Crise sísmica em São Jorge. Especialistas alertam para sinais idênticos aos do vulcão de La Palma

António Araújo / Lusa

Freguesia de Santo Amaro, na ilha açoriana de São Jorge, uma das mais afetadas pela crise sísmica

O Instituto Vulcanológico das Canárias (Involcan) alerta que a crise sísmica em São Jorge, nos Açores, tem origem vulcânica e não tectónica como se supunha. Especialistas desta entidade detectaram sinais de magma semelhantes aos que antecederam a erupção do vulcão Cumbre Vieja em La Palma, em 2021.

O alerta vulcânico mantém-se no nível V4 em São Jorge, de um total de sete, o que indicia que há uma possibilidade de erupção – V6 significa “erupção em curso”. Esse cenário é vincado por dados divulgados pelo Involcan, cujos vulcanologistas detectaram um volume de magma semelhante ao registado antes da erupção do vulcão Cumbre Vieja no ano passado.

“Através da análise de dados do radar de abertura sintética adquiridos pelo satélite Sentinel-1 da Agência Espacial Europeia, pôde observar-se que, durante as últimas semanas, esta ilha experimentou uma deformação do terreno compatível com uma fonte de natureza vulcânica“, aponta o Involcan.

Os especialistas espanhóis usaram uma técnica de “interferometria de satélite” que “compara as imagens de radar obtidas em duas datas diferentes para detectar variações de fase que poderiam estar associadas com as deformações no relevo da superfície terrestre”, como explica o Involcan.

Assim, foi detectada “uma intrusão magmática ao longo de uma fractura subvertical (dique)”, com um “volume estimado” de “cerca de 20 milhões de metros cúbicos, um valor comparável com o que se observou pela deformação do terreno antes da erupção do Cumbre Vieja em 2021″, aponta ainda o Instituto espanhol.

“A situação pode mudar de forma repentina”

O investigador do Involcan Lucas Dauria explica ao Expresso que estamos perante uma deformação “bastante relevante”, com cerca de 13 centímetros e que “não é apenas um levantamento do terreno, mas também um deslocamento para norte e para sul”.

Lucas Dauria também nota que a situação em São Jorge está a ser mais lenta do que em La Palma, onde “a crise sísmica até à erupção durou uma semana e a deformação no terreno foi observada poucos dias antes da erupção”.

Contudo, o especialista repara que não é certo que a erupção venha de facto a acontecer na ilha açoriana. “A situação pode mudar de forma repentina”, nota Dauria.

“Neste momento, o número de sismos está a diminuir e se o magma não tiver energia suficiente para chegar à superfície pode estancar onde se encontra. Julgo que isso é o mais provável, mas não se pode descartar a possibilidade de uma erupção nos próximos dias ou semanas”, acrescenta o investigador.

Também o director do Centro de Informação e Vigilância Sismovulcânica dos Açores (CIVISA), Rui Marques, salienta ao Expresso que há dois cenários possíveis: “um sismo de maior magnitude, que pode causar estragos, ou uma erupção, que pode ser em Terra, semelhante à de La Palma, ou submarina“, tal como ocorreu na ilha em 1964.

Rui Marques frisa que houve “uma ligeira diminuição” na actividade sísmica a partir do dia 24 de Março, mas continua-se “a registar uma sismicidade muito acima do normal para este sistema vulcânico (de São Jorge)”. “Estamos a registar uma média de mil sismos por dia, que continua a ser extremamente elevada”, aponta o responsável do CIVISA.

Perante este cenário, o presidente do Serviço Regional de Protecção Civil e Bombeiros dos Açores, Eduardo Faria, sublinha, em declarações à RTP Açores, que esta acalmia pode levar a “uma falsa sensação de segurança”.

São Jorge sentiu o abalo maior desde início da crise

Nesta terça-feira à noite, São Jorge sentiu um sismo de magnitude 3.8 na escala de Richter. Foi o abalo mais forte desde 19 de Março, quando se iniciou a crise sismo-vulcânica, e também foi sentido nas ilhas do Pico, Faial, Terceira e Graciosa.

Fonte do Serviço Regional de Bombeiros e Protecção Civil dos Açores adianta à Lusa que “não há registo de danos”.

Segundo os dados do CIVISA, o sismo ocorreu às 21:56 (22:56 de Lisboa) e teve epicentro no mar, junto à vila das Velas.

A ilha de São Jorge contabilizou mais de 20 mil sismos, cerca de 200 dos quais sentidos pela população, desde o início da crise sísmica em 19 de Março passado. Trata-se de mais do dobro do total contabilizado em toda a Região Autónoma dos Açores durante o ano de 2021.

Veja no vídeo que se segue, divulgado pelo Instituto Português de Meteorologia, os eventos sísmicos ocorridos em São Jorge entre 19 e 29 de Março de 2022.

ZAP // Lusa

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