis da polícia e reunimo-nos com os comandantes superiores, com quem deixamos muito claro o que pretendemos fazer. A resposta deles é que eles estão felizes por continuarmos. Mas esta carta veio do nada”, afirma. O activista afirma ainda que o grupo já contactou advogados que “concordam que soa a intimidação“.
O Republic está a organizar protestos sob o lema “Not My King” — “Não é o meu rei” — para este sábado, incluindo um nas imediações da estátua do rei Carlos I, que foi decapitado em 1649 e cuja morte deu origem a uma curta República no país.
Jun Pang, membro da organização Liberty, acusa o Governo de “fugir ao escrutínio e à responsabilidade”.
“É preocupante ver a polícia a ter tantos novos poderes para restringir os protestos, especialmente antes de um grande evento nacional. Quando a lei entrou em vigor, a polícia fez mau uso dela repetidamente – em parte porque simplesmente não a entendia. Da mesma forma, quando a rainha Isabel morreu, vimos a polícia a agir de uma maneira inadequada e pesada que violou os direitos dos manifestantes”, aponta.
Recorde-se que, já durante as proclamações do rei Carlos III, dois manifestantes anti-monarquia foram detidos — um por ter gritado “quem o elegeu?” e outro por ter um cartaz com a mensagem “que se f*** o imperialismo, abolição da monarquia”. As detenções foram amplamente criticadas e a polícia foi acusada de violar o direito à liberdade de expressão dos protestantes.