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A IA já consegue descobre a autoria das jogadas de xadrez — com riscos para a privacidade

Everton Amaro / SESI SP

Garry Kasparov, ex-campeão Mundial de Xadrez

Investigadores da Universidade de Toronto optaram por não revelar o código do software que usaram, reconhecendo os riscos para a privacidade que a sua tecnologia acarreta.

Ao longo dos últimos anos, a inteligência artificial já provou em inúmeras ocasiões as suas capacidades, sejam na identificação da caligrafia e da voz de cada indivíduo, mas também nos traços do pincel dos pintores, permitindo a identificação de autores de obras cuja autoria está confirmar. No entanto, a tecnologia parece ter dado um próximo passo, ao conseguir identificar pessoas tendo por base a forma como jogam xadrez, o que pode acarretar um perigos ao nível da privacidade. A tecnologia, no campo das stylometrics pode ajudar os computadores a serem melhores professores de xadrez ou a tornarem o seu jogo “mais humano”. Ainda assim  os prejuízos superam largamente os ganhos.

“As ameaças ao nível da privacidade estão a crescer rapidamente” explica Alexandra Wood, advogada e membro da Universidade de Harvard à revista Science. Segundo a própria, estudos como este, que detetou esta capacidade da inteligência artificial, quando conduzidos de forma responsável, podem ser úteis por chamarem a atenção para aspetos da perda de privacidade.

Há muito que os softwares de xadrez, como o Deep Blue ou o AlphaZero, são vistos como super homens. No entanto, Ashton Anderson, da Universidade de Toronto, — envolvido neste novo projeto — não os considera muito úteis para o consumidor comum, devido ao seu estilo “alien” pouco pedagógico e instrutivo para quem pretende aprender a jogar ou melhorar as suas capacidades. Na realidade, são bons a adaptar os seus conselhos aos jogadores individuais, no entanto, precisam de captar a essência de cada jogador.

Nesta nova investigação, para proceder ao design e ao treino da tecnologia, os investigadores exploraram um recurso amplo: mais de 50 milhões de jogos completados por humanos no site Lichess. Procederam à recolha de jogos cujos participantes tinham jogado pelo menos mil vezes e sequenciaram até 32 jogadas dessas mesmas partidas. Codificaram cada movimentação e inseriram-nas numa rede neural que representava cada jogo como um ponto num espaço multidimensional, de forma a que o jogo de cada participante formasse um conjunto de pontos.

A rede foi treinada para maximizar a densidade do conjunto de pontos de cada participante e a distância entre os pontos de diferentes jogadores. Isto obrigou o sistema a reconhecer que características eram distintivas no estilo de jogo de cada um dos participantes. Posteriormente, os investigadores tentaram apurar quão bem o sistema conseguia fazer essa distinção. Como? Dando-lhe cem jogos de cada um dos 3000 jogadores identificados e 100 novos jogos de um participante mistério. O sistema procurou o perfil mais idêntico, conseguindo adivinhar 86% dos perfis, explicaram os cientistas numa conferência no último mês.

“Não conseguimos acreditar nos resultados na altura”, apontou Raid Mcllroy-Yong, um dos autores da investigação. Ainda assim, a equipa reconhece os riscos ao nível da privacidade que estão implícitos ao uso da tecnologia — que também pode ser usada para desmascarar jogadores anónimos, por exemplo. O mesmo raciocínio também pode ser usado e aplicado ao póquer e a outras atividades que não passam por jogo, ou seja, a condução e o tempo e localização do uso dos telemóveis. Talvez por isso, os investigadores optaram por não lançar o código de software que desenvolveram e usaram.

ZAP //

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