Corria o ano de 1927 e o psiquiatra austríaco Julius Wagner-Jauregg vencia o prémio Nobel da Medicina após curar, com sucesso, pacientes com sífilis em fase avançada, infetando-os com outra doença… a malária.
Foi depois de tropeçar no trabalho de 1876 do psiquiatra Alexander Samoilovich Rosenblum — que passava por infetar doenças causadoras de febre em pacientes com episódios psicóticos e (surpreendentemente) curou metade dos doentes — que o psiquiatra austríaco Julius Wagner-Jauregg começou um estudo prático sobre o assunto, depois de três décadas a avaliá-lo.
Para o fazer, o médico de sessenta anos concentrar-se-ia na doença que estava na moda em 1917 — a sífilis, na altura considerada incurável. A sífilis tinha apenas um medicamento no mercado, Salvarsan, que não era de todo eficaz.
A sífilis é uma infeção sexualmente transmissível causada pela subespécie pallidum da bactéria Treponema pallidum. Em fases tardias, a infeção pode chegar ao cérebro, provocando deterioração mental, alterações de personalidade, alucinações e demência que pode persistir por um período de três a cinco anos antes de cumprir o seu objetivo — matar.
5 a 10% das admissões em alas de psiquiatria em 1945 deviam-se, segundo o Big Think, à sífilis.
Matar o bicho com mais bicho
Recorrendo ao sangue de indivíduos infetados com malária, Julius Wagner-Jauregg decidiu inseri-lo nos pacientes com sífilis em fase avançada, infetando-os com uma nova — mas não tão mortal — doença, muitas vezes sem o seu consentimento.
A antevisão de Jauregg estava certa: a malária provocava febres tão altas que matava as bactérias causadoras da sífilis.
Uma vez no corpo do paciente com sífilis, a malária era tratada com quinina — exceto nos casos em que os pacientes acabavam por falecer, muitos graças à sífilis, poucos graças à malária que piorou a sua condição.
No entanto, 25% dos pacientes recuperaram e a sífilis em fase tardia deixou de ser vista como uma sentença de morte.
A polémica prática enquadra-se ainda hoje, para alguns, no grupo das mais desaprovadas pesquisas a vencer o infame prémio.
O tratamento acabaria por se espalhar e uma revisão concreta da mesma acabou por ser feita, em 1926, que mostrou que o tratamento resultava em remissão total de sífilis em 27,5% dos casos e remissão parcial em 26,5%. 46% dos casos resultavam em nenhuma alteração do estado da doença ou em morte.
Como resultado dos números revolucionários, o psiquiatra acabaria por vencer o prémio Nobel da Medicina no ano de 1927.
A penicilina chegaria mais tarde, tornando obsoleto o tratamento encontrado por Rosenblum e Jauregg.