Milhares de manifestantes bloquearam esta terça-feira os acessos ao parlamento do Líbano, obrigando a adiar novamente a análise de várias leis, como a que prevê uma amnistia a quem tem impostos em dívida, contestada por agravar a corrupção do país.
A sessão parlamentar para debate das propostas legislativas estava agendada para esta terça-feira, apesar de o país não ter ainda Governo, na sequência da demissão do primeiro-ministro devido às manifestações sem precedentes que se registam no Líbano desde meados de outubro, noticiou a agência Lusa.
“A sessão foi adiada para uma data a ser determinada posteriormente”, anunciou um responsável do parlamento, Adnane Daher, através de um comunicado lido frente às câmaras de televisão.
Adnane Daher alegou que o parlamento não conseguiu reunir o quórum necessário e disse que “as atuais condições excecionais, sobretudo de segurança”, impediram os deputados de manter a agenda. O Líbano vive desde 17 de outubro um levantamento sem precedentes para exigir a saída do conjunto da classe política, praticamente a mesma há décadas e considerada corrupta e incapaz de acabar com a profunda crise económica.
Nesta terça-feira de manhã, os manifestantes ocupavam as ruas e avenidas que dão acesso à praça onde se situa o parlamento e, perante forças de segurança reforçadas, gritavam insultos e batiam em panelas.
No entanto, o disparo de tiros de aviso pela polícia provocou a fúria dos manifestantes, que avançaram na sua direção. Estes tentavam passar as barreiras das forças policiais, que os impediam de chegar à praça, e gritavam “revolução, revolução”, ao mesmo tempo que empunhavam bandeiras libanesas.
A proposta de lei de amnistia geral foi lançada já num contexto de contestação geral à classe política, classificada como altamente corrupta. Se for aprovada, implicará um perdão das dívidas de milhares de pessoas e permitirá libertar outras condenadas ou suspeitas de desviar fundos ou de crimes ambientais.
Tecnicamente, isso seria possível porque a amnistia abrange todos os crimes exceto aqueles especificamente excluídos, explicou à AFP a organização especializada em questões jurídicas Agenda Legal. De acordo com a organização, a lei constitui “um grande perigo” porque inclui “crimes de funcionários corruptos”.
A sessão parlamentar desta terça-feira também deveria analisar uma proposta de lei para criar um tribunal especializado em crimes financeiros e na administração de fundos públicos. O texto prevê que os juízes sejam nomeados pelo parlamento, o que põe em causa a sua independência e prejudica a separação de poderes, explicou a Agenda Legal.
Apesar de a crise no Líbano já durar há mais de um mês, a solução política não parece estar mais perto, já que o primeiro-ministro, Saad Hariri sucumbiu à pressão dos protestos e demitiu-se, em 29 de outubro, e as consultas parlamentares necessárias para formar um novo Governo nem sequer começaram ainda.
As dificuldades económicas e a dívida pública do Líbano levaram também os bancos a fazer restrições ao levantamento de dinheiro, o que aumentou a contestação. Num primeiro momento, os clientes começaram por insultar os funcionários dos bancos, mas rapidamente passaram para protestos e denúncias do sistema bancário, impedindo a abertura dessas instalações.
Face a isto, esses funcionários resolveram entrar em greve durante uma semana, que durou até a manhã desta terça-feira, altura em que os bancos reabriram sob medidas de segurança reforçada, mas enfrentando a contestação de milhares de manifestantes.