Líder do Montepio: “Ganho muito bem”, mas não há dinheiro que pague “tudo o que tenho sofrido”

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António Cotrim / Lusa

O presidente do Montepio Geral – Associação Mutualista, António Tomás Correia

O presidente da Associação Mutualista Montepio Tomás Correia reconhece que ganha “muito bem” mas diz que não há dinheiro que pague tudo o que tem sofrido. Sobre as investigações judiciais, garante que não recebeu 1,5 milhões de euros do construtor José Guilherme.

O presidente da Associação Mutualista Montepio, Tomás Correia, considera que os processos judiciais que o envolvem não têm fundamento, garantindo que nunca deu créditos de favor e não recebeu 1,5 milhões de euros do construtor José Guilherme.

Sobre o seu salário, que está ao nível de banqueiro, admite ganhar “muito bem”, mas vinca que não há dinheiro “que pague tudo o que tem sofrido” nos últimos anos à frente da instituição.

“Não tenho grandes dúvidas que aquilo não tem o mínimo de fundamento adequado para resultar em algo que me penalize a mim e às pessoas visadas. Tenho uma grande tranquilidade”, disse Tomás Correia, em entrevista à agência Lusa, sobre investigações do Banco de Portugal sem querer referir-se concretamente às acusações de que é alvo.

Nos últimos anos, foi noticiado o envolvimento do presidente da Associação Mutualista Montepio Geral em processos em investigação na Justiça e em análise no Banco de Portugal por eventuais irregularidades no Montepio.

Segundo a imprensa, é investigado no Banco de Portugal por financiamento ao Grupo Espírito Santo e ao filho de José Guilherme pela não introdução dos procedimentos necessários ao controlo de movimentos financeiros ilícitos.

É ainda suspeito de ter recebido 1,5 milhões de euros do construtor civil José Guilherme (o mesmo que deu 14 milhões a Ricardo Salgado, ex-presidente do BES).

Sobre esta acusação, Tomás Correia disse estar “tranquilo, sem nenhuma preocupação”, e negou ter recebido 1,5 milhões do construtor: “Não recebi, não“.

Acrescentou ainda que os financiamentos feitos a José Guilherme correram sempre bem: “Não tenho informação de que alguma coisa, no quadro das relações com esse cliente, tenham corrido mal do ponto de vista do cumprimento”.

Sobre o financiamento à Rio Forte, empresa do Grupo Espírito Santo, Tomás Correia disse que o “Montepio foi a única instituição bancária que recebeu a totalidade do crédito”, já no âmbito da liquidação daquela empresa no Tribunal do Luxemburgo, o que considera que prova que fizeram “as coisas bem”.

Questionado sobre as acusações de que enquanto presidente da Caixa Económica Montepio Geral deu créditos de favor, com garantias pouco sólidas e que se revelaram prejudiciais para o grupo, Tomás Correia negou.

Eu nunca fiz créditos de favor na Caixa Económica, sempre respeitei o modelo de governo ao nível da origem dos créditos. Tenho dúvida de que algum dia algum departamento, responsável de departamento, diretor, possa dizer que eu interferi no sentido de alguma operação ser encaminhada desta ou determinada maneira”.

“Trabalho na banca há muitos anos e sei que quando o presidente ou administrador se interessa por uma operação é porque tem alguns condimentos que a levam a que corra mal”, afirmou.

O que pode acontecer é “correrem mal” créditos que pareciam bom negócio, justificou, argumentando que a banca é uma atividade de risco.

Sobre a compra do Finibanco em 2010, por 341 milhões de euros, que críticos de Tomás Correia no Montepio dizem ter sido feita acima do preço que valia, o presidente da mutualista voltou a defender o negócio.

Tomás Correia considera que o preço foi adequado e que a compra daquele banco serviu para a Caixa Económica se preparar para as dificuldades que advieram, uma vez que até então estava demasiado concentrada no negócio imobiliário e diversificou para maior apoio financeiro às empresas.

“Alterou a estrutura de balanço da CEMG e hoje percebe-se perfeitamente que, em 2012 e 2013, se o Montepio não tivesse comprado o Finibanco tinha um produto bancário negativo, porque tinha margem financeira negativa e as comissões não chegavam para cobrir”, afirmou.

