Uma semana após abandonar o país, não há notícias sobre o estado de saúde do ditador nem sobre a sua família: o Kremlin mantém-se em silêncio. Entretanto, Israel continua a bombardear dezenas de alvos em território sírio.
Há uma semana que o presidente deposto da Síria, Bashar al-Assad, encontrou refúgio na Rússia, mas desde então, não há notícias sobre o seu estado de saúde nem sobre o da sua família.
Moscovo manteve o mesmo sigilo em relação a outros líderes a quem concedeu asilo. Embora tenha sido o Kremlin a confirmar a presença de al-Assad em território russo no domingo passado, o porta-voz da presidência, Dmitry Peskov, esquivou-se de abordar o assunto durante toda a semana nas conferências de imprensa.
Uma palavra a mais poderia pôr em risco o futuro das suas bases militares no país árabe. Por isso, os altos responsáveis russos também se abstiveram de criticar abertamente os maiores beneficiários da queda do regime: Turquia, Israel e os EUA.
À espera de Putin
Diplomatas sírios e iranianos confirmaram que a família do ditador deposto está na Rússia, pelo que não há dúvidas quanto ao seu paradeiro. No entanto, não forneceram mais detalhes.
O filho mais velho dos Assad, Hafez, concluiu o seu doutoramento numa universidade na capital russa, onde a família terá adquirido vários apartamentos de luxo na chamada “Moscow City”, que alberga alguns dos arranha-céus mais altos da Europa, segundo a imprensa local.
Parece que todos estão à espera de uma declaração do presidente russo, Vladimir Putin, sobre o assunto, até porque foi ele quem apostou em manter o regime sírio, enviando tropas para o país árabe em 2015.
Putin participou em vários eventos oficiais esta semana, mas não fez qualquer alusão à questão, o que evidencia que o revés geopolítico para o Kremlin tem sido significativo.
Já lá vão os tempos da encenação da vitória na Síria, com um concerto histórico realizado em maio de 2016 nas ruínas de Palmira, incluindo um discurso do líder do Kremlin por videoconferência.
Contudo, a espera não deverá ser longa. Espera-se que Putin aborde o assunto na sua conferência de imprensa anual, marcada para 19 de dezembro.
No caso mais recente do ucraniano Viktor Yanukovych, resgatado por Moscovo em fevereiro de 2014, o Kremlin responsabilizou-o diretamente pelo seu destino, por não ter dado ouvidos aos conselhos de reprimir duramente os protestos da oposição.
“A culpa é de Assad”
A propaganda russa deixou clara a mudança de tom em relação a Assad. Em poucos dias, os meios de comunicação deixaram de rotular os rebeldes da Organização para a Libertação do Levante (Hayat Tahrir al-Sham, HTS) como “terroristas”, passando a chamá-los simplesmente de “oposição armada”, com quem Moscovo já estabeleceu contactos, segundo uma declaração do Ministério dos Negócios Estrangeiros russo feita na quinta-feira.
Tudo isto para evitar constrangimentos ao Exército russo, incapaz de lutar em duas frentes ao mesmo tempo e atolado na atual ofensiva no Donbass.
Assad tornou-se o elefante na sala do Kremlin: é uma figura incómoda para a Rússia, já que, tal como os líderes depostos do Iraque, da Líbia e da Ucrânia, o Kremlin não quer que se espalhe a impressão de que o seu regime autoritário também pode cair.
Se restassem dúvidas, o vice-chefe do Conselho de Segurança, Dmitry Medvedev, dissipou-as após uma viagem à China.
“A situação interna dependia da administração e do governo de Assad. Infelizmente, o Exército sírio demonstrou ser incapaz, o que provavelmente confirma os erros de cálculo cometidos durante a administração estatal”, declarou o ex-presidente russo.
Medvedev também manifestou sérias dúvidas de que as futuras autoridades consigam garantir a coexistência entre os diferentes grupos étnicos do país.
“No modelo antigo aplicado pelos Assad, pai e filho, (o consenso) foi alcançado durante algum tempo. Não vou agora comentar a que custo e com que consequências”, disse, segundo a agência de notícias Tass.
Mais de 60 bombardeamentos israelitas em 5 horas
Entretanto, mais de 60 bombardeamentos israelitas atingiram instalações militares em menos de cinco horas em todo o território sírio, segundo informação divulgada este sábado pelo Observatório Sírio dos Direitos Humanos, ONG com sede no Reino Unido.
Uma semana após a queda de Assad, Israel continua a intensificar os seus ataques aéreos no país, especialmente contra túneis nas montanhas que contêm depósitos de mísseis balísticos, acrescentou a ONG.
O Observatório, que conta com uma vasta rede de fontes no terreno, registou 446 bombardeamentos israelitas desde a queda de Assad no domingo passado.
A ONG relatou outros bombardeamentos israelitas algumas horas antes, que destruíram “um instituto científico” e “outras posições militares em Barzeh, no extremo nordeste de Damasco”.
Por sua vez, o ministro da Defesa israelita, Israel Katz, ordenou que o Exército “se prepare para permanecer” durante todo o inverno na zona de amortecimento entre Israel e a Síria, no planalto dos Montes Golã, em grande parte anexado por Israel.
As tropas israelitas entraram na zona de amortecimento logo após a queda de Assad. A ONU denunciou esta incursão como uma “violação” do acordo de retirada de 1974 entre a Síria e Israel.
// DW