“A última geração”. Jovens chineses juram não ter filhos

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Os jovens chineses estão a colocar de lado a opção de ter filhos, com muitos a jurar que não os terão. Este pode ser um dos fatores responsáveis pelo início de um declínio populacional, que se prevê que seja longo.

“Custa demasiado proporcionar às crianças uma vida decente. As coisas que ensinam na escola são propaganda, por isso gostaria de as enviar para uma escola internacional ou para o estrangeiro. Mas não tenho dinheiro para isso”, disse ao Guardian KonhKong, uma investigadora de 26 anos, que jura que não terá filhos.

Esta semana, o Governo chinês anunciou que o país entrou numa “era de crescimento populacional negativo”, após os números mostrarem uma queda histórica, algo que acontece pela primeira desde a grande fome, que decorreu entre 1958 e 1961.

Segundo o Gabinete Nacional de Estatísticas chinês, em 2022 a população perdeu 850.000 pessoas, passando a ter 1.41 mil milhões. Ao contrário do período da fome, cujos efeitos foram temporários, os estudiosos dizem que esta perda marca o início de um longo período de declínio populacional.

A política do filho único, que o Governo aboliu em 2015, teve impacto neste declínio. Desde os anos 90, a taxa de natalidade no país tem diminuído. Em 2020 era de 1,30 filhos por cada mulher, passando para 1,15 em 2021.

A partir de 2015, receando os efeitos negativos do envelhecimento da população, o Governo chinês permitiu que os casais pudessem ter dois filhos, passando para três em 2021.

Os custos crescentes associados à educação das crianças e as dificuldades relacionadas com o seu bem-estar foram durante anos apontadas como as razões por trás da baixa natalidade. A pandemia e os seus riscos agravaram o cenário.

Nos últimos anos, o Governo chinês começou a oferecer incentivos à natalidade, tais como isenções fiscais, subsídios e licenças parentais mais longas, ao mesmo tempo que desencoraja o aborto. Mas essas medidas não foram suficientes.

Um inquérito realizado em 2022 a mais de 20.000 pessoas, na sua maioria mulheres que vivem em zonas urbanas e que têm entre 18 e 25 anos, revelou que dois terços têm um baixo desejo de ter filhos.

No ano passado, um vídeo tornou-se viral na china, no qual aparecia um jovem que se recusou a ser levado para um campo de quarentena a ser avisado pela polícia que a sua punição afetaria a sua família durante três gerações. O jovem respondeu: “nós somos a última geração, obrigado”.

Essa frase deu origem a ‘hashtag’ “#thelastgeneration”, que gerou milhões de comentários antes de ser censurada. Muitos jovens afirmaram que as rígidas medidas de confinamento no país levaram a que desistissem de ter filhos.

“Isso ressoou profundamente em mim… Comprei uma t-shirt na qual estava escrita ‘Somos a última geração’. Não posso trazer uma criança a este mundo para o deixar sofrer”, referiu KongKong ao mesmo jornal.

Já Eunice, uma professora de inglês de 34 anos, indicou: “ouvi dizer que alguns hospitais se recusaram a tratar crianças que não tiveram resultados negativos nos testes… a pandemia provocou um forte sentimento de incerteza. Ter filhos não é algo que esteja a considerar agora”.

Wang Feng, professor de sociologia na Universidade da Califórnia, afirmou que o declínio da população chinesa tinha começado quase uma década antes do que as Nações Unidas tinham previsto. Em 2019, a ONU projetou que a população da China atingiria o seu pico em 2031-32.

De acordo com o especialista, o declínio populacional pode ser atribuído à política de um filho único, que começou há três décadas e meia, mas a pandemia agravou a situação.

Wu Qiang, analista político, disse que o crescente descontentamento dos jovens com o regime autoritário e a relutância em ter filhos demonstra o “conflito irreconciliável” com o objetivo de crescimento económico do país. Estas questões, juntamente com os protestos dos trabalhadores e a escassez de mão-de-obra, estão a conduzir à “falência do modelo chinês”, que tinha dependido de uma mão-de-obra barata e vasta.

Chien-Chung Wu, professor da Universidade de Tecnologia Marítima de Taipé, referiu que o declínio da população teria um enorme impacto na economia. A diminuição da força de trabalho e do mercado de consumo faria com que o país perdesse a sua vantagem e levaria as empresas estrangeiras para outros países asiáticos.

ZAP //

1 Comment

  1. Provavelmente a China terá uma nova revolução um dia, em que se tornara uma sociedade mais Democratica pela pressão Popular

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