“Janeiro sem álcool” tornou-se batalha política em França

Rodolphe Escher/Terre de Vins

O Presidente de França, Emmanuel Macron

Janeiro Seco não é apoiado por Macron e é vista como intrusivo pelos ministros. Apoiantes lembram que o país é ainda o quarto maior consumidor de álcool da Europa.

O presidente da França, Emmanuel Macron, foi acusado de ceder ao lobby do vinho ao não manifestar apoio a uma iniciativa chamada Janeiro Seco (Dry January, na expressão original em inglês), contra o consumo de álcool.

Cinquenta especialistas em dependência escreveram uma carta aberta esta semana, lamentando a falta de apoio do governo à campanha pós-festas de fim de ano.

“A nossa confiança no governo para levar a cabo uma política coerente e determinada contra o alcoolismo está seriamente comprometida”, escreveram os médicos.

O Janeiro Seco chegou à França em 2020.

Na carta ao jornal Le Monde, os médicos disseram que o desafio de Janeiro se tornou um elemento social popular desde que foi introduzido no Reino Unido e que, apesar da indiferença do governo, teve sucesso.

Em França, vários ministros distanciaram-se efetivamente do apelo a um mês de abstinência, defendendo que preferiam encorajar a moderação em vez de um jejum total de álcool.

O ministro da Agricultura francês disse que o declínio geral no consumo de álcool francês — queda de 70% no último meio século e de 7-10% só no ano passado — tornou a campanha do Janeiro Seco irrelevante e intrusiva.

“Não creio que os franceses precisem de receber lições de ninguém. As pessoas estão fartas de ouvir o que comer, o que beber, como viajar. Há um modo de vida que também merece respeito”, disse Marc Fesneau.

“Ficaria muito desconfiado se ouvisse que o governo está a dizer às pessoas como viver as suas vidas durante um mês”, disse o ex-ministro da Saúde Aurélien Rousseau quando questionado no início de dezembro, antes da sua demissão, se iria aderir ao Janeiro Seco.

Para os críticos, estas reações são sinais de que o governo, seguindo o exemplo do presidente Macron, decidiu que é mais importante não contrariar o lobby do vinho do que promover a boa saúde.

“Sabemos muito bem que com este governo, e sobretudo com este presidente, as ligações com o lobby do álcool são particularmente fortes”, disse o pesquisador Jean-Pierre Couteron.

Um Presidente apaixonado por vinho

Os defensores do Janeiro Seco dizem que França é ainda o quarto maior consumidor de álcool da Europa e que o álcool é responsável por mais de 40.000 mortes no país todos os anos.

Dizem também que uma campanha que conta com o apoio financeiro e moral do governo alcançaria muito mais pessoas do que as 16 mil que manifestaram apoio em 2023.

Em 2022, Macron foi eleito Personalidade do Ano pela revista Review of French Wines depois de afirmar que bebia vinho duas vezes por dia, no almoço e no jantar.

Em junho passado, o presidente foi filmado a beber uma garrafa de cerveja Corona no balneário da equipa de râguebi do Stade Toulousain, no Stade de France, dando origem a acusações de que estava a incentivar ao consumo excessivo de álcool.

Com a indústria do vinho a gerar 9 mil milhões de euros em vendas externas todos os anos, a decisão de defender os produtores de vinho franceses é certamente racional. No entanto, os críticos dizem que beber em público também é, em parte, um gesto de “homem do povo” que o presidente adota para se opor à acusação de que está “fora de sintonia”.

ZAP // BBC

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