Proteína implicada na doença de Alzheimer tem uma vida dupla

Proteína implicada na doença de Alzheimer contribui para o desenvolvimento normal das sinapses no início da vida, e para o seu declínio no envelhecimento

A função do cérebro é regulada por sinapses que estabelecem a comunicação entre os neurónios.

Agora, um novo estudo, publicado na revista científica Aging Cell, descobriu uma função dupla para uma proteína implicada na doença de Alzheimer que regula a atividade das sinapses neuronais no início da vida e no envelhecimento.

O estudo foi liderado por Luísa Lopes, investigadora principal no Instituto de Medicina Molecular João Lobo Antunes (iMM; Portugal) e Paula Pousinha, investigadora da Université Côte d’Azur (IPMC, CNRS, França), e

A comunicação entre os neurónios nas sinapses é levada a cabo através da ação de neurotransmissores, moléculas que são libertadas de um neurónio e capturadas no outro por recetores especializados.

A proteína precursora do amilóide (APP, na sigla em inglês), que está envolvida na doença de Alzheimer, é conhecida por regular a atividade de recetores, nomeadamente os que respondem a um neurotransmissor denominado glutamato, e que são críticos para o desenvolvimento de um tipo específico de sinapses – as sinapses glutamatérgicas.

P. Pousinha, J.Ralão-Saraiva, L.Lopes et al / Aging Cell

Este tipo de sinapses é o mais comum no hipocampo, uma área do cérebro particularmente importante para a memória e a região que os investigadores estudaram neste trabalho.

“Utilizando ratinhos como organismo modelo, descobrimos que a APP atua de duas formas distintas dependendo da fase da vida“, explica Luísa Lopes.

“No início da vida, a APP na sua forma completa, interage com os recetores e altera a sua atividade sináptica, contribuindo provavelmente para a maturação e função normal das sinapses”, acrescenta a investigadora.

“Em ratinhos idosos, a mesma APP é processada em fragmentos mais pequenos que afetam negativamente a função dos recetores e, consequentemente, a função das sinapses”, diz a co-autora do estudo.

Mais relevante é que encontrámos um padrão semelhante no processamento da APP no cérebro de pacientes idosos, o que pode indicar que estes fragmentos poderão também estar envolvidos na disfunção sináptica em humanos”, explica por seu turno Joana Saraiva, primeira autora do estudo e estudante de doutoramento no laboratório de Luísa Lopes.

“Embora a proteína APP esteja presente em todos os cérebros, na doença de Alzheimer há uma acumulação patológica dos fragmentos derivados da APP”, acrescenta a investigadora.

“A disfunção sináptica que observamos no envelhecimento pode ser ainda mais relevante no contexto desta doença. Mais importante ainda, este mecanismo pode explicar porque é que algumas mutações encontradas na APP, que reduzem o seu processamento, parecem proteger os doentes da doença de Alzheimer“, detalha Joana Saraiva.

“Isto também pode explicar porque alguns medicamentos que normalizam a função dos recetores de glutamato, que demonstrámos serem modulados pela APP, têm alguma eficácia no tratamento da doença de Alzheimer”, acrescenta Paula Pousinha, colíder do estudo e antiga aluna do iMM.

Este estudo sinaliza a importância de manter a função e processamento desta proteína controlados ao longo da vida.

Se numa fase pós-natal, a APP é importante para o desenvolvimento saudável das sinapses, no envelhecimento a APP contribui para o declínio da função cerebral através de um mecanismo diferente.

A compreensão destes mecanismos é importante para definir estratégias para modular esta proteína, tentando agir sobre os seus impactos negativos no cérebro idoso e na doença de Alzheimer.

ZAP // iMM

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