Ficheiros secretos revelam plano de ataque nuclear de Putin — e que cidades destruiria primeiro

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A Rússia treinou a sua marinha para atingir locais no interior da Europa utilizando mísseis com capacidade nuclear num potencial conflito com a NATO, de acordo com ficheiros secretos a que o Financial Times teve acesso.

O jornal britânico Financial Times revelou esta terça-feira detalhes sobre 29 documentos secretos que descrevem os planos de um eventual ataque nuclear da Rússia.

Os documentos confidenciais, que foram objeto de uma fuga de informação, listam 32 alvos localizados em países da NATO, que foram detalhados numa apresentação para oficiais antes da invasão da Ucrânia.

Os mapas apontam alvos tão distantes da Rússia como a costa ocidental de França e a pequena cidade portuária de Barrow-in-Furness, na costa oeste da Grã-Bretanha.

O FT tinha já revelado antes, com base no mesmo conjunto de ficheiros militares secretos, que Moscovo tinha ensaiado a utilização de armas nucleares táticas nas fases iniciais de um conflito com uma grande potência mundial.

As últimas revelações mostram agora que a Rússia previa um conflito com o Ocidente que se estendesse muito para além da sua fronteira imediata com a NATO, planeando uma série de ataques avassaladores em toda a Europa Ocidental.

Os ficheiros, elaborados por oficiais russos entre 2008 e 2014, incluem uma lista de alvos para mísseis que podem transportar armas nucleares táticas ou ogivas convencionais.

Financial Times / Mapbox

Alvos potenciais para uma das frotas navais da Rússia

A apresentação sublinha também as vantagens que a Rússia teria em lançar ataques nucleares numa fase inicial, e salienta que as forças armadas russas  mantiveram a capacidade de transportar armas nucleares em navios de superfície — uma capacidade que, segundo os especialistas, implica riscos adicionais significativos de escalada ou acidentes.

Os documentos referem que a “elevada capacidade de manobra da marinha” permite-lhe conduzir “golpes súbitos e preventivos” e “ataques com mísseis maciços a partir de várias direções”.

A apresentação acrescenta que as armas nucleares são, “regra geral”, concebidas para serem “usadas em combinação com outros meios de destruição” para atingir os objetivos da Rússia.

Especialistas que analisaram os documentos, citados pelo FT, consideram que estes eram coerentes com a forma como a NATO avaliava a ameaça de ataques com mísseis de longo alcance por parte da marinha russa e a rapidez com que a Rússia recorreria provavelmente à utilização de armas nucleares.

Segundo William Alberque, antigo funcionário da NATO, considera que a amostra é “uma pequena parte de centenas, se não milhares, de alvos cartografados em toda a Europa, incluindo alvos militares e de infra-estruturas críticas”.

A capacidade da Rússia para atacar em toda a Europa significa que os alvos em todo o continente estariam em risco assim que o seu exército entrasse em confronto com as forças da NATO em países da linha da frente, como os Estados Bálticos e a Polónia, afirmaram analistas e antigos funcionários militares.

O conceito de guerra deles é a guerra total”, diz por seu turno Jeffrey Lewis, professor do Instituto de Estudos Internacionais de Middlebury, em Monterey, que estuda o controlo de armas.

“Os militares russos olham para estas coisas, para as ogivas nucleares táticas, como armas que potencialmente ganhariam uma guerra. Vão querer usá-las, e vão querer usá-las muito rapidamente“, acrescenta o analista.

As armas nucleares táticas, que podem ser lançadas por mísseis terrestres ou marítimos ou por aviões, têm um alcance mais curto e são menos destrutivas do que as armas “estratégicas” de maiores dimensões, concebidas para atingir alvos mais distantes, como os Estados Unidos.

No entanto, libertam muito mais energia do que as lançadas sobre Nagasaki e Hiroshima em 1945.

O Presidente russo, Vladimir Putin, tem recorrido repetidamente a ameaças contra os aliados europeus da Ucrânia para evitar o apoio militar ocidental a Kiev. “Têm de se lembrar que são países pequenos e densamente povoados“, afirmou em maio.

Um ataque deste tipo, segundo os ficheiros, mostraria “a disponibilidade e a prontidão para a utilização de armas nucleares não estratégicas de precisão” e a “intenção de utilizar armas nucleares“.

Os documentos referem que a principal prioridade russa num conflito com a NATO é “enfraquecer o potencial militar e económico do inimigo“. Segundo os analistas, isso significaria que a Rússia atacaria locais civis e infra-estruturas críticas, como fez na Ucrânia.

Fabian Hoffmann, investigador de doutoramento da Universidade de Oslo que estuda a política nuclear, considera que a combinação de ataques nucleares e convencionais apresentada é “um pacote que basicamente sinaliza ao adversário que, neste momento, as coisas estão a aquecer, e que seria sensato que começassem a falar com eles sobre a forma de resolver a situação”.

Putin afirmou em junho que a Europa ficaria “mais ou menos indefesa” contra os ataques de mísseis russos. Segundo dados da NATO, os países da aliança têm menos de 5% das capacidades de defesa aérea necessárias para proteger o flanco oriental da aliança contra um ataque em grande escala da Rússia.

Os documentos divulgados também indicam que a Rússia manteve a capacidade de transportar armas nucleares táticas em navios de superfície, apesar de um acordo de 1991 entre a União Soviética e os EUA para as retirar.

Ao contrário de um submarino estratégico de mísseis balísticos concebido para disparar cargas nucleares das profundezas do oceano, um navio de frota de superfície com ogivas nucleares a bordo correria um risco muito maior de sofrer danos causados por tempestades ou por um ataque inimigo.

Exercícios recentes ordenados por Putin para ensaiar a utilização de armas nucleares táticas sugerem que os documentos que vazaram ainda são consistentes com a atual doutrina militar russa.

Em junho, as forças armadas russas treinaram o carregamento de mísseis de cruzeiro anti-navio P-270 da era soviética numa corveta da classe Tarantul, em Kaliningrado, onde, segundo oficiais da NATO, se encontra um arsenal não declarado de ogivas nucleares táticas.

ZAP //

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