Para combater parasitas genéticos, estas células destroem o seu próprio ADN

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Numa experiência em laboratório, as células de um embrião de verme eliminaram um terço do seu genoma, numa tática que pode servir para combater parasitas genéticos.

Foi quando estudavam as práticas de reprodução sexual de vermes microscópicos que os cientistas verificaram que o embrião do verme Mesorhabditis belari estava a dividir-se como deveria, ainda que, no interior de algumas células, apresenta-se uma inexplicável pulverização de fragmentos de ADN, que flutuavam onde não pertenciam.

“Havia ADN por todo o lado, dentro e fora dos núcleos – grandes pedaços de ADN”, disse Marie Delattre, bióloga celular da École Normale Supérieure e investigadora responsável pela mais recente descoberta. “Pensei que era um embrião morto.”

Nesse momento, a cientistas percebeu que o embrião não estava morto, mas a fazer algo que normalmente só as células mortas fazem: destruir o seu genoma. “Comecei a tentar descobrir quando é que estes fragmentos aparecem, em que fase e qual o seu aspeto. Foi assim que percebi que isto não era acidental. Todos os embriões fizeram isto”, explicou.

O que Delattre encontrou, e que acabou por descrever num artigo científico publicado recentemente na Current Biology, foi um exemplo de eliminação programada do ADN (PDE), um fenómeno estranho em que os organismos parecem eliminar propositadamente partes do seu genoma, contrariando a ideia de que o genoma é um recurso vital que deve ser transmitido fielmente à geração seguinte.

Até ao momento, os investigadores só identificaram o fenómeno PDE em cerca de 100 espécies, mas pode ser tão difícil de detetar que ninguém sabe até que ponto é realmente comum.

Além de confirmar a existência de outro caso de PDE, este novo artigo também sugere uma explicação para o mesmo. O fenómeno aponta para uma luta de longa data entre as células e as sequências de ADN que não têm utilidade para o seu proprietário. Dado que as células têm de proteger os seus genomas para se manterem funcionais e produtivas, algumas espécies, como M. belari, podem simplesmente eliminar estas partes de ADN usando a PDE.

Em laboratório…

Os investigadores analisaram o ADN de um verme adulto, comparando os gnomas das células da linha germinativa de M. belari – as células reprodutivas especializadas, como o esperma e os óvulos – com os genomas das células somáticas (não reprodutivas) do verme.

Aos genomas somáticos faltavam longas cadeias de sequências presentes nos genomas da linha germinativa. Entre o crescimento do embrião, de sete para 32 células, desapareceram pedaços enormes de ADN.

Os cientistas observaram então os embriões a desenvolverem-se sob um microscópio e notaram que, à medida que as células cresciam e replicavam os seus genomas, partiam 20 cromossomas em fragmentos e depois voltavam a juntá-los em 40 cromossomas em miniatura. A maior parte dos fragmentos voltaram a juntar-se neste novo e mais pequeno genoma, mas uma fração substancial ficava de fora.

No total, o verme “apagou” um terço do seu genoma. As sequências eliminadas não foram selecionadas ao acaso: eram maioritariamente partes de ADN altamente repetitivas que não codificavam genes.

Segundo a Quanta Magazine, os genomas das células eucarióticas são constituídos por sequências semelhantes, sendo que algumas desempenham funções necessárias. O ADN satélite, por exemplo, forma estruturas como a heterocromatina, enquanto outras secções repetitivas regulam a expressão genética. No entanto, algumas sequências repetitivas não contribuem para a sobrevivência do seu hospedeiro – e podem mesmo interferir negativamente.

É o caso dos transposões, sequências de ADN auto-replicantes que roubam a maquinaria da célula para se copiarem aos milhares. Além de estarmos perante um verdadeiro roubo molecular, isto corresponde a um desperdício de tempo e energia que a célula tem de gastar para suprimir estas sequências.

As células costumam travar os transposões com marcas epigenéticas que os silenciam, ou interceptando e destruindo o seu ARN. Em algumas espécies, como a M. belari, os transposões são eliminados através da PDE.

ZAP //

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