Sobre se o negócio não serviu para beneficiar alguns interesses, de empresas a pessoas individuais que tinham interesse em vender Finibanco e encaixar dinheiro, afirmou que o “preço foi justo face às condições de mercado em 2010“.

“Não podemos tentar reescrever a história. Não tenho dúvida de que a história tinha sido diferente e para pior se não tivéssemos feito essa operação”, vincou.

Tomás Correia disse ainda que não houve financiamentos para José Guilherme ou outras pessoas da sua família comprarem parte das 200 milhões de Unidades de Participação do Fundo de Participação Caixa Económica Montepio Geral e que o Montepio “não precisava dessa subscrição para fazer a emissão com êxito”.

O presidente da mutualista viu ainda o seu nome envolvido em outro processo, desta vez relacionado com a venda dos terrenos das Colinas de Vale Meão, em Coimbra, mas no final de 2017 o tribunal de Viseu decidiu não levar a julgamento os 14 arguidos do processo justificando a decisão de não pronúncia de qualquer um dos arguidos com o facto de não existirem “indícios da verificação dos crimes” de burla e de insolvência dolosa.

Não há dinheiro que pague “tudo o que tenho sofrido”

“Para mim, em termos anuais, depois de pagar os meus impostos, dará um rendimento na ordem dos 11 mil euros, que é quanto eu ganho líquido por mês, vezes 14 meses”. E reconheceu ainda: “Obviamente que eu não me queixo do salário e considero que ganho muito bem”.

Contudo, “muita gente se devia questionar, [tendo em conta] aquilo que tenho enfrentado ao longo dos últimos anos, se há algum dinheiro, ou se um dinheiro desta dimensão, que pague tudo o que tenho sofrido”, vincou o responsável, aludindo às polémicas em que tem estado envolvido, nomeadamente por ser arguido em processos.

“Sobretudo o que foi preciso de determinação, de sacrifício físico, para poder defender esta instituição e hoje podermos dizer que passámos uma das maiores hecatombes do sistema financeiro em Portugal do último século”, adiantou Tomás Correia.

No final de setembro, o jornal Público noticiou que, em 2017, os encargos anuais do grupo Montepio com os administradores executivos da Associação Mutualista (cinco) e da Caixa Económica Montepio Geral (sete) foram de quase oito milhões de euros, valores que envolviam as remunerações, mas também verbas destinadas a pensões futuras.

O Público precisava que, no ano passado, Tomás Correia ganhou cerca de 30 mil euros por mês. Na entrevista à agência Lusa, a propósito do fim de mandato dos órgãos sociais, dadas as eleições marcadas para 07 de dezembro, Tomás Correia afirmou não ter outras regalias além do salário.

“Não há cartões de pagamento e utilizo o carro nos meus trabalhos de serviço, levo-o e trago para casa”, indicou. O líder da Associação Mutualista Montepio deu também conta de que, quando assumiu a presidência da instituição há 10 anos, eliminou “todo e qualquer pagamento além dos 14 meses” de salários.

Ainda assim, manteve os valores de salário base dos administradores: “O salário base no Montepio é exatamente aquele que existia para o presidente e para os administradores quando eu lá cheguei. Tenho exatamente o mesmo salário base que tinha o Dr. Costa Leal e que depois teve o Dr. Silva Lopes”.

Além do salário, havia “outros pagamentos” como “uma verba de 11% sobre o salário normal, que era feita em abril, e depois um prémio na linha daquilo que também era concedido a todos os trabalhadores do Montepio”, o que permitia aos administradores receber “entre 17 a 18 meses de salário por ano”, indicou Tomás Correia.

Assegurando que nada disso existe hoje, o responsável notou que a eliminação de tais pagamentos foi “uma antecipação” aos problemas da banca. “Quando toda a gente não ligou a isso, nós eliminámos tudo aquilo que eram benefícios“, adiantou Tomás Correia, falando numa “perda líquida brutal” para os executivos.

A Associação Mutualista Montepio Geral, com mais de 600 mil associados, é o topo do grupo Montepio e tem como principal empresa subsidiária a Caixa Económica Montepio Geral, que desenvolve o negócio bancário.

// Lusa

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