Orçamento secreto de Bolsonaro para parlamentares pode ser investigado

palaciodoplanalto / Flickr

O Presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, e a primeira-dama, Michelle Bolsonaro

Um procurador brasileiro pediu uma investigação à reserva de três mil milhões de reais (470 milhões de euros) do Orçamento de 2020 para parlamentares em troca de apoio ao Governo de Jair Bolsonaro.

Segundo o jornal O Globo, o pedido foi entregue ao Tribunal de Contas da União (TCU) pelo subprocurador-geral Lucas Rocha Furtado, com base numa reportagem difundida pelo jornal O Estado de S. Paulo no domingo.

Em causa está um alegado esquema montado pelo Presidente, no final do ano passado, para aumentar a sua base de apoio no Congresso, tendo criado um orçamento paralelo de três mil milhões de reais em emendas (instrumento garantido aos parlamentares brasileiros face ao Orçamento), e que, na maioria, foi destinado à compra de tratores e equipamentos agrícolas por preços até 259% acima dos valores de referência fixados pelo Governo.

Trata-se de dinheiro paralelo ao previsto nas tradicionais emendas individuais a que todos os senadores e deputados têm direito. Secretamente, esses recursos extra foram concentrados num grupo de parlamentares que apoiava o Governo.

Com o orçamento secreto, o Executivo negociou apoio para as candidaturas, em fevereiro, de Arthur Lira à presidência da Câmara dos Deputados e de Rodrigo Pacheco para comando do Senado, candidatos apoiados por Bolsonaro e que saíram vencedores.

“A situação requer, a meu ver, a atuação do TCU no cumprimento de suas competências constitucionais de controlo externo de natureza contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da Administração Pública federal, a fim de que sejam apurados os atos do Poder Executivo que porventura venham – contrariando as regras isonómicas previstas para a aprovação e liberação de emendas parlamentares individuais – favorecendo determinados parlamentares, em retribuição a apoio aos projetos do Governo”, frisou o procurador, citado pelo O Globo.

“Esses recursos ‘extras’ ocorreriam, em princípio, à margem de todas as regras constitucionais, legais e regulamentares, em ofensa ao princípio da isonomia que orienta a distribuição de recursos orçamentários entre os parlamentares no regime das emendas individuais e sem a transparência que requer o uso de recursos públicos”, acrescentou.

Além do procurador, também o deputado federal Marcelo Freixo deu entrada de um pedido no TCU para investigar este orçamento paralelo.

De acordo com o jornal O Estado de S. Paulo, o Ministério do Desenvolvimento Regional e a empresa estatal Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf) têm sido o atalho preferencial de deputados e senadores para direcionar essas verbas para obras, como pavimentação e instalação de poços, e para a compra de máquinas pesadas, como tratores, retroescavadoras e camiões-cisterna, para municípios considerados estratégicos.

“É um absurdo que o Governo Federal continue a patrocinar os seus aliados, incluídos antigos e atuais presidentes das casas parlamentares, para manejo de interesses particulares com evidente desvio de finalidade e sobrefaturamento. Tais verbas poderiam ter sido utilizadas no combate à pandemia, sobretudo na compra de vacinas”, indicou Freixo no documento entregue ao TCU.

Numa investigação ao longo de três meses, o jornal O Estado de S. Paulo teve acesso a 101 ofícios e descobriu que Bolsonaro alegadamente atribuiu a um grupo de deputados e senadores o direito de impor onde seriam aplicados milhares de milhões de reais, provenientes de uma nova modalidade de emendas, chamada RP9.

Contudo, oficialmente, Bolsonaro vetou a tentativa do Congresso de definir a aplicação dos recursos das emendas RP9. O Presidente considerou que isso contrariava o “interesse público” e estimulava o “personalismo”, mas foi exatamente esse esquema que adotou, ignorando o seu próprio ato, segundo a investigação de O Estado de S. Paulo.

PGR rejeita investigação por depósitos na conta da primeira-dama

O procurador-geral da República (PGR) brasileiro rejeitou um pedido feito ao Supremo Tribunal Federal (STF) para abrir um inquérito contra o Presidente por cheques depositados na conta da primeira-dama por um ex-assessor.

A informação foi noticiada, esta segunda-feira, pelo jornal O Globo, que indicou que a manifestação do PGR, Augusto Aras, foi enviada ao juiz do Supremo Marco Aurélio Mello, cabendo agora ao magistrado decidir se acolhe, ou não, o pedido do PGR.

Em causa estão cerca de 20 depósitos feitos pelo amigo da família Bolsonaro e ex-assessor, Fabrício Queiroz, na conta bancária da atual primeira-dama, Michelle Bolsonaro, no valor total de 72 mil reais (cerca de 11.345 euros).

