O peculiar texto que descreve a morte do faraó continua a intrigar historiadores: terá sido escrito durante a vida do monarca, ou será uma recordação póstuma sobre desconfiança e cautela?
O Ensinamento do Rei Amenemhat I a Seu Filho Senusret, mais conhecido por “Instruções de Amenemhat”, é um controverso texto egípcio com ensinamentos morais e conselhos.
O poema, escrito no período do Império Médio egípcio (entre 2050 a.C. e 1710 a.C.), divide arqueólogos: enquanto uns acreditam que a sua origem está no próprio rei Amenemhat I, que terá encomendado o texto para justificar uma corregência com o filho, há também quem acredite que é encomenda do próprio filho, Senusret I, para legitimar a sua sucessão ao pai. Uma tradição posterior atribui-o ao escriba Khety.
“Será o rei da terra. Governará as margens do Nilo. Multiplicarás as boas ações”, são algumas das previsões feitas no texto, citado pelo LBV, sobre Senusret I.
A edição conhecida mais antiga do documento é o Papiro de Millingen, que data da XVIII Dinastia, mas que desapareceu em meados do século XIX — conservou-se, no entanto, uma cópia manuscrita. Existem ainda outros fragmentos, como o Papiro de Ramesside Sallier II e várias ostracas (fragmentos de cerâmica).
E o documento descreve mesmo a própria morte de Amenemhat, alvo de uma misteriosa conspiração.
“O ataque teve lugar quando você não estava lá. Eu não tinha tornado público que você seria o meu herdeiro, não tinha partilhado o trono consigo”, escreve o pai, diretamente para o filho.
De facto, o faraó terá sido morto durante o sono, e o complot do assassínio é descrito no próprio poema: nele, Amenemhat diz ter sido alvo de uma conspiração dentro do harém real, um ato inédito na história do Antigo Egito.
“Era depois do jantar, a noite tinha caído. Concedi-me um momento de repouso no meu leito, pois estava cansado. Quando o meu coração começou a render-se ao sono, as armas destinadas a proteger-me ergueram-se contra mim”, lê-se no documento, que alarma o filho para que tenha cuidado com os excessos de confiança.
Há historiadores que acreditam, no entanto, que esta descrição é feita pelo pai ainda em vida, uma vez que o faraó terá sofrido uma primeira tentativa de assassinato que não levou à sua morte. Se assim fosse, Amenemhat podia ter escrito o documento como um aviso para o filho.
O poema teve uma grande influência em toda a história do Antigo Egito, e foi usado por sucessivos monarcas para consolidar a sua própria autoridade. Mais de 1500 anos depois de ter sido escrito, continua a intrigar historiadores e a ser lido e interpretado.
Os seus ensinamentos sobre confiança e prudência continuam, ainda hoje, a er um importante legado político e literário na história do Egito.