A antiga comentadora e apresentadora Megyn Kelly não perdeu muito tempo a lançar críticas ao “Papa dos imigrantes ilegais”. André Ventura ajustou a sua posição em relação a Francisco, mas “continuaria a discordar dele por receber assassinos”.
O Papa Francisco, nascido Jorge Mario Bergoglio, morreu na segunda-feira.
Enquanto a maioria dos católicos de todo o mundo chora o pontífice em oração e reflexão sobre o seu legado, a apresentadora da Megyn Kelly usou o primeiro episódio do seu podcast na SiriusXM após a morte de Francisco para atacar o bispo de Roma.
Kelly, que foi jornalista e comentadora da Fox News e apresentadora da NBC antes de se dedicar ao podcasting, criticou particularmente o legado progressista de Francisco no que diz respeito à imigração e à pobreza.
A antiga jornalista acusou o papa de ter encaminhado a Igreja Católica “numa direção de esquerda” no que diz respeito à sua compaixão pelos imigrantes.
Apenas um dia antes de morrer, Francisco usou o seu discurso de Páscoa para chamar a atenção para a hostilidade para com os Megyn Kelly. O discurso foi proferido logo após a visita do vice-presidente JD Vance ao Vaticano, no domingo de Páscoa, nota a NPR.
“A Igreja tem participado na vinda de imigrantes para cá, encontrando-lhes alojamento e ajudando-os a permanecer aqui, independentemente do facto de estarem aqui ilegalmente”, disse Kelly, que se afirma católica desde sempre. “E o Papa Francisco não teve de lidar com isso“.
“Muitos de nós, na Igreja Católica, perguntamo-nos por que é que estamos a fazer donativos ao domingo”, continuou Kelly.
“Os católicos conservadores, como eu, fomos apanhados num conflito entre as mensagens do Papa e o que ele queria que acreditássemos serem ensinamentos católicos profundos, e o que entendemos como americanos que estão a ver os nossos cidadãos serem assassinados nas ruas por estas pessoas”, acrescentou.
Durante o primeiro mandato de Donald Trump, o Papa Francisco expressou ocasionalmente posições críticas em relação ao presidente norte-americano, em particular a propósito da construção do muro que agora separa os EUA do México para evitar a entrada de imigrantes sul-americanos.
Segundo Kelly, indefetível apoiante de Trump, o presidente norte-americano apenas está “dedicado a livrar-se deste tipo de pessoas, que o Papa Francisco apenas olhava como vulneráveis e indefesas“.
“Sabe quem é vulnerável e indefeso?” pergunta Kelly. “Laken Riley“.
Em fevereiro de 2024, Laken Riley, estudante de enfermagem de 22 anos, foi assassinada, enquanto fazia jogging no campus da Universidade da Georgia, por José Antonio Ibarra, um imigrante venezuelano anteriormente acusado de roubo nas instalações da universidade.
“É sonso ou hipócrita?”
O papado de Francisco não foi totalmente consensual dentro da Igreja Católica, particularmente entre os fiéis mais conservadores, que criticaram frequentemente as posições “demasiado progressistas” que assumiu.
Conhecida a notícia da sua morte, inúmeras personalidades públicas, políticos e líderes partidários manifestaram o seu pesar e prestaram homenagem ao sumo pontífice — de forma mais contida, no entanto, nos setores mais à direita, onde também se foram ouvindo mais vozes críticas às posições de Francisco.
O líder do Chega, André Ventura, que durante a Jornada Mundial da Juventude terá mesmo “fugido para a Madeira” para evitar o Papa, foi um dos últimos a reagir à morte de Francisco, que recordou como “um exemplo para todos os que querem servir a causa pública“.
Esta terça-feira, em conversa com Júlia Pinheiro num programa de entretenimento na SIC, a apresentadora confrontou Ventura com a sua aparente mudança de posição em relação ao Papa.
“No passado, fez críticas ferozes ao Papa e disse, entre outras coisas, que prestou um mau serviço. Ontem, disse que o Papa Francisco deixa uma marca inspiradora de proximidade e simplicidade. Diga-me lá, é sonso ou é hipócrita?“, questionou Júlia Pinheiro.
“Nem uma nem outra. Nós podemos ter liberdade, mas em Portugal estamos habituados a não ter críticas. Eu fiz críticas a este Papa, quando entendeu que podíamos receber todos os imigrantes, e eu discordei dele“, respondeu Ventura.
“Continuaria a discordar se ele estivesse aqui à minha frente, respeitosamente, mas discordaria, porque não tenho duas caras, não tenho uma para dizer uma coisa e outra para dizer outra”, acrescentou.
“Não podemos receber toda a gente de qualquer forma. Discordaria do Papa quando, em vez de receber políticos italianos, recebeu o Fidel Castro. O Fidel Castro é um assassino, é um ditador“, exemplificou Ventura. “Acho que a Igreja não o deve receber. A Igreja não deve receber assassinos”.
O líder do Chega poderá ter razão num aspeto: segundo a base de dados do Archivo Cuba, há cerca de 8.100 mortos ou desaparecidos atribuídos à Revolução Cubana e ao regime de Fidel Castro “durante duas ditaduras, de 1952 até agora”.
Falhou num pequeno detalhe: Francisco nunca recebeu Fidel Castro. O Papa foi na realidade recebido em Havana pelo ditador cubano, então com 89 anos, durante uma visita a Cuba e aos Estados Unidos em setembro 2015.