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Um “ataque ignóbil” e a ONU “no pântano”. Esquerda e direita às turras sobre a polémica de Guterres

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Eric Bridiers, US Mission Photo / Wikimedia

António Guterres, Secretário-Geral da ONU

A esquerda mostra-se ao lado de Guterres e condena a interpretação de Israel das palavras do secretário-geral da ONU. À direita, os partidos condenam as palavras do antigo primeiro-ministro.

António Costa enviou uma mensagem de solidariedade ao secretário-geral das Nações Unidas, considerando que, perante a “tragédia humanitária”, tem sido “exemplar” na afirmação humanista do Direito Internacional, disse quarta-feira à agência Lusa fonte oficial do executivo.

Esta mensagem de António Costa surge na sequência do discurso que António Guterres proferiu na terça-feira, numa reunião do Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas

Numa intervenção em inglês, António Guterres considerou que “é importante também reconhecer que os ataques do Hamas não aconteceram num vácuo”, acrescentando que “o povo palestiniano tem sido submetido a 56 anos de ocupação sufocante”.

António Guterres defendeu que “as queixas do povo palestiniano não podem justificar os ataques terríveis do Hamas”, assim como “esses ataques terríveis não podem justificar a punição coletiva do povo palestiniano”.

No início da sua intervenção, o secretário-geral da ONU referiu que condena “inequivocamente os atos de terror horríveis e sem precedentes do Hamas em Israel” e disse que “nada pode justificar a morte, os ferimentos e o rapto deliberados de civis — ou o lançamento de foguetes contra alvos civis”.

Na mesma reunião, o ministro dos Negócios Estrangeiros de Israel, Eli Cohen, acusou António Guterres de estar desligado da realidade e de mostrar compreensão pelo ataque do Hamas de 7 de outubro com um “discurso chocante”.

Na rede social X, ex-Twitter, o embaixador israelita na ONU, Gilled Erdan, pediu a demissão imediata de António Guterres das funções de secretário-geral desta organização.

Esta quarta-feira, Gilled Erdan anunciou a decisão de Israel de não conceder vistos a representantes da ONU, numa entrevista à Rádio do Exército israelita.

Em declarações à agência Lusa, o ministro dos Negócios Estrangeiros, João Gomes Cravinho, também se manifestou solidário com António Guterres, afirmando que Portugal “compreende e acompanha” a posição do secretário-geral das Nações Unidas sobre o conflito entre Israel e o Hamas.

“Compreendemos e acompanhamos inteiramente a posição de António Guterres, que foi inequívoco quando condenou o terrorismo do Hamas, que é absolutamente inaceitável. Foi absolutamente cristalino na análise que fez”, declarou João Gomes Cravinho, que lamentou a polémica entre o Governo de Israel e o secretário-geral da ONU.

O Presidente da República também já se mostrou solidário com Guterres. Numa nota publicada no sítio oficial da Presidência da República, o chefe de Estado afirma que “sempre interpretou as sucessivas declarações do secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, proferidas desde o injustificável ataque do Hamas em Israel, como sendo conformes à salvaguarda dos valores e princípios decorrentes da Carta das Nações Unidas”.

Marcelo Rebelo de Sousa “reitera esse seu entendimento quanto às declarações de ontem [terça-feira] e de hoje [quarta-feira]” do secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU).

Esquerda ao lado de Guterres

Nas reações dos partidos, Francisco César, vice-presidente do Grupo Parlamentar do PS, manifestou “toda a solidariedade e apoio às declarações do secretário-geral das Nações Unidas”. “O que se tem passado nas últimas horas é fruto de uma má interpretação das palavras”, declara.

“No passado dia 7, o Hamas perpetrou um atentado terrorista que não tem qualquer tipo de justificação e que teve um enorme impacto na população de Israel. A libertação dos reféns que o Hamas tem em seu poder é fundamental, deve ser imediata e sem qualquer tipo de condições”, frisou o dirigente da bancada socialista.

