Quando a sonda New Horizons passou por Plutão em 2015, uma das muitas características fascinantes que as suas imagens revelaram foi que esse mundo pequeno e gelado no Sistema Solar distante tem uma atmosfera nublada.
Agora, novos dados ajudam a explicar como a neblina de Plutão é formada a partir da fraca luz do Sol, a cerca de 6 mil milhões de quilómetros de distância, enquanto se move numa órbita invulgar.
Observações remotas de Plutão pelo telescópio aéreo da NASA, SOFIA (Stratospheric Observatory for Infrared Astronomy), mostram que a fina neblina que envolve Plutão é feita de partículas muito pequenas que permanecem na atmosfera por longos períodos de tempo, em vez de caírem imediatamente para a superfície.
Os dados do SOFIA esclarecem que estas partículas estão a ser ativamente reabastecidas – uma descoberta que está a corrigir previsões sobre o destino da atmosfera de Plutão, à medida que se move para áreas ainda mais frias do espaço na sua órbita de 248 anos terrestres em torno do Sol. Os resultados foram publicados na revista científica Icarus.
“Plutão é um objeto misterioso que nos surpreende constantemente,” disse Michael Person, autor principal do artigo e diretor do Observatório Astrofísico Wallace do MIT (Massachusetts Institute of Technology).
“Havia pistas, em observações remotas anteriores, da existência de neblinas, mas não tínhamos evidências fortes para confirmar que realmente existia até aos dados do SOFIA. Agora estamos a querer saber se a atmosfera de Plutão vai colapsar nos próximos anos – pode ser mais resiliente do que pensávamos.”
O SOFIA estudou Plutão apenas duas semanas antes do voo rasante da New Horizons por Plutão em julho de 2015. O Boeing 747 modificado sobrevoou o Oceano Pacífico e apontou o seu telescópio de 2,7 metros para Plutão durante uma ocultação, um evento parecido a um eclipse no qual Plutão projetou uma sombra fraca na superfície da Terra enquanto passava em frente de uma estrela distante.
O SOFIA observou as camadas intermédias da atmosfera de Plutão no infravermelho e no visível e, pouco depois, a sonda New Horizons analisou as suas camadas superior e inferior usando ondas de rádio e radiação ultravioleta. Estas observações combinadas, obtidas temporalmente tão perto umas das outras, forneceram a imagem mais completa da atmosfera de Plutão.
Atmosfera azul e nublada
Criada à medida que o gelo da superfície vaporiza sob a luz distante do Sol, a atmosfera de Plutão é predominantemente azoto, juntamente com pequenas quantidades de metano e monóxido de carbono. As partículas de neblina formam-se no alto da atmosfera, a mais de 32 quilómetros acima da superfície, à medida que o metano e outros gases reagem à luz solar, antes de precipitarem lentamente até à superfície gelada.
A New Horizons encontrou evidências destas partículas quando transmitiu imagens que mostravam uma névoa azulada na atmosfera de Plutão. Agora, os dados do SOFIA preenchem ainda mais detalhes ao descobrir que as partículas são extremamente pequenas, com apenas 0,06-0,10 micrómetros de espessura, ou cerca de 1000 vezes mais pequenas do que a espessura de um cabelo humano.
Devido ao seu tamanho pequeno, espalham a luz azul mais do que outras cores, enquanto flutuam em direção à superfície, criando a tonalidade azul.
Com estas novas informações, os cientistas estão a reavaliar as suas previsões sobre o destino da atmosfera de Plutão. Muitas previsões indicaram que, à medida que os planetas anões se afastam do Sol, menos gelo à superfície seja vaporizado – criando menos gases atmosféricos enquanto as perdas para o espaço continuavam – eventualmente levando ao colapso atmosférico. Mas, em vez de entrar em colapso, a atmosfera parece mudar num padrão cíclico mais curto.
Aplicando o que aprenderam com o SOFIA para reanalisar observações anteriores, incluindo as do antecessor do SOFIA, o Observatório Aerotransportado Kuiper, mostram que a neblina se espessa e desaparece num ciclo que dura apenas alguns anos. Isto indica que as pequenas partículas são criadas relativamente depressa.
Os investigadores sugerem que a órbita invulgar de Plutão está a provocar as mudanças na neblina e, portanto, pode ser mais importante na regulação da sua atmosfera do que a distância ao Sol.
Plutão orbita o Sol numa forma oval longa, chamada órbita elíptica, e em ângulo, chamada órbita inclinada. Também gira de lado. Isto faz com que algumas áreas do planeta anão sejam expostas a mais luz solar em diferentes pontos da órbita.
Quando regiões ricas em gelo são expostas à luz solar, a atmosfera pode expandir-se e criar mais partículas de neblina, mas como essas áreas recebem menos luz solar, pode encolher e tornar-se mais limpa. Este ciclo continuou mesmo com o aumento da distância de Plutão ao Sol, embora não esteja claro se esse padrão vai continuar.
“Ainda há muito que não entendemos, mas agora somos forçados a reconsiderar previsões anteriores,” disse Person. “A atmosfera de Plutão pode entrar em colapso mais lentamente do que o previsto anteriormente, ou talvez nem colapsar. Temos que continuar a monitorizar para descobrir.”
Perseguindo a sombra de Plutão
O SOFIA estava posicionado de maneira única para estudar Plutão de longe, aproveitando um momento raro em que Plutão passou à frente de uma estrela distante, lançando uma sombra fraca na superfície da Terra. Momentaneamente iluminada pela estrela, a atmosfera de Plutão pôde ser analisada.
Viajando a mais 85.000 km/h, esperava-se que a sombra de Plutão aparecesse por dois breves minutos sobre o Oceano Pacífico perto da Nova Zelândia. O SOFIA traçou o seu curso para a intercetar, mas duas horas antes da ocultação, uma previsão atualizada colocou a sombra a 320 km para norte.
“A captura dessa sombra foi um bocado atribulada. O SOFIA tem o benefício de ser móvel, mas o plano de voo revisto teve que ser aceite pelo controlo de tráfego aéreo,” disse William Reach, diretor associado de operações científicas do SOFIA.
“Houve alguns momentos tensos, mas a equipa trabalhou em conjunto e conseguimos autorização. Chegámos à sombra de Plutão exatamente à hora certa e ficámos muito felizes por ter conseguido!”
Observações remotas como estas permitem que os cientistas monitorizem corpos planetários entre “flybys” de sondas espaciais, que geralmente podem ser separados por muitos anos. O acordo entre os dados recolhidos remotamente pelo SOFIA e da passagem rasante da New Horizons suporta que as observações de ocultação da Terra podem fornecer dados de alta qualidade entre missões de naves espaciais.
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