Foi devorado por um leão. Era um gladiador ou um prisioneiro condenado?

Yuntero / Wikipedia

Fresco com cena de gladiadores do Anfiteatro de Mérida (Museu Nacional de Arte Romana, Mérida, Badajoz).

Um esqueleto em Inglaterra pode ter pertencido a um gladiador que morreu a lutar contra um grande felino, possivelmente um leão, segundo um novo estudo.

As marcas de mordedura num esqueleto com 1800 anos da Grã-Bretanha romana sugerem que um gladiador foi atacado até à morte por um grande felino, possivelmente um leão, segundo um novo estudo.

No entanto, cientistas que não estiveram envolvidos na investigação manifestam algumas dúvidas em relação às conclusões do estudo.

Segundo um perito citado pelo Live Science, o malogrado indivíduo não teria sido um gladiador; poderá ter sido, em vez disso, um prisioneiro condenado.

Apesar da discordância, algumas coisas são certas: os ossos do homem revelam que foi decapitado, possivelmente quando estava a morrer ou já morto.

“A decapitação deste indivíduo foi provavelmente para acabar com o seu sofrimento no momento da morte, ou para se conformar com a prática habitual”, escreveram os autores do estudo, que foi publicado na quarta-feira na revista PLOS One.

A forma e a profundidade das marcas de mordidelas encontradas no esqueleto do homem indicam que um grande felino, possivelmente um leão, o tinha atacado. “A forma é inteiramente consistente com casos documentados de mordidas de grandes felinos”, escreveu a equipa no artigo.

O homem, que tinha entre 26 e 35 anos na altura da sua morte, foi enterrado num cemitério que se pensa conter os enterros de outros gladiadores. Na época romana, o cemitério situava-se em Eboracum, que é atualmente a cidade de York, em Inglaterra.

“O indivíduo, cujos ossos foram encontrados em escavações realizadas entre 2004 e 2005, tem duas identidades possíveis, diz John Pearce, arqueólogo do King’s College de Londres e o coautor do estudo

De acordo com Pearce, o indivíduo poderá ter sido “um gladiador treinado que lutou contra o grande felino com uma arma, ou um homem que tinha sido condenado à morte e lutou com as mãos nuas ou amarrado a um poste”.

Pearce considera mais provável que o homem fosse um gladiador treinado. “A probabilidade de isso acontecer é elevada neste caso, devido ao argumento de que o cemitério onde ele está enterrado é um cemitério de gladiadores”, disse Pearce ao Live Science.

Os outros esqueletos desenterrados no cemitério têm ferimentos consistentes com os de gladiadores. “Há evidências de traumas curados e feridas cicatrizadas na coleção de corpos recuperados deste local, o que sugere lutas repetidas“, diz Timothy Thompson, antropólogo forense da Universidade Maynooth, na Irlanda, e autor principal do estudo.

“Além disso, muitos dos indivíduos enterrados foram decapitados, o que por vezes acontecia aos gladiadores derrotados no final de uma luta, escreveu a equipa no artigo”, realça THompson.

A luta em que o homem morreu provavelmente teria ocorrido num anfiteatro da cidade. “Como cidade importante da Grã-Bretanha e sede de uma legião, a Iorque romana teria quase de certeza pelo menos um anfiteatro“, afirma Pearce. No entanto, a localização exacta do anfiteatro não é clara.

Apesar de terem sido encontradas imagens de lutas contra feras em sítios romanos e de os relatos textuais mencionarem estas batalhas, até agora havia poucas provas antropológicas das mesmas.

Esta é “a primeira prova física de combate de gladiadores com animais do período romano vista em qualquer parte da Europa”, escreveu a equipa no artigo.

Conclusões controversas

Cientistas que não estiveram envolvidos na investigação tiveram reações céticas às conclusões da equipa.

Alfonso Mañas,  investigador da Universidade da Califórnia, Berkeley, que estudou extensivamente os gladiadores, duvida de muitas das conclusões da equipa.

Este homem não pode ter sido um gladiador“, diz Mañas, “porque no Império Romano, quem lutava contra feras eram prisioneiros condenados ou lutadores treinados para lutar contra feras — que não eram consideradom gladiadores“.

“Os investigadores que estudam gladiadores estão a tentar eliminar o velho erro de que os gladiadores lutavam com feras“, salienta Mañas ao Live Science.

Mañas também realça que as marcas de dentes poderiam ter vindo de lobos, que são nativos da Grã-Bretanha, e não de um leão ou outro gato grande. Uma possibilidade é que este homem tenha sido executado por decapitação e tenha sido mordido depois por um lobo ou cão, diz Mañas.

Outros investigadores consideraram plausíveis as conclusões apresentadas no artigo.

As conclusões são “certamente uma perspetiva interessante e excitante“, diz Jordon Houston, académico da Universidade de Auckland, na Nova Zelândia, ao Live Science. “No geral, este é um ótimo artigo e muito bem investigado”.

Também Mike Bishop, investigador independente que tem estudado extensivamente os gladiadores e os militares romanos, disse ao Live Science que “o artigo é certamente interessante, em grande parte por confirmar o que já se suspeitava — que nas províncias do noroeste do império romano havia lutas entre humanos e animais de grande porte”.

ZAP //

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