Além da quantia transferida por Queiroz, entre 2011 e 2016, também a sua mulher, Márcia de Aguiar, destinou 17 mil reais (2680 euros) em cheques para a mulher do Presidente.

Face a essas transferências, um advogado entrou com um pedido no STF para que fosse aberto um inquérito pelo crime de peculato e desvio de recursos públicos, com base nas reportagens publicadas na ocasião e que denunciaram a situação.

Contudo, Augusto Aras sustentou que apenas as notícias publicadas na imprensa não constituem elemento suficiente para abertura de investigação, de acordo com O Globo.

O PGR argumentou que o Ministério Público do Rio de Janeiro já apresentou uma acusação contra o senador Flávio Bolsonaro, filho do Presidente, a respeito do assunto, mas não encaminhou à Procuradoria-Geral da República nenhum indício de crime envolvendo Jair Bolsonaro.

Fabrício Queiroz e Flávio Bolsonaro são suspeitos de operar um esquema de desvio de dinheiro público através da apropriação de parte do salário de ex-funcionários do filho do chefe de Estado na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), prática ilícita conhecida pelo termo “rachadinha”.

“É notório que as supostas relações espúrias entre Flávio Bolsonaro e Fabrício Queiroz (…) foram objeto de oferecimento de denúncia, na primeira instância, em desfavor de ambos e de outras pessoas supostamente envolvidas nos crimes correlatos. Inexiste notícia, porém, de que tenham surgido (…) indícios do cometimento de infrações penais pelo Presidente da República”, escreveu Aras, citado pelo O Globo, rejeitando a abertura de um inquérito contra o mandatário.

Manifesto assinado por artistas pede destituição de Bolsonaro

Cerca de 2500 artistas brasileiros, incluindo o cantor e escritor Chico Buarque e o ator Gregório Duvivier, lançaram esta segunda-feira um manifesto pela destituição de Jair Bolsonaro da Presidência, devido à gestão da pandemia.

Intitulado “Artistas Pelo Impeachment [destituição]“, o manifesto tece duras críticas à gestão de Bolsonaro durante a pandemia, que fez mais de 423 mil mortos e 15,2 milhões de infetados no Brasil, um dos países mais afetados pela crise sanitária em todo o mundo.

“Diversas medidas poderiam ter sido tomadas para reduzir o número de mortes, mas não foram. A estratégia seguiu uma direção contrária. O descaso e a negação das conquistas científicas continuam a ser incentivados”, indica o manifesto divulgado no site da organização Jornalistas Livres.

“Com isto aumenta a cada dia o número de vidas humanas perdidas. Ou seja, vivemos sob a tutela de um Governo criminoso que, por diligência engendrada e condução irracional da crise sanitária, causa um número de óbitos muito superior ao que seria o inevitável“, frisa o texto.

A par do manifesto, foi ainda lançado um abaixo-assinado pela destituição do atual chefe de Estado brasileiro, num evento virtual que juntou nomes como o do cantor e compositor Ivan Lins, a atriz Malu Galli, o músico Zeca Baleiro, o indígena Ailton Krenak, o rapper Emicida ou a atriz Maria Bopp.

“Sou uma pessoa comum, filho de um militar e de uma professora primária, fui bem educado, graças a Deus. Não consigo imaginar um Presidente no nível deste homem, que tem total desprezo pela vida humana. Um Presidente que nunca visitou um hospital para dar força aos médicos, que tem coragem de sugerir a imunização de rebanho, um morticínio. Não temos um estadista, temos um terrorista”, defendeu Ivan Lins no encontro.

A carta coletiva foi concluída com um convite a toda a “sociedade brasileira” para “uma unificação dos diversos esforços sociais, políticos e culturais”, visando “estancar o genocídio nacional”.

“Nós convidamos a nação brasileira a um pleito único, urgente e fundamental, para que tenhamos a possibilidade de ver um futuro através da discussão pública e ampla do processo de impugnação do atual mandato da Presidência da República. Cessar um Genocídio”, reforça o manifesto.

“O presidente da Câmara e os congressistas têm que colocar em discussão imediata o assunto, já que este é o desejo maior de grande parte da sociedade brasileira. Não podemos mais assistir impassíveis a essas manobras macabras e irresponsáveis que nos fazem perder, diariamente, milhares de vidas humanas para a Covid-19 através de calculado genocídio”, frisa.

Até agora, o abaixo-assinado pela destituição de Bolsonaro já conta com quase 23 mil assinaturas.

ZAP // Lusa

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