Um mundo invertido no tecido da realidade: cientistas veem “Anéis de Alice” pela primeira vez

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Heikka Valja/Aalto University

anéis de alice

A ilustração artística de um “Anel de Alice”, observado agora pela primeira vez na natureza

“O mundo assume uma forma diferente ao espreitar através do centro do anel”. Emocionante observação abre portas à descoberta dos componentes mais profundos do Universo e pode ajudar-nos a entender a verdadeira realidade.

Manipulando átomos “gelados” para formar uma estrutura anelar, físicos conseguiram ver os átomos mais além: quando objetos passam (ou são observados) através deste objeto agora criado — denominado “Anel de Alice” — as propriedades de objetos quânticos mudam e o mundo… vira-se ao contrário (literalmente).

A formação de estranhos loops no tecido da realidade foi assim observada pela primeira vez e registada num estudo publicado esta terça-feira na Nature.

Os “Anéis de Alice” — assim denominados em homenagem a Alice no País das Maravilhas por terem a mesma propriedade do famoso espelho de Alice — foram vistos a formar-se no gás extremamente frio, de acordo com o Science Alert, numa distorção nos campos quânticos conhecida como monopolos (ou defeitos) topológicos.

Apesar de serem muito difíceis de criar, em 2015, apenas um ano após provar a existência de um monopolo topológico, o físico e membro da Colaboração Monopolo da Universidade de Aalto na Finlândia, Mikko Möttönen e os seus colegas conseguiram observar um isolado pela primeira vez num estado ultrafrio de átomos de rubídio chamado condensado de Bose-Einstein (BEC).

“O mundo é diferente” no centro do Anel

Nesta última investigação, os investigadores observaram novamente um monopolo topológico, mas desta vez o resultado final, pode-se dizer que era como uma pequena porta para o País das Maravilhas: estruturas denominadas cordas de Alice. Após alguns milissegundos, cada monopolo que a equipa criou expandiu-se num destes anéis com uma propriedade peculiar.

“De longe, o anel de Alice parece apenas um monopolo, mas o mundo assume uma forma diferente ao espreitar através do centro do anel”, diz David Hall, um físico da Universidade de Amherst, nos EUA. Tal como o próprio espelho de Alice, passar pelo estranho loop magnético num campo quântico de BEC pode virar tudo de cabeça para baixo.

“Há uma peculiaridade neste anel Alice. Dependendo de se olhar para algum monopolo próximo através do anel, ou do lado do anel, a sua carga parece diferente. Portanto, o anel está a inverter a carga dos objetos que se olha”, explica Möttönen.

Simulações de computador mostraram ainda que a carga de um monopolo inverteria completamente — de positiva para negativa, por exemplo — se passasse pelo anel Alice.

Outros monopolos que passam por esta “força anelar” tornam-se invertidos nas suas versões espelhadas, virando o anel para o seu oposto à medida que deslizam.

É um progresso que a equipa entende como emocionante: quanto mais aprendermos sobre a natureza instável dos campos quânticos, melhor poderemos mapeá-la e entender as verdades mais profundas da realidade.

“A descoberta ilumina e inspira a procura dos componentes mais profundos do Universo, da matéria e da informação.”, diz Möttönen.

Tomás Guimarães, ZAP //

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