Desde cartas enviadas no Natal a confissões de devoção a Hitler. As cartas dos soldados nazis durante a II Guerra Mundial revelam o lado mais humano dos combatentes.
Apesar de alguns soldados nazis da II Guerra Mundial terem assassinado dezenas de judeus a sangue frio ou executado prisioneiros de guerra, eram muito mais do que apenas um uniforme com uma suástica.
Estes seres humanos também sofriam cada vez que se lembravam que estavam longe da sua família e amigos.
O ABC reuniu um conjunto de cartas destes combatentes, sendo que uma das mais chocantes foi enviada por um soldado da 16.ª Divisão de Infantaria, chamado Hugo D., à sua filha depois do Natal.
“Como foi em Frankfurt, longe de mim? Divertiste-te? Só posso dizer que foi maravilhoso. […] No entanto, ainda estamos separados. Minha amada, chegará o dia em que nos voltaremos a ver, em que vos tomarei pela mão, vos direi que estou de volta e prometo que nunca mais estarei longe de vós, que a paz chegou e que podemos finalmente ser felizes”, lê-se na missiva emotiva.
Nesta altura, Adolf Hitler tinha lançado uma das maiores guerras da História, usando como arma o ódio que nutria pelos judeus. O ditador, que era um excelente orador, conseguiu suscitar admiração entre os cidadãos e os seus soldados.
Hugo não foi exceção e dedicou uma das suas últimas frases a Hitler e à sua causa: “Meu amor, concordarás comigo que só teremos o direito de falar de paz quando tivermos vencido. […] E é por isso que devemos concentrar todos os nossos esforços na vitória. Quanto mais firme for a nossa vontade de vencer, tanto mais a nossa vontade de vencer será a vitória.”
Perto de Hans, em França, Kurt M., um soldado de 26 anos que servia na 68.ª Divisão de Infantaria como enfermeiro, também escreveu uma carta.
A missiva era dirigida à sua mãe, que vivia numa casa perto do Mar do Norte. Nela, e à semelhança de Hugo D., deixou claro o respeito que sentia pelo seu líder.
“Sim, Adolf sabia o que estava a fazer! É único. Para nós, é realmente uma sorte que nenhum outro país tenha outro como ele. O que achou do discurso? Nós ficámos sem palavras. […] Nos próximos dias tudo começará de novo. A única coisa de que tenho pena é da população inocente, mas desta vez não haverá clemência”, escreveu.
Outros soldados, como o Heinz R., do 93.º Regimento de Infantaria, evitaram falar de Hitler e limitaram-se a recontar os acontecimentos do seu dia-a-dia e a demonstrar o amor que sentiam pelas suas companheiras.
“Minha querida Úrsula. Acabei de resolver os assuntos do meu serviço (mais mal do que bem) e corro para te dar notícias. […] Vou precisar de muito tempo para esquecer a vida militar […] Lamento sinceramente que não possas vir ver-me. Nas atuais circunstâncias, é praticamente impossível”, começa o soldado.
“Suponho que terás feito algum curso de costura e, acima de tudo, que estejas a praticar piano a fundo. Deves encontrar algum tempo livre para ti fora das tarefas domésticas. […] Como tenho ansiado estes últimos dias para que a guerra termine! Cuida bem de ti, minha amada, com todo o meu amor.”
Nem todas as cartas eram positivas. O exemplo de uma desoladora é a de Gottfried F., enviada em 1945 à sua irmã, depois de ter recebido a triste notícia de que ambos os seus pais tinham morrido.
“Ao escrever-te esta carta, querida irmã, quero muito perguntar-te como está o meu filho ou o que está a fazer a mãe. Tudo o que ela conheceu na sua vida foi trabalho e preocupação e em troca disso teve de morrer algures, provavelmente em circunstâncias terríveis. Ou quero falar-te do pai, que nunca sequer imaginou que a guerra assumisse esta forma”, lê-se na missiva.
“Espero que quando, quando aquele veículo blindado russo o atropelou, a sua morte não tenha sido demasiado dolorosa“, rematou o soldado.
Não sei bem qual a razão, mas sempre que surgem este tipo de cartas, geralmente revelam alguma capacidade de redação dos seus autores. As prosas são escorreitas e algumas até roçam a arte.
Imagino como seria a carta redigida por um qualquer soldado Português.
“Maria… isto por aqui tem cido do carvalho. Eles andem aí atraz de nós e nós atraz deles. Por aí, tá tudo? O pai e a mãe, ainda mechem? Devo boltar pelo Natal para comer o bacalhão ou então na Páscoa para comer as amandoas. Porta-te”