/

Perder peso: as cinco coisas que uma perita em nutrição gostaria que todos soubéssemos

Não se trata de força de vontade, e vai contra a nossa biologia. Perder peso é apenas uma peça do puzzle – e a saúde envolve muito mais.

Depois de quase 15 anos a trabalhar e investigar em saúde e nutrição, a especialista em nutrição Rachel Woods, fisiologista da University of Lincoln, no Reino Unido, realça que o excesso de peso é tratado de forma diferente de quase todos os outros problemas de saúde.

As pessoas são rotineiramente responsabilizadas pelo seu peso corporal, apesar de existirem evidências robustas de que o peso é moldado por uma combinação complexa de genética, biologia, ambiente e fatores socioeconómicos, explica Woods

Mas o acesso limitado a alimentos saudáveis e acessíveis, a falta de espaços seguros para fazer exercício, longas horas de trabalho e stress crónico — todos fatores mais comuns em áreas desfavorecidas — podem tornar a manutenção de um peso saudável significativamente mais difícil.

Num artigo no The Conversation, Woods explica as cinco coisas que todos deveríamos compreender sobre a perda de peso.

1. Vai contra a nossa biologia

A obesidade é reconhecida como uma prioridade de saúde nacional na maior parte dos países ocidentais. No entanto, as taxas de obesidade não diminuíram. Isto sugere que as abordagens atuais, que tendem a focar-se na responsabilidade pessoal, não estão a funcionar.

Mesmo quando os métodos de perda de peso são bem-sucedidos, os resultados muitas vezes não são persistentes. Estudos recentes mostram que a maioria das pessoas que perde peso acaba por recuperá-lo, e as hipóteses de alguém com obesidade atingir e manter um peso “normal” são muito baixas.

Isto deve-se em parte ao facto de os nossos corpos resistirem à perda de peso – uma resposta enraizada no nosso passado evolutivo.

Este processo chama-se adaptação metabólica: quando reduzimos a ingestão de energia e perdemos peso, o metabolismo desacelera e os hormonas da fome aumentam, incentivando-nos a comer mais e a recuperar o peso perdido.

Esta resposta biológica fazia sentido no nosso passado, quando éramos caçadores-recolectores, e períodos alternância entre abundância e escassez eram comuns.

Mas hoje, num mundo em que alimentos ultra-processados e com alta densidade calórica são baratos e acessíveis, estas mesmas características de sobrevivência tornam fácil ganhar peso – e difícil perdê-lo.

Portanto, se já teve dificuldades em perder peso ou mantê-lo, não é uma falha pessoal – é uma resposta fisiológica previsível.

2. Não se trata de força de vontade

Algumas pessoas parecem manter um peso estável com relativa facilidade, enquanto outras lutam. A diferença não se resume à força de vontade.

O peso corporal é influenciado por muitos fatores. A genética desempenha um papel importante – por exemplo, afetando a rapidez com que queimamos calorias, a sensação de fome ou a saciedade após uma refeição.

Algumas pessoas têm predisposição genética para sentir mais fome ou desejar alimentos altamente energéticos, tornando a perda de peso ainda mais desafiante.

Os fatores ambientais e sociais também são importantes. Ter tempo, dinheiro ou apoio para preparar refeições saudáveis, ser ativo e priorizar o sono faz uma diferença real – e nem todos têm esses recursos.

Quando ignoramos estas complexidades e assumimos que o peso é puramente uma questão de autocontrolo, contribuímos para o estigma.

Este estigma pode fazer com que as pessoas se sintam julgadas, envergonhadas ou excluídas, o que, ironicamente, aumenta o stress, reduz a autoestima e dificulta ainda mais a adoção de hábitos saudáveis.

3. As calorias não são tudo

Contar calorias é muitas vezes a estratégia padrão para perder peso. E embora criar um défice calórico seja essencial para perder peso em teoria, na prática é muito mais complicado.

Para começar, as informações calóricas nos alimentos são apenas estimativas, e as nossas necessidades energéticas variam de dia para dia. Até a quantidade de energia que absorvemos dos alimentos pode diferir consoante o modo de cozedura, a digestão e a composição da nossa microbiota intestinal.

Existe também a ideia persistente de que “uma caloria é apenas uma caloria” – mas o nosso corpo não trata todas as calorias da mesma forma.

Um biscoito e um ovo cozido podem ter calorias semelhantes, mas afetam a fome, a digestão e os níveis de energia de formas muito diferentes. O biscoito pode causar um pico rápido de açúcar no sangue seguido de queda, enquanto o ovo proporciona saciedade duradoura e valor nutricional.

Estas ideias erradas alimentaram o crescimento de dietas da moda – como beber apenas shakes ou eliminar grupos alimentares inteiros. Embora possam levar a uma perda de peso a curto prazo ao criar um défice calórico, raramente são sustentáveis e muitas vezes carecem de nutrientes essenciais.

Uma abordagem mais realista e equilibrada é focar-se em mudanças a longo prazo: consumir mais alimentos integrais, reduzir refeições de takeaway, limitar o álcool e criar hábitos que promovam o bem-estar geral.

4. Exercício é ótimo para a saúde – mas nem sempre para perder peso

Muitas pessoas assumem que quanto mais exercício fizerem, mais peso vão perder. Mas a ciência revela uma realidade mais complexa.

O nosso corpo é muito eficiente a conservar energia. Após um treino intenso, podemos inconscientemente mover-nos menos durante o resto do dia ou sentir mais fome e comer mais – contrariando as calorias queimadas.

Na realidade, a investigação mostra que o gasto energético diário total não aumenta indefinidamente com mais exercício. Em vez disso, o corpo ajusta-se tornando-se mais eficiente e reduzindo o gasto energético noutras áreas, tornando a perda de peso apenas através do exercício mais difícil do que muitos esperam.

Ainda assim, o exercício oferece uma enorme variedade de benefícios: melhora a saúde cardiovascular, o bem-estar mental, mantém a massa muscular, otimiza a função metabólica, fortalece os ossos e reduz o risco de doenças crónicas.

Mesmo que o número na balança não mude, o exercício continua a ser uma das ferramentas mais poderosas para melhorar a saúde e a qualidade de vida.

5. Melhorias na saúde não exigem sempre perda de peso

Não é necessário perder peso para ficar mais saudável.

Embora a perda de peso intencional possa reduzir o risco de doenças cardíacas e alguns tipos de cancro, diversos estudos mostram também que melhorar a alimentação e  ser mais ativo pode melhorar significativamente vários indicadores de saúde, como colesterol, pressão arterial, glicemia e sensibilidade à insulina, mesmo que o peso permaneça o mesmo.

Portanto, se não está a ver grandes mudanças na balança, pode ser mais útil mudar o foco. Em vez de perseguir um número, concentre-se no comportamento: nutrir o corpo, fazer exercício regularmente de forma que lhe dê prazer, dormir bem e gerir o stress.

O peso é apenas uma peça do puzzle – e a saúde envolve muito mais.

ZAP //

Deixe o seu comentário

Your email address will not be published.