Um investigador acredita ter redescoberto o sílfio, uma planta que se acreditava ter sido levada à extinção há quase 2 mil anos.
Sílfio era uma planta de origem norte-africana, que foi muito usada na Antiguidade Clássica, especialmente na cosmética, na culinária e na medicina. A espécie não foi identificada pela botânica moderna e crê-se que se encontre extinta. Ou, pelo menos, era o que se pensava.
Graças a um feliz encontro há quase 40 anos, e décadas de investigação, um professor da Universidade de Istambul suspeita ter redescoberto os últimos resquícios da antiga planta mais de mil anos depois de ter desaparecido dos livros de História, e quase a mil quilómetros de onde cresceu, escreve a National Geographic.
A planta era um produto essencial no comércio e na economia da cidade líbia de Cirene, no Norte da África, tanto que foi cunhada em moedas do período para demonstrar a sua importância.
Praticamente todas as partes do sílfio eram valiosas. O caule e as raízes eram comestíveis, atuando também como conservantes. Carneiros e ovelhas que consumissem sílfio teriam carne mais tenra. As flores eram usadas na produção de perfumes. E a seiva desidratada poderia ser utilizada em temperos e até afrodisíacos.
Era um dos produtos mais procurados no mundo mediterrâneo. Para os médicos gregos, era uma cura para tudo, desde as dores de estômago até à remoção de verrugas. Para os chefs romanos, era crucial para temperar pratos. Durante o reinado de Júlio César, planta foram estocadas ao lado de ouro nos tesouros imperiais de Roma, e as suas folhas tinham o mesmo preço da prata.
Plínio, o Velho, afirmou que o imperador Nero consumiu o último talo de sílfio.
Mahmut Miski, da Universidade de Istambul, viu pela primeira vez a planta moderna que agora acredita ser o antigo sílfio enquanto fazia a sua investigação de pós-doutoramento há 38 anos. Miski recebeu uma bolsa para recolher espécimes de Ferula, um género de plantas com flores de uma família (Apiaceae) que inclui cenoura e salsa, e tem a reputação de produzir novos compostos de combate a doenças.
A investigação do professor acabou por revelar que apenas um outro espécime desta planta tinha sido recolhido – em 1909, num local 150 milhas a leste do Monte Hasan, onde Misk encontrou o seu exemplar – e foi posteriormente identificado como uma nova espécie: Ferula drudeana.
As análises do extrato da raiz identificaram 30 metabólitos secundários. Entre os compostos, muitos dos quais têm propriedades de combate ao cancro, anticoncecionais e anti-inflamatórios, está a shyobunona, que atua nos recetores benzodiazepínicos do cérebro e pode contribuir para o cheiro inebriante da planta.
Miski acredita que futuras análises da planta revelarão a existência de dezenas de compostos de interesse médico ainda não identificados.
“Encontram-se os mesmos produtos químicos em alecrim, alcachofra, sálvia e gálbano, outra planta Ferula”, explica o professor, citado pela National Geographic. “É como se combinasse meia dúzia de plantas medicinais importantes numa única espécie”.
Só numa nova visita ao Monte Hasan, em 2012, é que Miski começou a refletir sobre as semelhanças entre a planta que encontrou e o sílfio, sobre a qual tinha lido em antigos textos botânicos.
Num artigo publicado em 2021 na revista Plants, Miski descreveu as semelhanças entre o sílfio e Ferula drudeana: raízes grossas e ramificadas; folhas basais; um talo sulcado com cachos circulares de flores; folhas semelhantes a aipo; e frutas em forma de coração invertido.
Dizia-se que o sílfio original apareceu de repente, após uma grande chuva. Miski observou que, quando as chuvas chegaram à Capadócia em abril, Ferula drudeana brotou do solo, crescendo até 1,80 metros em pouco mais de um mês.
Embora a Ferula drudeana seja a planta que mais se aproxima das descrições do sílfio, há um problema. Antigas descrições sugeriam que o melhor sílfio vinha exclusivamente de uma estreita zona em Cirene, atualmente território líbio.
Por sua vez, o Monte Hasan está quase 1.300 quilómetros a nordeste.
Miski especula que há cerca de 2.000 anos, um comerciante ou agricultor grego tentou plantar sementes de sílfio que lhe tinham sido enviadas do norte da África.
“Como leva pelo menos dez anos para amadurecer, podem ter plantado e depois terem-se esquecido. Mas a planta continuou a crescer na natureza e acabou por povoar essa pequena área”, acredita o especialista. “Os descendentes dos agricultores originais não saberiam o que raio seria aquilo”.