O “chemsex” representa um desafio complexo que transcende os indivíduos envolvidos na prática, tornado-se uma questão de saúde pública, de direitos humanos e de justiça social.
“Ontem foi uma loucura e estou sem ressaca. Olha! O prato de drogas ainda está na mesa. Que noite louca. As inibições fugiram e o prazer sexual não teve limites”.
Para muitos, esta é a promessa do chemsex.
No entanto, por detrás desta afirmação de liberdade e diversão, esconde-se uma realidade de riscos para a saúde, vulnerabilidade e dependência.
O chemsex refere-se à utilização de substâncias psicoativas específicas para atingir o êxtase durante o ato sexual e prolongar a sua duração.
Segundo o The Conversation, é praticado principalmente por homossexuais, bissexuais e homens que fazem sexo com homens.
As substâncias mais frequentemente utilizadas são as metanfetaminas, a mefedrona, a cetamina ou o ácido gama-hidroxibutírico (GHB, vulgarmente conhecido por “squirt”).
Riscos físicos e psicológicos
A prática do chemsex pode ter as seguintes consequências negativas:
- Implicações para a saúde física – Está associada a um aumento dos comportamentos sexuais de risco, o que pode aumentar as taxas de transmissão do VIH e de outras infeções sexualmente transmissíveis (IST). Os participantes têm frequentemente relações sexuais com vários parceiros ao mesmo tempo e, por vezes, durante períodos prolongados, o que aumenta a probabilidade de transmissão.
- Saúde mental debilitada – Muitas vezes, as pessoas que se dedicam ao trabalho sexual são estigmatizadas, sofrem de stress ou mesmo de culpa ou de sentimentos de solidão. Por outro lado, as razões para aderir ao chemsex devem ser avaliadas.
- Consumo e dependência de substâncias – O consumo de drogas psicoactivas pode levar a intoxicação aguda e a problemas de dependência a longo prazo, complicando a saúde física e mental.
- Os utilizadores podem sofrer de fadiga física e mental, ideação suicida, psicose, comportamento agressivo ou overdose devido à perda de controlo sobre as substâncias.
Porque é que as pessoas não pedem ajuda?
Muitas vezes, quem faz chemsex não se sente suficientemente acompanhado ou compreendido. Encontramos assim aquilo a que podemos chamar barreiras nos cuidados de saúde:
- O estigma e a discriminação, seja devido ao consumo de drogas, à orientação sexual ou às práticas. O julgamento e a falta de competência cultural dos próprios profissionais de saúde estão na origem desta situação.
- Barreiras legais e sociais devido ao uso de substâncias legalmente processadas, o que leva ao estigma social.
- Falta de conhecimento, tanto por parte dos consumidores como dos profissionais de saúde. Os primeiros, por desconhecimento dos efeitos que estas substâncias e atividades podem ter, e os segundos, por desconhecimento das situações de emergência decorrentes de overdoses de metanfetaminas ou GHB.
- Acessibilidade, financiamento e falta de serviços multidisciplinares. Cada profissional tem a seu cargo a sua especialidade e não existem estruturas que reúnam os conhecimentos de todos eles. E se existem, faltam verbas para poderem atuar.
Qual é o nosso dever social?
Como cidadãos, podemos ajudar e podemos fazer muito, mas temos de ter em conta diferentes fatores:
- São necessárias intervenções coordenadas. Há falta de intervenções conjuntas de saúde pública adaptadas às necessidades específicas dos utilizadores de chemsex. Devem ser prestados cuidados seguros, competentes e éticos.
- As estratégias de redução dos danos são essenciais e devem centrar-se na auto-eficácia do indivíduo. Podem ser em linha ou terapias de grupo multidisciplinares ou direcionadas. No entanto, estas ferramentas estão atualmente subdesenvolvidas.
- Há necessidade de educação e sensibilização. A segurança sexual e o consumo de drogas devem ser ensinados, e deve ser iniciada a educação sobre os riscos do chemsex e a sua importância para a saúde.
- É necessário incentivar o apoio da comunidade, com pessoas que partilhem informações e apoio com base nas suas experiências.
- As políticas de saúde devem abordar o consumo de droga como um problema de saúde e não como um crime. O estigma deve ser minimizado e deve ser demonstrada empatia para apoiar e acompanhar as pessoas envolvidas. Isto inclui todos os profissionais de saúde.
Em última análise, o chemsex representa um desafio complexo que transcende o indivíduo para se tornar uma questão de saúde pública, de direitos humanos e de justiça social.
A abordagem dos riscos desta prática exige não só intervenções sanitárias e jurídicas, mas também uma mudança na forma como entendemos e apoiamos as comunidades afetadas. A educação, a redução dos danos e a empatia são essenciais para avançar para soluções reais e sustentáveis.
ZAP // The Conversation