O fenómeno que nos faz ver cores que não existem

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Na ausência de pigmentos, ocorre a magia da coloração estrutural, um jogo de luz que muitas vezes nos mostra cores deslumbrantes.

Já se questionou por que é que não existem mamíferos verdes? Afinal, a camuflagem seria muito conveniente para quem passa muito tempo escondido na vegetação.

Na verdade, é muito difícil ser verde. As plantas fazem-no com recurso a clorofila e não existem outros pigmentos verdes disponíveis na natureza.

Então, como é que os papagaios e as rãs atingem essa cor? Ultrapassam a escassez de pigmentos verdes usando um que é ainda mais abundante: o amarelo. Uma vez completado esse processo, “basta” misturá-lo com o azul — mas há um problema.

A dificuldade em conseguir o verde reside em grande parte na falta da cor que costumamos ver no céu e no mar. Não existe um pigmento verdadeiramente azul na natureza, então tanto as plantas como os animais precisam de pôr alguns truques em prática para parecerem azuis.

E um desses truques é a coloração estrutural, um fenómeno surpreendente que ocorre quando a luz interage com estruturas microscópicas nas superfícies e nos mostra cores, apesar da ausência de pigmentos.

No caso dos papagaios e das rãs, essas microestruturas — nas penas ou na pele — apenas permitem refletir a luz azul que, quando combinada com o pigmento amarelo, faz com que pareçam verdes — pareçam…

Não devemos esquecer que “a cor é mais uma perceção do que uma propriedade física da luz”, conforme explica o médico oftalmologista David A. Mackey, membro do Conselho Nacional de Saúde e Pesquisa Médica (NHMRC) da Austrália. Os nossos olhos detetam apenas três cores: vermelho, verde e azul. Mas, com a combinação delas, podemos ver muitas mais. E a cor que vemos é a que o objeto reflete, depois de absorver todas as outras.

Contudo, no mundo biológico, a grande maioria das cores é produzida por pigmentos — compostos produzidos por um organismo vivo que absorvem seletivamente certos comprimentos de onda de luz.

Na ausência de pigmentos, ocorre a magia da coloração estrutural, um jogo de luz que muitas vezes nos mostra cores deslumbrantes.

É também uma forma de coloração mais durável porque, ao contrário das cores criadas pela pigmentação, que se degradam quando o organismo morre, as microestruturas sobrevivem até se desintegrarem.

O azul difícil

Para entender melhor a coloração estrutural, foquemo-nos no azul, aquela cor tão difícil de obter na natureza.

São os seus comprimentos de onda muito curtos que permitem que o azul seja refletido mais facilmente do que outras cores com comprimentos de onda mais longos, descobriu, em 1869, o cientista John Tyndall, que viu que pequenas partículas na atmosfera dispersavam preferencialmente a luz azul, resultando no familiar céu azul de um dia claro de verão.

Pouco depois, John William Strutt demonstrou que as partículas de que Tyndall falava eram, na verdade, moléculas individuais de gás, especificamente nitrogénio e oxigénio. O mesmo acontece com as penas de pássaros como as araras-azuis.

Se observar uma pena dessa arara num microscópio poderoso, verá que a camada superficial de queratina parece leitosa devido à presença de pequenas cavidades de ar.

Essas pequenas cavidades de ar agem como pequenas partículas da atmosfera, enquanto os grãos escuros de melanina absorvem comprimentos de onda de luz mais longos, o que privilegia a cor azul.

Se, em comparação, observar uma pena vermelha sob o mesmo microscópio, verá que a superfície é transparente, mas as estruturas subjacentes estão cheias de grãos de pigmento vermelho.

Um fenómeno físico semelhante, mas não idêntico, produz cores fluorescentes, como aquelas que vemos quando há uma fina película de óleo na água ou nas penas dos beija-flores, cujas estruturas microscópicas refletem a luz solar com uma forma natural de nanotecnologia.

A mais brilhante de todas

A coloração estrutural foi observada pela primeira vez pelos cientistas ingleses Robert Hooke e Isaac Newton em pavões; Thomas Young explicou o seu princípio um século depois e chamou-o de interferência de ondas.

Young descreveu a fluorescência como o resultado da interferência entre os reflexos de várias superfícies de camadas finas, combinada com a refração à medida que a luz entra e sai de tais camadas.

A geometria mostra que a luz refletida aparece em cores diferentes em ângulos diferentes.

Um caso exemplar é o do fruto da planta africana Pollia condensata, a matéria viva mais brilhante do mundo.

Wikimedia Commons

Pollia condensata

A Pollia foi estudada por uma equipa de investigadores do Jardim Botânico de Kew e da Universidade de Cambridge, no Reino Unido, e do Museu Smithsonian de História Natural, nos Estados Unidos.

Os cientistas ficaram inicialmente intrigados com uma propriedade incomum: os pequenos frutos metálicos conhecidos como bagas de mármore mantêm uma cor azul vibrante por anos ou mesmo décadas após serem colhidos.

Ao examinar as bagas, perceberam que sob a sua superfície lisa e refletora havia múltiplas camadas de células especiais feitas de fibras de celulose. Quando a luz atinge a camada superior, parte dela é refletida e o restante é filtrado.

A luz refletida por cada camada é excecionalmente brilhante e produz cores fortes num efeito conhecido como reflexão de Bragg.

Os cientistas concluíram que o tecido do fruto tem uma cor mais intensa do que qualquer tecido biológico estudado anteriormente.

// BBC

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