As inseminações caseiras estão a crescer em Portugal. São combinadas através de grupos privados de Facebook e são habitualmente grátis. Contudo, há bastantes dúvidas quanto à sua legalidade e, sobretudo, segurança.
O tempo de espera no SNS é de três anos. No privado, é caro. A solução para muita gente que quer engravidar é fazer uma inseminação caseira.
Este é um método em que, sem relação sexual e sem médicos, é inserido esperma na vagina com recurso a uma seringa.
Em Portugal, esta prática está a ganhar força – e, em muitos casos, começa em grupos privados Facebook, com homens dispostos a doar sémen e mulheres que querem engravidar.
João (nome fictício) é um dador de sémen e relatou ao Correio da Manhã a forma simples como se processa esta prática: “Limito-me a fazer a recolha do meu esperma para um copo e entregar. O processo de recolha e de inseminação deve durar no máximo 30 minutos, convém não perder muito tempo.”
Este dador anónimo confessa que tem sido muito requisitado. Apesar de não ter a quantificação das inseminações, assegura que “foram dezenas, algumas com sucesso à primeira”.
“Tive vários positivos até em centros comerciais, aliás, o primeiro positivo foi num shopping”, conta João, que refere que não cobra dinheiro, porque considera suficientemente gratificante passar a sua genética para novas gerações: “Quero ajudar quem precisa e não escondo que há um lado de orgulho em sentir que os meus genes estão a ser passados para uma nova geração”.
Como refere a investigação do CM, a maior parte destes grupos para inseminações caseiras são constituídos sobretudo por casais de lésbicas e mulheres solteiras. Contudo, também há casais heterossexuais.
Na teoria, este método não envolve sexo. Mas João conta que há quem peça. “Tudo sem qualquer contrapartida financeira“, adverte.
“Já me pediram para fazer de forma natural. Já aceitei e já rejeitei, até porque recuso quando as mulheres rejeitam fazer análises“, esclarece.
“É um crime”
As opiniões dividem-se quanto à legalidade do método caseiro de inseminação.
Ao CM, Carlos Calhaz Jorge, presidente do Conselho Nacional de Procriação Medicamente Assistida (CNPMA) fala de um “crime à luz da nossa legislação”.
A lei prevê que as técnicas de procriação medicamente assistida só podem ser feitas em locais autorizados pelo Ministério da Saúde e que quem o faz tem de estar qualificado para tal.
Calhaz Jorge confirmou à Lusa que a inseminação realizada em casa “é um crime”, considerando ser uma “fantasia cultural” que devia ser evitada.
“As técnicas de procriação medicamente assistida, em que se incluem a inseminação artificial, são obrigatoriamente e legalmente apenas realizáveis em centros autorizados expressamente para o efeito. Se o CNPMA tivesse ou vier a ter conhecimento de algum caso concreto, terá de o comunicar ao Ministério Público, porque isso é um crime”, explicou.
De acordo com o responsável, o método da “inseminação caseira” é “uma completa ilegalidade e do ponto de vista prático, em termos de respeito pela saúde e de evitar riscos de infeções ou riscos genéticos, é um absoluto contrassenso”.
“O que está em causa é o não escrutínio e a inexistência de critérios técnicos e de rastreios em relação aos doadores. Isto para já não falar no outro aspeto legal, que é, só as crianças eventualmente nascidas de doação poderão ter acesso à identidade dos dadores quando atingirem 18 anos. Portanto, ninguém mais envolvido nos procedimentos, nem os beneficiários ou as beneficiárias legalmente têm o direito de saber a identidade dos doadores”, realçou.
Por outro lado, o advogado José Paulo Pinho referiu, ao Correio da Manhã, que “a lei é um bocado omissa”. Em muitos casos, estas questões são possíveis de contornar.
“Vamos supor que tem uma relação ocasional. Porque é que pode haver a introdução de sémen [através de uma relação sexual] e não o pode deixar para introduzir? Qual é a diferença?”, questiona o advogado.
Riscos para saúde
Quanto à segurança, preocupam as infeções sexualmente transmissíveis, os ferimentos ou problemas vaginais, as reações anafiláticas, bem como contaminações.
“Numa inseminação artificial o esperma é tratado. Numa inseminação caseira não sabemos e pode haver uma reação alérgica grave”, Miguel Tuna, especialista em Ginecologia-Obstetrícia e Medicina de Reprodução, ao CM.
Embora não recomendando este método, o médico reconhece que muitas mulheres o encaram como “uma luz ao fundo do túnel” – principalmente para quem espera três anos no SNS ou não tem dinheiro para pagar uma clínica privada.
Tá acabando o tacho, agora é lutar sempre do contra… faz-me lembrar as petroliferas e os carros eléctricos.