Assassinos em série diminuíram desde 1980. Mas o fascínio por eles continua a aumentar

Universal Pictures

Anthony Perkins em “Psycho” (1960), de Alfred Hitchcock

O número de assassinos em série diminuiu desde os anos 1980, invertendo a tendência das três décadas anteriores, nas quais nomes como Ted Bundy, John Wayne Gacy e o Assassínio do Zodíaco encheram as capas dos jornais.

Ted Bundy e o Gary Ridgway (conhecido como o Assassino do Rio Verde) mataram dezenas de mulheres. Enquanto as vítimas de John Wayne Gacy (o Palhaço Assassino) eram jovens do sexo masculino, o Assassino do Zodíaco não se prendia ao género no momento em que escolhia as presas.

De acordo com o Discover, que cita dados compilados pelo investigador Mike Aamodt, da Universidade de Radford, nos anos 80 foram registados quase 770 assassinos em série nos Estados Unidos (EUA), baixando para 670 nos anos 90. Nos anos 2000 caiu para 400 e, a partir do final de 2016, foram pouco mais 100.

O termo “assassino em série” foi criado em 1980, agente do FBI Robert Ressler. Os homicídios em série aumentaram durante décadas, ao mesmo que tempo em que aumentava a criminalidade no geral. Da mesma forma, a queda de homicídios em série também acompanha uma diminuição no número de crimes.

Segundo os mesmos dados, houve 189 vítimas de homicídios em série nos EUA em 1987, em comparação com 30 em 2015. Diferentes teorias tentam explicar essa mudança de paradigma.

Uma das teorias aponta para os avanços na investigação policial e para a melhoria da recolha de dados, assim como o desenvolvimento da ciência forense e o advento de abordagens genéticas.

Recentemente, através das técnicas modernas, as autoridades recorreram a amostras de ADN de familiares distantes para identificar Joseph DeAngelo como o Assassino do Estado Dourado, que entre 1976 e 1986 matou 12 mulheres.

“Devido ao ADN e a uma melhor investigação forense, e porque a polícia está agora ciente do fenómeno, os assassinos em série são mais suscetíveis de serem detetados do que alguma vez foram”, disse Thomas Hargrove, fundador do Murder Accountability Project.

As sentenças mais longas e uma redução da liberdade condicional ao longo das décadas são outras das circunstâncias que podem ter ajudado na diminuição dos casos de assassinos em série.

 

Outras das hipóteses é o facto de os aspirantes a assassinos terem sucumbido à ausência de alvos fáceis. James Alan Fox, professor de criminologia na Universidade de Northeastern, indicou que atualmente as pessoas são menos vulneráveis, limitando o número de potenciais vítimas.

“As pessoas já não andam à boleia. Têm meios para chegar a uma situação de emergência, utilizando telemóveis. Há câmaras por todo o lado”, apontou.

Da mesma forma, a supervisão dos pais parece ter aumentado. Aamodt recordou que na infância caminhava ou andava de bicicleta sem supervisão por toda a cidade. “Não deixaria os seus filhos fazer isso hoje”, indicou. Como resultado, “muitas das vítimas que eram encontradas nos anos 70 ou 80 são quase impossíveis de encontrar agora”.

Hargrove afirmou ainda que, atualmente, a sociedade identifica mais facilmente pessoas com distúrbios ou desvios, especialmente nos jovens. Muitas vezes, os primeiros catalisadores para assassinatos em série – como disfunção familiar ou abuso sexual – podem ser remediados por através de acompanhamento psicológico.

A pornografia, indicou, pode minimizar os impulsos que muitas vezes precedem os homicídios sexualizados. “É possível que o esgoto que é grande parte da Internet esteja a proporcionar uma saída não violenta para essas pessoas”, disse.

Uma outra teoria refere que os assassinos em série não desapareceram, mas transformam-se em atiradores em massa, cujos casos dispararam nas últimas três décadas. Contudo, a maioria dos especialistas concorda que os dois perfis não se sobrepõem o suficiente. “A motivação para um atirador em massa versus um assassino em série tende a ser diferente”, notou Aamodt.

Estimativas do FBI mostram que o homicídio em série é raro, compreendendo menos de 1% de todos os casos. Com a taxa anual de homicídios a rondar os 15 mil nos EUA, isso equivale a menos de 150 homicídios em série por ano, perpetrados por 25 a 50 pessoas. Os dados de Aamodt colocam a taxa abaixo dessa.

O artigo apontou ainda que só são feitas detenções em 60% dos casos de assassinato – os assassinos têm 40% de hipóteses de não serem apanhados. A questão é, quantos desses casos não resolvidos são obra de um assassino em série?

Para responder a essa questão, Hargrove criou em 2010 um algoritmo para detetar assassinos em série. Essencialmente, o código informático procura semelhanças entre homicídios que os detetives podem ter ignorado.

“Sabemos que os homicídios em série são mais comuns do que são oficialmente reconhecidos”, indicou. Os autores de crimes em série, continuou, podem ser responsáveis por uma parte dos casos não resolvidos, porque esses casos “tendem a não ser resolvidos. Eles são bons a matar”.

Nas seus cálculos, que reúnem dados desde 1976, Hargrove estimou que cerca de 2.000 assassinos em série podem permanecer em liberdade.

Mas, intencionalmente ou não, muitos assassinos variam as táticas, visando pessoas de diferentes raças e géneros, em diferentes locais. Sem forma de estabelecer comparações entre estes casos aparentemente sem ligação, tanto os computadores como os humanos têm dificuldades em associá-los.

No entanto, e apesar da queda no número de assassinos em série, o fascínio por casos desses parece estar a regressar. No filme de 2019 “Extremely Wicked, Shockingly Evil and Vile”, o ator Zac Efron interpreta o Ted Bundy.

Na série “Mindhunter”, que estreou em 2017 e explora a origem do perfil criminal no FBI, uma das duas personagens principais baseia-se no agente Ressler.

Outro exemplo é a minisérie “Monster: The Jeffrey Dahmer Story”, onde o assassino em série é retratado. Ao contrário de outras produções,  foca-se na perspetiva das suas vítimas e vizinha, Glenda Cleveland, que por inúmeras vezes tentou alertar as autoridades, mas nunca foi levada a sério.

Mas como lembrou Fox, estes filmes e séries “concentram-se em casos de outrora”. Ou seja, continua-se a falar de assassinos que eram ativos há décadas – poucos ficaram conhecidos nos últimos anos.

Porém, como sublinhou Hargrove, os assassinos em série ainda estão connosco, mesmo que sejam menos comuns. E, salvo grandes avanços na nossa capacidade de os apanharmos, não podemos compreender totalmente a sua magnitude.

Taísa Pagno //

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