Francisco César observou que Israel “tem o direito e o dever de se defender”, mas apontou que a autodefesa “tem regras que estão presentes no Direito Internacional Humanitário e que devem ser cumpridas”.

“Quando essas regras não são cumpridas faz com que aquele que atacou, violando os direitos humanos, não tenha a resposta adequada de uma democracia ocidental como a do Estado de Israel, que tem o dever e a obrigação de fazer jus ao exercício da democracia que o seu próprio Estado pratica”, disse.

Do lado do Bloco de Esquerda, Pedro Filipe Soares criticou “o ataque ignóbil que está a ser feito contra António Guterres” e manifestou “toda a solidariedade” para com o secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU).

“Acreditamos que, neste momento, é essencial, do ponto de vista da política externa, o Estado português declarar apoio à Carta das Nações Unidas, à ONU, a António Guterres”, referiu.

O BE apresentou um projeto de voto de solidariedade para com o secretário-geral da ONU em que se lê que, “apesar de não reclamar nada mais do que o fim da violência sobre civis, apesar de não exigir nada mais do que a cessação de crimes de guerra, António Guterres tem sido violentamente atacado”.

O partido propõe que o parlamento se solidarize com António Guterres, “repudiando os ataques de que tem sido alvo por parte de Israel”, e sublinhe a “necessidade de um cessar-fogo na região, de acesso à ajuda humanitária e de condenação dos crimes de guerra”.

A representar os comunistas, a líder parlamentar Paula Santos considera que as declarações de Guterres vão no sentido da paz e “respeito pelo direito da Palestina”.

“Há décadas de incumprimento das resoluções das Nações Unidas, e é neste contexto da necessidade de cumprimento dessas resoluções, da solução dos dois Estados e da criação do Estado da Palestina, com as fronteiras de 1967 e com a capital em Jerusalém Oriental, que nós vemos estas declarações do secretário-geral da ONU”, referiu.

Críticas à direita

O vice-presidente do PSD Paulo Rangel defendeu esta quarta-feira que a clarificação feita por António Guterres.

“A clarificação que fez o secretário-geral das Nações Unidas, o nosso compatriota António Guterres, é uma clarificação importante. De facto, criou-se uma controvérsia em toda a imprensa internacional, porque as declarações de ontem [segunda-feira], enfim, pelo menos não foram felizes, especialmente uma frase”, sustentou Paulo Rangel, em declarações aos jornalistas no Parlamento Europeu (PE), em Bruxelas.

O vice-presidente social-democrata disse ter “a certeza absoluta” de que António Guterres “não queria, em caso nenhum, justificar o terrorismo”.

“Mas é verdade que há uma frase menos feliz, que implicava uma clarificação. Um secretário-geral das Nações Unidas, para desempenhar bem a sua função, tem, muitas vezes, de manter essa neutralidade”, completou.

A Iniciativa Liberal teve palavras mais duras. Numa publicação nas redes sociais, o partido condenou as declarações “politicamente insensatas e diplomaticamente catastróficas” do secretário-geral da ONU

“A Iniciativa Liberal condena as declarações de António Guterres. Mostraram desrespeito pelas famílias das vítimas de um hediondo ato de terror e barbárie humana,”, pode ler-se.

Na opinião dos liberais, “não há contexto que justifique as atrocidades cometidas pelo Hamas no passado dia 7 de outubro, nem é aceitável a normalização que decorre daquelas declarações para comportamentos verdadeiramente abomináveis“.

“Guterres afundou as Nações Unidas no pântano, retirando-lhe qualquer capacidade de mediar o conflito e de interceder em favor de todas as vítimas inocentes. Absolutamente lamentável”, repudia.

André Ventura vai mais longe e defende a demissão de Guterres. O líder do Chega quer que o parlamento “tome uma posição clara de condenação das palavras” de António Guterres quanto ao conflito entre Israel e o Hamas e defendeu que o antigo primeiro-ministro “não tem nenhumas condições políticas para ser secretário-geral da ONU”, pedindo a sua demissão.

