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Comércio transatlântico de escravos originou uma grave crise de saúde pública nas Américas

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Johann Moritz Rugendas / Wikimedia

Pintura mostra cenário de um navio que transportava escravos para as Américas

Um novo estudo mostra de que forma várias doenças foram trazidas para as Américas por colonizadores europeus durante a época em que o comércio transatlântico de escravos se afirmou na região.

O comércio de escravos no Atlântico passou pela negociação de seres humanos como mercadoria e ocorreu em todo o Oceano Atlântico entre os séculos XVI e XIX.

A grande maioria dos escravos, que foram levados para o “Novo Mundo”, eram provenientes da África Ocidental, nas partes central e ocidental do continente, sendo que eram vendidos para a execução de trabalhos forçados na Europa ou nas novas colónias.

A falta de condições humanas e de higiene com que estas pessoas eram transportadas fez com que múltiplos vírus fatais fossem disseminados pelo mundo, atingindo sobretudo a população que vivia nas Américas, e que não tinha capacidade imunológica para fazer frente às doenças provenientes de África.

Neste sentido, escreve o IFL Science, nos séculos que se seguiram à chegada dos europeus, os indígenas americanos sofreram um declínio populacional dramático.

A introdução de novos patógenos, com os quais a população nunca tinha tido contacto, fez com que cerca de 90% da população indígena morresse após a colonização. A varíola, por exemplo, é considerado o vírus mais fatal.

Até agora, a evidência direta da presença de vírus específicos durante esse período não era muito nítida, como tal, uma equipa de cientistas procurou obter mais respostas através da extração de ADN viral antigo dos dentes de pessoas enterradas durante a Era Colonial numa capela e no Hospital Real San José de los Naturales, na atual Cidade do México. A análise foi feita com base em restos mortais de indígenas e afro-descendentes.

Esta abordagem permitiu à equipa reconstruir três genomas de parvovírus B19 humanos antigos e um genoma de vírus da hepatite B humano antigo de quatro pessoas diferentes.

Ambos os patógenos humanos são agora encontrados em todo o mundo, mas na época o parvovírus B19 foi uma das principais causas de morte da população indígena. Também a hepatite B mostrou ser uma infeção potencialmente fatal.

Ao comparar estes genomas com outros de todo o mundo, a equipa descobriu que os vírus provavelmente tiveram origem na África Ocidental e foram transferidos através do transporte de escravos que tinha como rota o Oceano Atlântico.

Os resultados da pesquisa sublinham a visão de que os vários novos vírus atingiram os Estados Unidos ao mesmo tempo, o que ajuda a explicar por que razão os surtos de doenças foram tão devastadores.

Daniel Blanco-Melo, um dos autores do novo estudo, explica que a rápida disseminação dos vírus se deveu “às condições cruéis, anti-higiénicas e superlotadas que existiam nos navios que transportavam milhões de pessoas através do Atlântico”.

Estas condições, refere o autor, eram “um cenário favorável para a propagação de doenças infeciosas. Portanto, esta prática provavelmente introduziu novos patógenos para os povos indígenas que não tinham imunidade”.

O estudo foi publicado na revista eLife em agosto de 2021.

Ana Isabel Moura, ZAP //

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2 Comments

  1. É obvio que a colonização iniciada em finais do sec. XV, nomeadamente por Portugueses e Espanhóis, utilizou métodos que nos dias de hoje eram impensáveis e mesmo proibidos. Mas se vamos julgar esses métodos há tanto tempo passados, num período da História onde tudo era permitido, os que se encontram totalmente extintos pelo menos a maioria, e em quase todo o mundo, e vamos relevar para segundo plano o que se passou na 2ª Guerra Mundial com a Alemanha num passado bem recente, onde os seu efeitos ainda se fazem sentir no mundo dos vivos, e onde é possível sim julgar literalmente alguns dos seus intervenientes!!!!

    • Pos eu fiz agora um estudo do alto do meu sofá onde verifico que o tráfego aéreo é a maior causa de propagação de doenças no mundo e em pleno século XXI!!!
      Estudos óbvios que nada trazem de novo e que só servem para esses investigadores arranjarem financiamento e darem créditos de prestígio às universidades onde trabalham ou estudaram (TOP universidades).
      É tudo política e dinheiro, nada mais, meu amigo.

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