Organizações de defesa dos direitos humanos apelaram esta sexta-feira à libertação imediata de uma jornalista detida em Marrocos por um “aborto ilegal”, que esta nega, enquanto as mensagens de apoio se multiplicam nas redes sociais.
“Em vez de intimidar Hajar Raissouni, perseguindo-a com acusações injustas, as autoridades deviam libertá-la imediatamente e sem condições”, afirmou Heba Morayef, diretora regional da Amnistia Internacional, num comunicado.
“Violar o seu direito à vida privada e criminalizar uma liberdade individual é inadmissível”, secundou Ahmed Benchemsi, diretor regional da Human Rigths Watch. “Acrescem as suspeitas de golpe baixo político visto que a acusada é repórter num dos últimos jornais independentes de Marrocos”, adiantou.
Raissouni, 28 anos, jornalista do diário de língua árabe Akhbar Al-Yaoum, foi detida por seis polícias à saída de uma clínica da capital de Marrocos e submetida a um exame médico que contesta.
Ficou detida até ao julgamento previsto para segunda-feira por “aborto ilegal” e “relações sexuais fora do casamento”. O namorado, com o qual deve casar em meados deste mês, segundo os seus familiares, foi detido ao mesmo tempo, assim como o médico que a tratava, um enfermeiro e uma secretária.
Na quarta-feira, o procurador-geral do rei no tribunal de primeira instância de Rabat detalhou, num longo comunicado, os elementos médicos que confirmavam os seus “sinais de gravidez” e o seu “aborto voluntário tardio”. “A acusação da pessoa em causa nada tem a ver com a sua profissão de jornalista, referindo-se a factos considerados pelo Código Penal como crimes”, adiantou.
A jornalista, por seu turno, denuncia um “caso político” relacionado com os seus artigos, segundo os seus familiares. Raissouni assegura numa carta publicada pelo seu jornal ter sido interrogada sob custódia sobre os seus tios, um ideólogo islâmico que preside a uma associação religiosa e um editorialista do Akhbar Al-Yaoum conhecido pelas suas críticas.
O editor do seu jornal, Touafik Bouachrine, foi condenado no final de 2018 a 12 anos de prisão num caso de agressão sexual, cujo recurso está a ser analisado em Casablanca. O jornalista também denunciou um “processo político”, desmentindo as acusações que o visavam.
O caso suscitou indignação nos media e nas redes sociais, com reações sobre o direito à vida privada, as liberdades individuais e o direito das mulheres a disporem dos seus corpos. Cerca de 150 jornalistas assinaram uma petição de solidariedade, denunciando as “campanhas difamatórias” visando destruir a sua colega.
A lei marroquina pune a interrupção voluntária da gravidez com penas de seis meses a cinco anos de prisão, a não ser que a vida da mãe esteja em risco. De 600 a 800 abortos clandestinos são realizados diariamente em Marrocos, segundo as associações que defendem a legalização da interrupção voluntária da gravidez.
// Lusa