O Lactarius indigo é um cogumelo nutricionalmente rico e que pode resolver o problema da diminuição de terrenos florestais.
A conversão de florestas em terras agrícolas está a acontecer a uma velocidade surpeendente. Entre 2015 e 2020, a taxa de desflorestação foi estimada em cerca de 10 milhões de hectares por ano.
Em comparação com 2012, a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) prevê um aumento maciço na procura agrícola de 50% até 2050.
Na América do Sul, cerca de 71% da floresta tropical foi substituída por pastagens e outros 14% foram perdidos para a produção de ração animal. Um dos principais sucessos da COP26 foi a promessa dos líderes mundiais de acabar com a desflorestação até 2030.
Do ponto de vista climático e de carbono, sabemos que o corte de árvores nesta escala é devastador. Mas os impactos são mais profundos: 75% da água doce acessível no mundo provém de bacias hidrográficas florestadas.
E com 80% da população mundial a enfrentar uma ameaça à sua segurança hídrica, as árvores desempenham um papel muito significativo na contenção da desertificação e na prevenção da erosão do solo. Também protegem contra inundações em áreas costeiras, além de abrigar um grande número de espécies, muitas das quais são importantes polinizadores de culturas.
Então, o que podemos nós fazer? Sabemos que alimentos diferentes têm pegadas ecológicas diferentes. A redução da quantidade de produtos de origem animal terá um enorme impacto. Na realidade, comer menos carne é uma das mudanças mais potentes que as pessoas no ocidente podem fazer para ajudar a salvar o planeta.
Mas e se pudéssemos ir mais longe? E se, em vez de ter agricultura e silvicultura em conflito direto, pudéssemos desenvolver um sistema que permita a produção de alimentos e floresta na mesma parcela de terra?
Cogumelos milagrosos
É exatamente nisto que um novo estudo se concentra, analisando fungos que crescem em parceria com árvores, num arranjo mutuamente benéfico.
Esta é uma associação comum e algumas espécies podem produzir grandes corpos de frutificação de cogumelos, como a altamente valorizada trufa. Além dessa iguaria, o cultivo dessas espécies é um campo novo e emergente.
Mas o progresso está a ser feito especialmente num grupo conhecido como milk caps, que inclui uma espécie de um raro azul brilhante conhecida como Lactarius indigo.
Rico em fibras alimentares e ácidos gordos essenciais, a pigmentação azul deste cogumelo comestível significa que são fáceis de identificar com segurança. Com os extratos a demonstrarem propriedades antibacterianas e capacidade de matar células cancerígenas, o Lactarius indigo também pode ser uma fonte de potencial farmacológico.
Neste novo estudo, os cientistas descreveram como cultivar esta espécie, desde o isolamento em laboratório até à criação de árvores com raízes com este fungo simbiótico. Estas árvores podem ser plantadas em escala em zonas climáticas adequadas, desde a Costa Rica até aos EUA. À medida que a parceria da árvore e do fungo amadurece, começam a produzir estes cogumelos repletos de proteínas.
A agricultura em terras desflorestadas é dominada pela produção de carne pastoril, onde são produzidos cerca de 4,76-6,99 kg de proteína por hectare por ano. Mas, se esse sistema fosse substituído pelo plantio de árvores que hospedam o Lactarius indigo, a mesma quantidade de terra poderia produzir 7,31kg de proteína por ano.
Os cogumelos podem ser consumidos frescos, processados ou o teor de proteína pode ser extraído para produzir outros alimentos.
Isto levaria a mais produção de alimentos, com todos os benefícios que as florestas trazem e sem os encargos ambientais da agricultura intensiva, como fertilizantes, uso de água ou cultivo de ração adicional.
A criação de carne bovina contribui para as alterações climáticas emitindo gases com efeito de estufa, mas à medida que essas árvores com fungos crescem, retiram carbono da atmosfera, ajudando na luta contra a crise climática.
Assim, além de produzir mais alimentos, o processo também pode aumentar a biodiversidade, ajudar na conservação, atuar como captador de carbono e ajudar a estimular o desenvolvimento económico nas áreas rurais.
Os investigadores acreditam que esta abordagem é mais barata – ou mais económica na vertente custo/benefício – do que a pecuária bovina. Mas esta é uma nova tecnologia e, como todas as inovações, é necessário ajuda. Isto significa mais estudos e investimentos financeiros adequados para desenvolver a tecnologia até ao ponto em que os agronegócios se sintam confiantes para investir em escala.
ZAP // The Conversation
Onde estará o verdadeiro problema, não será num aumento demográfico descontrolado? Só não vê quem não quer mesmo ver! Para que seria necessária tanta desflorestação se não houvesse tanta procura de alimentos?