Ok, boomer. Os EUA são cada vez mais uma gerontocracia — mas será isso um problema?

Carlos M. Vazquez II / DoD

O presidente dos EUA, Joe Biden

Se a idade avançada é sinónimo de experiência, pode também ser um ponto fraco e levantar questões sobre as capacidades dos candidatos para aguentarem com a pressão dos cargos.

Se lhe parece que os políticos norte-americanos são a ficar cada vez mais velhos, não é só na sua cabeça. Nos últimos anos, os cabelos grisalhos e as rugas são visões cada vez mais comuns nos corredores políticos norte-americanos.

Na Câmara dos Representantes, a Presidente Nancy Pelosi tem 82 anos. O seu Vice-Presidente, Steny Hoyer, tem 83 anos, e o congressista número três na hierarquia Democrata, Jim Clyburn, conta com 82 Primaveras.

No Senado, o cenário é o mesmo. A idade média dos Senadores é 64,3 anos, um novo recorde na história dos Estados Unidos. Dianne Feinstein é a Senadora mais velha, com 89 anos, seguindo-se Chuck Grassley, com 88. Seis Senadores estão na casa dos 80 anos, 23 estão na casa dos 70 e apenas um, Jon Ossoff, está abaixo dos 40, tendo actualmente 35 anos.

A tendência também se nota na Casa Branca — aos 78 anos no dia da inauguração, Joe Biden tornou-se o Presidente mais velho da história dos EUA, batendo o recorde previamente detido pelo seu antecessor, Donald Trump, que assumiu a presidência em 2016 com 70 anos. Desde então, Biden já comemorou mais um aniversário e vai apagar 80 velas a 20 de Novembro deste ano.

Idade como trunfo político

Estes números não têm passado despercebidos aos media e a idade do Presidente tornou-se um dos temas favoritos dos jornalistas e colunistas, especialmente nos meios mais conservadores.

Manchetes como “Tal como Churchill nos anos 50, Biden é demasiado velho para liderar a sua nação“, “Aos 79 anos, Biden está a testar as fronteiras da idade e da presidência” ou “Como alguém com 76 anos, deixem-me dizer: Joe Biden é demasiado velho para se recandidatar” têm dominado os jornais.

Por um lado, este envelhecimento na política reflecte o que se passa no resto da sociedade — cada vez vivemos mais e trabalhamos até mais tarde — e ter responsáveis políticos mais velhos também significa que são mais experientes e estarão, em teoria, mais preparados para os cargos que assumem.

Por outro, há a ideia de que as pessoas mais velhas tendem a ser mais conservadoras e defensoras do status-quo enquanto que a juventude costuma ser  sinónimo de mais energia e ideias inovadoras e dinâmicas — tendo sido esta mesma noção que originou o famoso meme “ok, boomer”.

Há casos que confirmam esta ideia. Aos 28 anos, Alexandria Ocasio-Cortez tornou-se a mais jovem mulher a ser eleita para o Câmara dos Representantes na história dos Estados Unidos e desde então que se afirmou como um dos principais rostos da ala progressista do Partido Democrata

Nancy Pelosi, por contraste, tornou-se cada vez mais conservadora com o passar dos anos, sendo agora uma das maiores opositoras internas da agenda progressista. Talvez nada demonstre esta mudança como a sua posição sobre a criação de um sistema de saúde universal — em 1994 era uma fervorosa defensora da ideia enquanto que em 2019 disse já não ser “fã”.

O caso da Presidente da Câmara dos Representantes comprova a ideia de que, aos poucos, as estruturas tornam-se grilhões que corroem e matam a esperança de mudanças profundas que leva a que muitos jovens embarquem na política.

Com o passar dos anos, os políticos mais velhos deixam de se conseguir identificar com as gerações mais jovens, sendo as alterações climáticas um dos temas que melhor demonstra este fosso geracional.

“Os Democratas deviam tratar a perda da minha geração como uma ameaça existencial. Temos avisado os Democratas de que a não ser que aprovem políticas importantes imediatamente, como foi prometido no Build Back Better, vão perder o apoio de muitos eleitores”, explica Ellen Sciales, porta-voz do grupo de activismo ambiental jovem Sunrise Movement, ao The Guardian.

