O Congresso espanhol aprovou esta quinta-feira o “Projeto de lei para a igualdade efetiva e real das pessoas trans e para a garantia dos direitos das pessoas LGBTI”, conhecido no país vizinho como “lei trans”.
A lei permite a mudança de género no registo civil a partir dos 12 anos sem necessidade de pareceres médicos, sendo que a partir dos 16 anos basta a vontade da própria pessoa. Será necessária autorização de um juiz para os casos entre os 12 e os 14 anos e dos pais ou tutores legais entre os 14 e os 16 anos.
O diploma, promovido pelo Unidas Podemos, foi aprovado com 188 votos a favor, 150 votos contra do Partido Popular e do Vox, e sete abstenções. Antes de entrar em vigor, a lei tem de ser confirmada pelo Senado.
Até agora, quem quisesse mudar de género tinha de ser diagnosticado com disforia de género. Esta condição consiste em sentimentos de angústia significativa ou dificuldade de funcionamento relacionados a um sentimento persistente de que o sexo ao nascimento não corresponde ao seu sentimento interno de identidade de género.
Além disso, era também necessárias provas de que a pessoa tinha efetuado tratamento hormonal durante dois anos, assim como aprovação judicial nos casos em que o indivíduo fosse menor.
“As pessoas trans não precisam de tutelas nem de testemunhas que lhes digam quem são. As pessoas trans são quem são e a nossa obrigação como Estado é reconhecê-las e proteger os seus direitos”, disse a ministra espanhola da Igualdade, Irene Montero, esta quarta-feira, citada pelo El País. A governante apelidou ainda os críticos da lei de “transfóbicos”.
A nova lei não se fica por aqui. O diploma poderá proibir cirurgia de modificação genital até aos 12 anos em crianças nascidas com características físicas dois dois sexos. A lei consagra ainda o direito de lésbicas, bissexuais e transgénero com capacidade reprodutiva acederem às técnicas de reprodução medicamente assistida. Por fim, permite a filiação dos filhos de mães lésbicas e bissexuais sem necessidade de casamento.
PSOE e movimento feminista divididos
A lei demorou mais de um ano a ser aprovada e deixou o Partido Socialista (PSOE) dividido ao meio. Carmen Calvo, antiga vice-primeira-ministra de Pedro Sánchez e atual presidente da Comissão de Igualdade, é uma das maiores críticas à nova legislação, tendo-se abstido na votação.
“Concordo que deva haver uma lei, mas não esta lei. É por isso que não posso concordar com o ‘não’ da ala direita, que nunca está lá para proteger estes grupos. Num dia difícil, votei na opção mais complexa e assumo sempre as consequências dos meus atos”, explicou Calvo, em entrevista ao El Mundo.
“Quando o género prevalece sobre o sexo biológico, não me parece ser um passo em frente, mas sim um passo atrás. O Estado tem de dar respostas às pessoas transgénero, mas o género não é voluntário nem opcional”, acrescentou.
A deputada do Partido Popular (PP), Rosa Romero Sánchez, alertou para “o impacto nos menores”, que estão em “etapas em que são muito vulneráveis e muito influenciáveis”.
O movimento feminista também ficou dividido.
Há quem argumente que o facto da lei permitir que homens se identifiquem como mulheres, permite a transferência para prisões femininas ou participar nas variantes femininas das competições desportivas.
As associações condenaram a possibilidade de mudança de género só com base na manifestação da vontade da pessoa que o pretende fazer. Os defensores deste movimento consideram que isto pode prejudicar os avanços conseguidos pelas mulheres na luta pela igualdade de direitos.