Acabou o facilitismo e o silêncio nos casos de assédio. Trabalhadores em regime híbrido têm melhores indicadores de saúde mental.
Foram quase 4 mil trabalhadores portugueses que responderam ao inquérito do Laboratório Português dos Ambientes de Trabalho Saudáveis.
O estudo mostrou que há mais relatos de casos de assédio laboral e um agravamento do estado psicológico dos trabalhadores em Portugal.
Mais relatos não quer dizer obrigatoriamente que há mais assédio laboral agora: “De um modo geral, as pessoas conseguem identificar melhor situações de assédio. Há uns anos aceitava-se com mais facilidade um chefe que berrava, destratava, humilhava ou abusava; e o assédio sexual acontecia muito e não era mencionado. Agora há uma noção cada vez maior de que estes comportamentos não são toleráveis”, explica a coordenadora Tânia Gaspar.
A especialista em Psicologia do Trabalho indica no Expresso que, a nível internacional (no inquérito não há essa separação), o mais habitual é haver lideranças tóxicas, que destratam, inferiorizam ou humilham.
E também alguns casos de assédio sexual, nem sempre visíveis de imediato: “Às vezes são coisas óbvias, outras mais subtis, como um chefe estar sempre a mandar mensagens a uma subordinada ou a convidá-la para beber café ou almoçar. Mesmo sem haver toque ou uma verbalização explícita, são situações invasivas e que facilmente deixam a pessoa intimidada”.
As vítimas de assédio laboral, na sua maioria, são mais frágeis psicologicamente e menos capacidade de serem assertivas.
Mas quem foi que nasceu primeiro? “É como o ovo e a galinha — não sabemos até que ponto as pessoas, por serem pressionadas e maltratadas no trabalho, vão ficando com mais sintomas psicológicos e menos autoestima e capacidade de ação, ou se, de alguma forma, já tinham essa fragilidade e isso tornou-as mais vulneráveis, já que os agressores não funcionam assim com toda a gente. Provavelmente é uma conjugação das duas coisas”, acredita Tânia.
No geral, estão a aumentar os casos de esgotamento. Sobem sobretudo os sintomas de ansiedade e irritabilidade, e não os de depressão: “As pessoas sentem-se exaustas e ficam menos tolerantes e mais irritáveis, com maior propensão para comportamentos hostis, o que também pode ajudar a explicar o aumento dos casos de assédio laboral”.
Para isso, contribui o atual contexto global de incerteza: “As pessoas e as organizações estão numa panela de pressão”.
Os trabalhadores em regime híbrido são os que têm melhores indicadores de saúde mental. Quem está em trabalho presencial tem maiores níveis de esgotamento. Os inquiridos dizem que trabalham melhor em casa do que no escritório.
Em relação à idade, quem está mais próximo da reforma apresenta melhores indicadores de saúde mental. Os piores são os seguintes – que têm de 30 até 60 anos. Os mais novos ligam menos ao trabalho, não têm grande sentido de pertença à empresa.
Já o sector de atividade que tem mais profissionais em risco de burnout é o da saúde. “E, de um modo geral, os profissionais da Função Pública – com destaque para a Administração Central – têm piores indicadores de saúde mental do que os do sector privado”, completou Tânia Gaspar.