O deputado acusou Guterres de ter sido “parcial e parecer abraçar a causa do Hamas e do mundo palestiniano”, e considerou que, com as suas declarações, o secretário-geral da ONU “legitimou o terrorismo“.

“Temos um Estado que está sob agressão, sob ataque, e entendemos que Portugal não pode estar do lado dos agressores, deve estar do lado daqueles que estão a ser atacados”, defendeu.

ZAP // Lusa

12 Comments

  1. É triste esta divisão a respeito de Guterres. Não sendo eu um admirador dele, acho que ele não faltou à verdade. Embora o Hamas seja um grupo terrorista, os israelitas também não são uns anjos.

  2. Não era só a esquerda que devia estar ao lado de Guterres, mas toda a gente que tenha dois dedos de testa e veja as coisas com clareza. O que se está a passar em Gaza é uma vergonha!!!!
    E mais grave ainda ou se fica do lado do mais forte ou se sofrem represálias.
    Realmente alguém se devia demitir e já, mas não é o Guterres.

  3. Não era só a esquerda que devia estar ao lado de Guterres, mas toda a gente que tenha dois dedos de testa e veja as coisas com clareza. O que se está a passar em Gaza é uma vergonha!!!!
    E mais grave ainda ou se fica do lado do mais forte ou se sofrem represálias.
    Realmente alguém se devia demitir e já, mas não é o Guterres…

  4. O Hamas não é causa mas sim consequência de décadas de crimes, de abuso, de violações aberrantes dos direitos humanos dos palestinianos! É devido aos atos criminosos dos israelitas que surge um partido como o Hamas, é pela inércia, indiferença, conivência e até cumplicidade (EUA e Inglaterra) dos países ocidentais e da ONU que uma boa parte da população palestiniana o apoia. Sem qualquer oposição os israelitas cometeram durante dezenas de anos, e continuam a cometer, atrocidades alimentando o ódio nos palestinianos que, sem qualquer apoio nem defesa, se viram sem esperança. Isso não justifica os crimes hediondos do 7 de Outubro mas dá um vislumbre do “porquê”. Aqueles que assistiram no camarote ao sofrimento dos palestinianos sem mexer uma unha para os ajudar, aqueles que olharam p’ro lado p’ra fingir não ver, e aqueles que foram cúmplices das atrocidades e crimes cometidos pelos israelitas (EUA financiarem e financiam israel com biliões de $ e armamento) são agora os primeiros a apontar o dedo ao hamas e aos palestinianos! Hipócritas! Se o Hamas é um grupo terrorista os políticos e comandantes militares israelitas são 10 vezes piores. Um povo que sofre o holocausto e imediatamente a seguir mata centenas de pessoas e provoca um movimento de exílio de centenas de milhares de palestinianos (al-nakba) ! São ainda piores assassinos que os que os tentaram dizimar na Alemanha. É só a ponta do icebergue acerca do que estes criminosos, xenófobos e racistas fizeram ao longo de mais de 7 décadas. O hamas só existe porque um mal pior existe e persiste à muito mais tempo, impune.

