A Irlanda “lixou-se completamente” na UE

HM Treasury/Flickr

Michael McGrath, Comissário Europeu da Justiça.

Desorganização e distrações internas fazem cair influência de Dublin na nova Comissão Europeia. “O nosso desempenho foi muito fraco”.

Dublin tem cada vez menos influência na União Europeia (UE) e o fraco desempenho na obtenção de lugares de topo na UE, após a última remodelação, está a suscitar preocupações entre alguns funcionários irlandeses, especialmente na definição de políticas económicas.

“Não sei se [o Governo irlandês] tinha um plano, ou qual era o plano”, disse um funcionário irlandês ao jornal Politico — um de cinco que manifestaram a sua frustração e culparam uma abordagem desorganizada e perda de oportunidades na nova Comissão Europeia.

Apesar de um historial de forte representação em funções-chave, incluindo as pastas dos serviços financeiros e da agricultura, a Irlanda encontra-se agora com uma influência limitada em áreas fundamentais como os serviços financeiros, o orçamento da UE e a economia, alertam os funcionários.

De acordo com as várias fontes em Dublin e Bruxelas, a campanha da Irlanda para pôr funcionários em funções estratégicas foi prejudicada por distrações internas e por relutância em envolver-se na intensa atividade política. O Governo irlandês não terá conseguido desenvolver uma estratégia coerente e deixou o país à margem das negociações.

A frustração é agravada pelos atrasos na finalização da equipa do novo comissário irlandês, Michael McGrath, que supervisiona a pasta da Justiça. Neste mandato, apenas seis funcionários irlandeses — dois da equipa de McGrath — vão ocupar lugares-chave, de acordo com uma lista de nomeações quase definitivas do Governo a que o Politico teve acesso.

A tomada de decisão tardia de McGrath deixou a Irlanda em desvantagem nas negociações, obrigando o país a contentar-se com cargos menos influentes. Os críticos argumentam que a abordagem cautelosa do comissário, destinada a manter a Irlanda “acima da luta”, acabou por minar a sua capacidade de garantir papéis-chave.

“O nosso desempenho foi muito fraco”, disse um dos funcionários que falou com o jornal dedicado aos assuntos políticos da UE; “fomos completamente lixados”, desabafou um terceiro funcionário, alegando que quem conseguiu cargos nos gabinetes “já tinha amigos” no sistema.

O processo de nomeação, a alteração das regras de contratação de ministros e a influência dos grupos políticos da UE terão criado ainda mais obstáculos na campanha irlandesa. Para agravar o problema, a rede relativamente pequena da Irlanda no seio das instituições da UE foi comparada com a de atores mais agressivos como o Luxemburgo e França, que conseguiram acordos no início do processo.

Alguns funcionários irlandeses acreditam que a preferência tradicional do seu país pela diplomacia em detrimento da negociação saiu pela culatra. “Os irlandeses querem que gostem deles”, disse um alto funcionário do sector financeiro.

E em vez de recorrer a contactos pessoais para assegurar cargos, a representação permanente da Irlanda junto da UE baseou-se em contactos por correio eletrónico, acusam estes funcionários, que denunciam falta de coordenação entre os diplomatas seniores e a equipa de McGrath.

A queda da influência da Irlanda ocorre num momento crítico para a UE, com o bloco a enfrentar desafios económicos e uma paisagem política em mudança. A viragem à direita nas recentes eleições da UE, associada aos esforços para excluir os partidos de extrema-direita dos cargos de topo, complicou ainda mais os esforços da Irlanda para colocar os seus funcionários em posições influentes, nota o Politico.

A sub-representação da Irlanda nas instituições da UE também agrava a situação. Uma estratégia nacional alertou para um “abismo demográfico”, com muitos funcionários irlandeses de alto nível a reformarem-se nos próximos anos. Se não forem tomadas medidas, prevê-se que o número de funcionários irlandeses nos níveis de entrada e de gestão intermédia diminua significativamente, contribuindo ainda mais para a decrescente influência do país no espaço europeu.

ZAP //

Siga o ZAP no Whatsapp

Deixe o seu comentário

Your email address will not be published.