Mas para todas as regras há excepções — os Senadores Ed Markey e Bernie Sanders, com 76 e 80 anos, respectivamente, são dois nomes importantes do movimento progressista, tendo Sanders até conseguido o apoio oficial do Sunrise Movement nas primárias Democratas para as presidenciais. Por contraste, aos 40 anos, o Secretário dos Transportes de Biden, Pete Buttigieg, defende políticas bem mais conservadoras.

Outro factor a ter em conta é saúde, que se torna uma das armas de arremesso favoritas dos opositores políticos. Bernie Sanders sofreu com isto durante a campanha em 2019, quando teve um ataque cardíaco, e as repetidas gaffes de Joe Biden também têm levantado questões sobre a sua saúde mental e a sua aptidão para estar no comando da Sala Oval, o que lhe valeu a alcunha “Sleepy Joe” (Joe Dorminhoco) dada por Donald Trump.

Será que os eleitores se importam?

Perante este cenário, será que na mente do eleitores a idade é só mesmo um número? Bem, depende.

Joe Biden já anunciou que se pretende recandidatar em 2024, mas uma sondagem recente do The New York Times mostrou que os eleitores têm uma ideia diferente. 64% dos Democratas preferem ter um outro candidato no boletim de voto e esse valor sobre para 94% entre os Democratas com menos de 30 anos.

Entre os factores apontados para a oposição a Biden, a idade foi a principal preocupação, sendo a razão para 33% dos inquiridos. O recente diagnóstico de covid-19 e a queda de bicicleta do Presidente em Junho também não ajudam a desmistificar a ideia de que Biden é demasiado velho para ser chefe de Estado.

Questionada sobre estas preocupações, a porta-voz da Casa Branca, Karine Jean-Pierre, chutou o tema para canto: “Essa nem é uma pergunta que deve ser feita”.

Mas segundo o The New York Times, nos bastidores, o consenso é outro. O jornal avança que os funcionários da Casa Branca se mostram hesitantes sobre a agenda apertada de Biden, especialmente quando estão em causa grandes viagens ao estrangeiro, temendo que isso seja demasiado cansativo.

David Axelrod, que foi o chefe de campanha de Barack Obama, já disse que a idade pode ser um “grande problema” para a reeleição de Biden.

Um novo estudo publicado na Political Behavior debruçou-se sobre este assunto e mesmo depois de ter em conta factores como a incumbência e a ideologia política, concluiu que os eleitores jovens têm uma visão mais negativa sobre os membros mais velhos do Congresso.

Os jovens com 18 anos, por exemplo, tendem a aprovar o trabalho dos congressistas em torno dos 30 anos cerca de 60% das vezes. Esse número cai para 54% quando os representantes chegam aos 80 anos.

No entanto, nem tudo são más notícias. Na mesma pesquisa, os investigadores fizeram uma experiência com 1000 eleitores online que foram expostos a um candidato hipotético para uma legislatura estadual, com a única diferença a ser a idade — nalguns casos, o candidato tinha 23 anos, noutros tinha 50 e noutros tinha 77. Nesta experiência, a idade não pareceu fazer diferença.

A Constituição norte-americana determina uma idade mínima de 25 anos para se ser eleito para a Câmara dos Representantes, 30 anos para o Senado e 35 para a Presidência. Se há um limite mínimo, pode haver no futuro um limite máximo?

Em 2019, o ex-Presidente Jimmy Carter já tinha namoriscado com a ideia perante o painel de candidatos geriátricos. “Espero que haja um limite de idade. Se eu tivesse 80 anos, se eu fosse 15 anos mais novo, não acho que poderia cumprir os deveres que tive quando fui Presidente”, avisou.

Uma sondagem de Janeiro da YouGov concluiu que Carter não é o único. Mais de metade dos norte-americanos (58%) acredita que deve haver um limite máximo para a candidatura a cargos políticos enquanto que apenas 21% de opõem à ideia. Os Republicanos (64%) são mais adeptos da proposta do que os Democratas (57%), e a maioria dos Independentes também aprova a sugestão (60%).

As conclusões dos estudos parecem ser confusas, mas uma coisa é certa — a batalha geracional na política não dá sinais de abrandar.

Adriana Peixoto, ZAP //

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