  5. O Hamas não é causa mas sim consequência de décadas de crimes, de abuso, de violações aberrantes dos direitos humanos dos palestinianos! É devido aos atos criminosos dos israelitas que surge um partido como o Hamas, é pela inércia, indiferença, conivência e até cumplicidade (EUA e Inglaterra) dos países ocidentais e da ONU que uma boa parte da população palestiniana o apoia. Sem qualquer oposição os israelitas cometeram durante dezenas de anos, e continuam a cometer, atrocidades alimentando o ódio nos palestinianos que, sem qualquer apoio nem defesa, se viram sem esperança. Isso não justifica os crimes hediondos do 7 de Outubro mas dá um vislumbre do “porquê”. Aqueles que assistiram no camarote ao sofrimento dos palestinianos sem mexer uma unha para os ajudar, aqueles que olharam p’ro lado p’ra fingir não ver, e aqueles que foram cúmplices das atrocidades e crimes cometidos pelos israelitas (EUA financiarem e financiam israel com biliões de $ e armamento) são agora os primeiros a apontar o dedo ao hamas e aos palestinianos! Hipócritas! Se o Hamas é um grupo terrorista os políticos e comandantes militares israelitas são 10 vezes piores. Um povo que sofre o holocausto e imediatamente a seguir mata centenas de pessoas e provoca um movimento de exílio de centenas de milhares de palestinianos (al-nakba) ! São ainda piores assassinos que os que os tentaram dizimar na Alemanha. É só a ponta do icebergue acerca do que estes criminosos, xenófobos e racistas fizeram ao longo de mais de 7 décadas. O hamas só existe porque um mal pior existe e persiste à muito mais tempo, impune.

  6. Não sei que dúvidas podem ser levantadas quanto ao teor explicitamente formulado no discurso proferido por António Guterres, só algumas mentes descricionáriamente doentes e intelectualmente desonestas, podem apontar seja o que for ao conteúdo da intervenção em análise, ressalvou o que tinha a ressalvar e com uma enorme dose de coragem, disse o que tinha de ser dito.
    É muito triste vermos políticos portugueses, no exercício do seu direito bem entendido, a proferirem palavras tão insanas para com alguém que, brilhantemente, tem tentado mediar um conflito que a todos nos atormenta, onde existem razões e verdades de ambos os lados.
    Até aqui um defensor da causa judaica, pelos atropelos e discursos dos últimos dias, temo passar a considerar a causa palestiniana segundo uma nova perspectiva.

  7. É lamentável que haja políticos que representando um “nicho de mercado” para comprar mis corda para o papagaio, se revelem tal e qual. São uma autêntica bosta.

  8. Vitimas Civis , que sejam Israelitas ou Palestinianos , sem serem combatentes , são de deplorar sem outras considerações ! ….. Mas não é de admirar a lamentável intervenção de Eli Cohen , pouco ponderada !

  9. Oh Isabel, quem não tem dois dedos de testa é você, que tem que ir aprender história. Só quem desconhece os factos é que pode estar contra Israel. E já agora, você não sabe que os terroristas se escondem entre civis, escondem armas em hospitais, escolas, etc.? O Hamas QUER que morram muitos civis, quantos mais melhor. Porque sabem que a opinião pública se vai voltar contra Israel. E já agora, ninguém se interroga como é que Israel consegue cortar a eletricidade e água a Gaza? É simples, Israel é o único país a fornecer eletricidade e água a Gaza. Tantos países Árabes ali à volta, mas se fosse por eles toda a população de Gaza estaria morta, nem refugiados aceitam. E outra coisa, entre Israel e Palestina, Israel foi a única nação a aceitar a solução de 2 Estados proposta pela ONU em 1947. A Palestina sempre recusou, sempre, e desde 1948 que não faz outra coisa a ser tentar invadir Israel. Desde 2005 que Israel retirou de Gaza, todos os colonatos retirados, e para quê? Está aqui a prova que nunca deveriam ter saído.

  10. E como os terroristas se escondem, no meio de civis. mata-se tudo a eito? Mas quem é que pode legitimar este autêntico genocidio? Israel vinga os seus e aos palestinianos quem lhes acode? Sem comida, sem água sem eletricidade´, sem medicamentos, sem um abrigo o que ‘e que lhes pode acontecer? O exterminio como é óbvio. E o que a história diz é que os antepassados deles tiveram que deixar as suas casas para os israelitas se instalarem!!!! Deixaram-lhes um território paupérrimo que nada produz, o que obrigava a que entrassem 400 camiões diários de ajuda humanitária para sobreviverem. Agora entram meia dúzia deles quando entram!!

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