Milhares de polacos têm-se manifestado, nos últimos dias, contra a proibição quase total do aborto, quando as leis do país estavam já entre as mais restritivas da União Europeia.
Na última quinta-feira, o Tribunal Constitucional polaco declarou inconstitucional a interrupção voluntária da gravidez no caso de mal formação grave do feto, decisão contestada pela oposição liberal e por organizações de defesa dos direitos das mulheres.
A sentença restringe o direito ao aborto se houver ameaça à vida da mulher ou em casos de gravidez resultante de violação ou incesto.
O Constitucional respondeu desta maneira a uma ação apresentada há três anos por um grupo de deputados do partido nacionalista ultra-católico no poder, Direito e Justiça (PiS). Os autores consideravam que o aborto por malformação do feto é uma forma de eugenia que não a dignidade humana e, por isso, não podia ter lugar na Constituição.
O Presidente polaco, Andrzej Duda, próximo do PiS, defendeu a decisão do Constitucional, enquanto fontes da Conferência Episcopal consideraram o acórdão consistente com um país onde a população é maioritariamente católica.
Nos últimos dias, os manifestantes têm desafiando a proibição de ajuntamentos decretada pelo Governo no âmbito da luta contra a pandemia de covid-19. Segundo a rádio Renascença, algumas manifestações tornaram-se violentas em algumas cidades e em vários locais os manifestantes concentraram-se diante de igrejas, sendo que alguns deles conseguiram mesmo entrar.
De acordo com o Diário de Notícias, os manifestantes exigem um referendo sobre o direito de interromper a gravidez em caso de malformações e prometeram bloquear o trânsito em todo o país esta segunda-feira.
A decisão aprofunda agora a polémica à volta do poder judicial polaco, fortemente questionada na sequência da reforma promovida pelo PiS, que tanto a oposição como a Comissão Europeia consideram um atentado à separação de poderes.
Bruxelas abriu um processo de sanção por considerar que esta reforma reduz a independência do poder judicial. À frente do tribunal ficou a juíza Julia Przylebska, por indicação do PiS.
A lei do planeamento familiar, proteção do feto humano e condições para a interrupção da gravidez, vigente desde 1993 na Polónia, permitia o aborto só em três pressupostos: malformação do feto, violação ou perigo de saúde para a mãe.
Segundo dados do Ministério da Saúde, em 2019 foram realizados na Polónia (com quase 38 milhões de habitantes) 1110 abortos legais. Entre estes, a maioria (1077), ou seja, 96%, foi devido à malformação do feto.
ZAP // Lusa