Estudo incluiu uma especialista portuguesa e analisou amostras em Portugal. Península Ibérica foi pouco afectada.
Quando surgiu a pandemia da COVID-19, rapidamente se multiplicaram as recordações de aulas de História, que colocam a «Peste Negra» como a maior pandemia de sempre.
A bactéria Yersinia pestis foi a origem desta doença, aparentemente proveniente da China, que terá originado a morte de dezenas ou centenas de milhões de pessoas (as estimativas andam entre 75 e 200 milhões óbitos).
A Peste Negra terá matado cerca de um terço da população na Europa, que foi o continente mais afectado, sobretudo entre os anos 1347 e 1351.
Mas, afinal, os números de falecimentos podem não ter sido tão elevados.
Um estudo publicado nesta quinta-feira é o resultado da análise de 1634 amostras de pólen no subsolo de 261 locais, em 19 países. Foi utilizada a nova ferramenta Big-data paleoecology, baseada na palinologia, que estuda esporos e pólen de plantas fósseis.
O objectivo foi perceber que mudanças aconteceram nas paisagens e na actividade agrícola, durante aquele período. Assim, tentou obter-se uma noção mais exacta do impacto demográfico da pandemia.
A grande maioria das pessoas trabalhava no campo, na altura – por isso, se as actividades agrícolas continuaram normalmente, seria sinal de que poucas pessoas morreram naquela região.
E a equipa de 61 pessoas focou-se nos meios rurais, quebrando a tendência de análises anteriores, que se centraram em locais urbanos.
Portugal sofreu pouco
As conclusões foram publicadas na revista científica Nature Ecology and Evolution e mostram que, afinal, houve regiões europeias que quase nem foram afectadas pela pandemia.
A Península Ibérica, o actual território do Reino Unido e o noroeste da Europa foram as regiões que sofreram menos.
Este estudo contou com a participação da paleoecóloga portuguesa Carla Sá Ferreira, que colaborou nas análises realizadas em Portugal, na serra da Cabreira (Vieira do Minho) e no vale do rio Terva (Boticas), e mostraram que nestas zonas portuguesas a Peste Negra “teve um impacto contido face a outras regiões do centro europeu”.
“Os indicadores de cultivo contraíram ligeiramente no século XIV, o que pode refletir alguma mortalidade pela peste, mas também a realidade político-social portuguesa, como a crise dinástica de 1383-85 e as guerras com Castela”, afirmou Carla Sá Ferreira.
Carla sublinhou que os impactos da pandemia foram muito diferentes ao longo dos territórios europeus: “É preciso ter abordagens interdisciplinares para entender as pandemias passadas e presentes”.
Por exemplo, ao contrário de Portugal, a actividade agrícola desceu bastante na Escandinávia, na França, na Grécia, na Alemanha meridional e na Itália central, o que será sinónimo de taxas de mortalidade muito elevadas.