Morrer, envelhecer ou sobreviver: são as células que decidem o seu destino após a quimioterapia

// Bendta Schroeder / MIT

 “Dar sentido ao destino celular” é o nome de uma fascinante investigação que pretende explicar os mecanismos que governam as células, desde a sua diferenciação e desenvolvimento, até às suas funções específicas no organismo.

Um estudo investigou as vias moleculares, regulações genéticas e fatores ambientais que influenciam o destino das nossas células durante o tratamento com quimioterapia.

Através da compreensão destes processos celulares complexos, os investigadores pretendem obter informações valiosas sobre o desenvolvimento de tecidos, a progressão de doenças e quiçá possíveis intervenções terapêuticas.

Apesar de existirem cada vez mais terapias inovadoras, como a imunoterapia e outros tratamentos direcionados, a radioterapia e a quimioterapia continuam a ser os principais tratamentos usados para a cura do cancro.

Estima-se que cerca de 50% dos pacientes sejam submetidos à radioterapia e 60 a 80% recorram à quimioterapia.

Após um tratamento com quimioterapia, as células cancerígenas podem optar por entre um dos três destinos – podem morrer, entrar em senescência ou permanecer “vivas”.

Quando as células cancerígenas têm mutações no seu sistema de reparação de DNA, optam geralmente por morrer, ou entrar em apoptose, também conhecida como morte celular programada.

Quando optam pela senescência, entram num estado em que já não se podem dividir, mas permanecem vivas. Quase como um estado de sobrevivência. Quando conseguem resistir ao tratamento, continuam a replicar-se e o cancro continua a progredir.

No entanto, não se sabe ainda em que momento exato e que mecanismos é que espoletam esta decisão. Sabe-se, porém, que a senescência pode ser prejudicial, na medida em que permite que outras células cancerígenas se tornem mais agressivas.

Num estudo recente publicado na revista Cell Systems, um grupo de investigadores do MIT descobriu que certos tipos de quimioterapia podem fazer com que as células cancerígenas entrem em senescência, o que poderá ser prejudicial. E estes resultados surgiram 12 horas após o tratamento.

Esta investigação é particularmente interessante porque, ao que tudo indica, as proteínas responsáveis por promover a proliferação celular e apoptose, são as mesmas que induzem senescência, quando expostas a baixas doses de quimioterapia.

Através de experiências com modelação computacional, os investigadores identificaram um fator de transcrição, o AP-1, que parece estar relacionado com a indução da senescência.

Neste modelo computacional foram utilizados dois conjuntos de dados que permitem correlacionar fatores como o tempo, a dosagem, a sinalização celular e o destino destas células.

De acordo com os resultados, foram identificadas proteínas específicas (MAP quinase, Erk, JNK e fator de transcrição c-Jun), responsáveis por acionar o complexo de proteínas AP-1, capaz de induzir a senescência nas células cancerígenas.

Numa outra experiência, o JNK e o Erk foram inibidos, de forma a impedir a senescência. Surpreendentemente, e mesmo sem JNK e Erk, as células entraram em senescência após 12 horas.

Além disso, e ao longo do tempo, observou-se que as MAP quinases alteraram a sua função e passaram a produzir proteínas pró-inflamatórias, que estimularam outras células cancerígenas a proliferar, tornando-as resistentes à quimioterapia.

Tatiana Netterfield, estudante de pós-graduação no laboratório liderado e principal autora do estudo afirma que, “Proteínas como as citocinas encorajam o “mau comportamento” nas células tumorais vizinhas, o que promove a progressão do cancro. E por isso, acredita-se que as células senescentes que estão próximas de um tumor por longos períodos podem ser prejudicais no tratamento do cancro”.

As descobertas realizadas destacam a importância de entender as características moleculares das células cancerígenas e outros fatores externos, como o tempo e a dosagem, na determinação do destino celular durante o tratamento de um cancro.

Estes resultados aplicam-se a um tipo comum de quimioterapia em que os fármacos utilizados interrompem a replicação do DNA.

A investigação adverte ainda contra a administração de inibidores de MEK, uma classe de inibidores de Erk utilizados para conter o crescimento do cancro. Em conjunto com a quimioterapia, esta combinação pode levar, involuntariamente, à proliferação celular.

Os próximos estudos vão concentrar-se na compreensão dos fatores que influenciam as células individuais a decidir proliferar ou entrar em senescência.

Com recurso à Sequenciação de Nova Geração (NGS) espera-se identificar os genes regulados por c-Jun responsáveis pela indução de senescência. Esta descoberta releva também a importância de considerar interações de sinalização complexas no desenvolvimento de novos tratamentos.

Patrícia Carvalho, ZAP //

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