A seca está a atingir os rios europeus, ameaçando as cadeias logísticas, a produção de energia e a agricultura, num momento em que a guerra na Ucrânia provocou escassez de matérias-primas e encareceu o abastecimento.
Segundo uma reportagem da Bloomberg divulgada esta quarta-feira, que cita dados do Eurostat, os rios europeus transportam uma tonelada de bens por cada europeu a cada ano. Agora, os barcos já mal conseguem passar no Reno nem no Danúbio.
A seca já tinha afetado o Reno – por onde passam carregamentos de carvão que fornecem indústrias da Europa central – em 2018. Mas o cenário atual é inédito e vai ultrapassar em custos o impacto negativo de 5 mil milhões de euros da altura, disseram à publicação agentes envolvidos no transporte.
De acordo com a reportagem, com o nível das águas mais baixo os barcos não podem levar tanta carga, havendo zonas que já não estão navegáveis. Essa realidade faz disparar os custos de transporte, em máximos desde 2021.
A comunidade científica tem avisado que o Reno vai tornar-se cada vez mais intransitável devido às alterações climáticas. Mas a substituição do rio pelas vias férreas ou pelo transporte rodoviário não é uma solução imediata, dada a falta de capacidade da primeira hipótese e a falta de motoristas de pesados na segunda.
Já no Danúbio procede-se a desassoreamentos de urgência na Bulgária, Roménia e na Sérvia para que barcos com matérias-primas como carvão possam passar. E em França, as ondas de calor impediriam que as centrais nucleares operassem para evitar descargas de águas a altas temperaturas nos rios.
Rios como o Ródano e Garona estão demasiado quentes mas isso não impede que sejam feitas descargas que, segundo a agência Reuters, podem ameaçar ecossistemas fluviais.
The water level of the Rhine River in 🇳🇱 Dutch territory is close to its lowest point
➡️Problems are already being reported for shipping 🛳️and agriculture 🚜
⬇️The water shortage 🚱 is visible when comparing #Sentinel2 🇪🇺🛰️images of ↙️ 2021 and ↘️ 2022 pic.twitter.com/aJ2cbaz98e
— 🇪🇺 DG DEFIS #StrongerTogether (@defis_eu) August 5, 2022
Em Itália, o Pó não tem caudal suficiente para garantir cultivo de arroz, de milho e de girassol e a lagoa de Veneza já não consegue manter as condições para a existência de oxigénio suficiente para a produção de amêijoas e mexilhões, pondo em risco 2300 postos de trabalho relacionados com a pesca.
Em Portugal se vive uma situação de seca que as autoridades admitem ser a pior dos últimos 100 anos, cenário que tem levado o Governo a tomar medidas ao nível de apoios financeiros, monitorização e restrições no uso da água.
Segundo o Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA), 67,9% do território português está em seca severa, 28,4% em seca extrema e 3,7% em seca moderada, sendo este o ano mais seco desde que há registos (1931). Mesmo nos meses do último inverno, todo o país esteve em seca.
Seca revela objetos e restos humanos
A seca tem também revelado o que estava submerso no fundo dos rios e dos lagos. Ainda no rio Pó, uma bomba não detonada da Segunda Guerra Mundial foi exposta recentemente. O engenho explosivo de 450 quilos foi encontrado por pescadores nas margens, perto da vila de Borgo Virgilio, na Lombardia, em julho.
“A bomba foi encontrada por pescadores na margem do rio Pó devido à diminuição do nível das águas causada pela seca”, disse o coronel Marco Nasi, em declarações à agência Reuters.
Já no Lago Mead, no Nevada (Estados Unidos), atingido pela seca extrema, um terceiro conjunto de restos humanos foi encontrado recentemente, quando os níveis de água caíram para mínimos históricos.
Em maio deste ano foi encontrado o primeiro corpo. Se tratava, provavelmente, de uma vítima de homicídio – baleada na cabeça, colocada num barril e atirada ao lago. Uma semana depois, duas irmãs encontraram outros restos mortais.