Numa noite limpa, com um telescópio amador decente, Saturno e a sua série de anéis notáveis podem ser vistos da superfície da Terra. Mas como é que esses anéis surgiram? E o que é que eles nos podem dizer sobre Saturno e sobre as suas luas, um dos potenciais locais onde a NASA espera procurar vida?
Uma nova série de simulações em supercomputador fornece uma resposta ao mistério da origem dos anéis – uma resposta que envolve uma colisão massiva, na altura em que os dinossauros ainda percorriam a Terra.
De acordo com a nova investigação da NASA e dos seus parceiros, os anéis de Saturno podem ter evoluído a partir dos destroços de duas luas geladas que colidiram e se estilhaçaram há algumas centenas de milhões de anos.
Os detritos que não acabaram nos anéis podem também ter contribuído para a formação de algumas das atuais luas de Saturno.
“Há tanta coisa que ainda não sabemos sobre o sistema de Saturno, incluindo as suas luas que albergam ambientes que podem ser adequados à vida”, disse Jacob Kegerreis, cientista do Centro de Investigação Ames da NASA, em Silicon Valley, no estado norte-americano da Califórnia. “Por isso, é excitante usar grandes simulações como estas para explorar em pormenor como podem ter evoluído”.
A missão Cassini da NASA ajudou os cientistas a compreender quão jovens – em termos astronómicos – são os anéis de Saturno e provavelmente algumas das suas luas. E esse conhecimento abriu novas questões sobre a sua formação.
Para saber mais, a equipa de investigação recorreu às instalações de supercomputação da Universidade de Durham, no Reino Unido, onde se situa o DiRAC (Distributed Research using Advanced Computing).
A equipa modelou o aspeto de diferentes colisões entre luas precursoras. Estas simulações foram realizadas com uma resolução mais de 100 vezes superior à de estudos anteriores, utilizando o código de simulação de código aberto SWIFT, e dando aos cientistas as suas melhores perspetivas sobre a história do sistema de Saturno.
Atualmente, os anéis de Saturno vivem perto do planeta, dentro do que é conhecido como o limite de Roche – a órbita mais distante onde a força gravitacional de um planeta é suficientemente poderosa para desintegrar corpos maiores de rocha ou gelo que se aproximem.
O material que orbita mais longe pode juntar-se para formar luas.
Ao simular quase 200 versões diferentes do impacto, a equipa descobriu que uma vasta gama de cenários de colisão poderia espalhar a quantidade certa de gelo para o limite de Roche de Saturno, onde poderia assentar em anéis.
E, embora as explicações alternativas não tenham sido capazes de mostrar porque é que quase não há rocha nos anéis de Saturno – são feitos quase inteiramente de pedaços de gelo – este tipo de colisão poderia explicar esse facto.
“Este cenário conduz naturalmente a anéis ricos em gelo”, disse Vincent Eke, Professor Associado do Departamento de Física/Instituto de Cosmologia Computacional da Universidade de Durham e coautor do artigo.
“Quando as luas geladas progenitoras chocam umas com as outras, a rocha nos núcleos dos corpos em colisão dispersa-se menos do que o gelo sobrejacente“, acrescenta.
O gelo e os detritos rochosos teriam também atingido outras luas do sistema, causando potencialmente uma cascata de colisões. Este efeito multiplicador poderia ter perturbado quaisquer outras luas precursoras fora dos anéis, a partir das quais se poderiam ter formado as luas atuais.
Mas o que é que poderá ter posto em marcha estes acontecimentos em primeiro lugar? Duas das antigas luas de Saturno podem ter sido empurradas para uma colisão pelos efeitos normalmente pequenos da gravidade do Sol, que se “somaram” para desestabilizar as suas órbitas em torno do planeta.
Na configuração correta das órbitas, a atração extra do Sol pode ter um efeito de bola de neve – uma “ressonância” – que alonga e inclina as órbitas normalmente circulares e planas das luas até que as suas trajetórias se cruzem, resultando num impacto a alta velocidade.
A lua de Saturno, Reia, orbita atualmente um pouco para lá do local onde uma lua encontraria esta ressonância. Tal como a Lua da Terra, os satélites de Saturno migram para fora do planeta ao longo do tempo.
Assim, se Reia fosse antiga, teria atravessado a ressonância no passado recente. No entanto, a órbita de Reia é muito circular e plana. Isto sugere que não sofreu os efeitos desestabilizadores da ressonância e, em vez disso, formou-se mais recentemente.
A nova investigação alinha-se com evidências de que os anéis de Saturno se formaram recentemente, mas ainda há grandes questões em aberto.
Se pelo menos algumas das luas geladas de Saturno também são jovens, o que é que isso pode significar para o potencial de vida nos oceanos sob a superfície de mundos como Encélado? Será que conseguiremos desvendar a história completa desde o sistema original do planeta, antes do impacto, até aos dias de hoje?
A investigação futura baseada neste trabalho ajudar-nos-á a aprender mais sobre este planeta fascinante e sobre os mundos gelados que o orbitam.
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