Papiro antigo revela fraude, escravatura e uma rebelião judaica num julgamento romano

Durante o reinado do imperador Adriano, dois judeus foram julgados por uma série de crimes, incluindo a libertação de escravos sem pagar as taxas exigidas e incitar à rebelião contra o Império Romano.

Segundo o IFL Science, os pormenores deste caso emocionante perderam-se durante quase 2000 anos, mas vieram agora à luz depois de os investigadores traduzirem o mais longo papiro grego jamais encontrado no deserto da Judeia.

Descoberto algures na década de 1950 ou no início dos anos 60, o pergaminho foi inicialmente escrito pelo antigo povo nabateu, que ocupou partes do Médio Oriente durante os períodos helenístico e romano.

Depois de ter permanecido num museu em Jerusalém durante várias décadas, o documento acabou por ser revisitado em 2014, altura em que os investigadores se aperceberam de que, na realidade, estava escrito em grego.

Composto por 133 linhas de texto, o papiro continha as notas de uma audiência judicial contra dois bandidos judeus, chamados Saulos e Gadalias, bem como os seus cúmplices Chaereas e Diocles.

A narrativa menciona a visita de Adriano à Judeia em 129-130 d.C. e também o nome de Tineius Rufus — que governou a região até 132 d.C. — permitindo assim que os autores do estudo, publicado na Tyche, apontassem a data do julgamento para um período entre 130 e 132 d.C.

Esta data é significativa, pois sugere que Saulos e Gadalias estavam a levar a cabo as suas atividades subversivas na véspera de uma rebelião judaica contra o domínio romano, conhecida como a revolta de Bar Kokhba, que durou de 132 a 136 d.C.

Significativamente, o papiro também acusa a dupla de “sedição”, sugerindo que podem ter desempenhado um papel no desencadear da insurreição.

É então apresentada uma longa lista de crimes relacionados com a história colorida de Gadalias, enumerando crimes como “violência”, “bandatismo”, “falsificação de dinheiro”, “fuga da prisão” e “extorsão financeira”, pelos quais tinha sido “muitas vezes condenado e banido”.

No caso em apreço, porém, parece ser Saulos, o mais ocupado, por ter fugido ao imposto de 5% que deve ser pago aquando da emancipação de escravos. Para libertar três escravos chamados Abaskantos, Onesimos e Niko, Saulos parece ter usado Chaereas como “homem de palha”, transferindo ficticiamente a propriedade para este cúmplice sem entregar efetivamente os escravos.

Gadalias — que é descrito como “um homem que pode ser comprado por pouco dinheiro” — foi contratado para falsificar os documentos, aproveitando-se da sua posição de filho de um notário corrupto.

“Este é o caso mais bem documentado do tribunal romano da Judeia, para além do julgamento de Jesus”, afirmou Avner Ecker, autor do estudo. E embora não haja qualquer indicação sobre o resultado do julgamento ou o destino de Saulos, Gadalias e dos seus co-acusados, os investigadores observam que o crime de falsum — que significa falsificação — implicava uma pesada punição no tempo dos romanos.


As penas variavam “entre a expropriação e o exílio, a condenação às minas e a pena capital” , escreveram os autores, acrescentando que “mesmo os membros da classe legalmente privilegiada dos honestiores são acusados de receberem duras penas por falsum“.

Teresa Oliveira Campos, ZAP //

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