Estava destinado a ter Alzheimer, evitou-o durante décadas. Mas como?

Num caso excecionalmente raro, um doente com um elevado risco genético de desenvolver Alzheimer parece ter evitado o seu provável destino durante décadas.

De acordo com o Science Alert, a situação do homem é apenas o terceiro caso deste tipo registado e o único para a mutação PSEN2 — os outros dois casos foram um tipo diferente de Alzheimer genético.

Uma equipa de investigadores tem vindo a acompanhar a doença na família deste homem desde 2011, no âmbito de um projeto destinado a compreender melhor a doença de Alzheimer herdada de forma dominante.

A mãe do homem sofria da mutação PSEN2, que se crê conduzir ao início da doença de Alzheimer ao acelerar a aglomeração de amiloide, embora ainda não se saiba exatamente como funciona.

11 dos seus 13 irmãos também tinham esta mutação genética e a todos foi diagnosticada a doença de Alzheimer por volta dos 50 anos.

Então a pergunta que se impôs foi: “Como é que este homem resistiu à maldição da família?”

Os cientistas estudaram o caso do homem na esperança de que a sua história pudesse desvendar um mecanismo mais universal por detrás da doença.

Tanto nas formas genéticas como não genéticas da doença de Alzheimer, os depósitos de amiloide acumulam-se lentamente no cérebro até os níveis atingirem um ponto crítico. Juntamente com uma outra proteína chamada tau, isto conduz direta e indiretamente à morte dos neurónios e, em última análise, ao declínio cognitivo.

Ao longo de 10 anos de estudo publicado na Nature Medicine — conduzido pela geneticista populacional Maria Victoria Fernandez, da Universidade Internacional da Catalunha, e pelos neurocientistas Jorge Llibre-Guerra e Nelly Joseph-Mathurin, ambos da Universidade de Washington em St Louis — a memória e os testes cognitivos do homem permaneceram todos normais.

Os testes genéticos excluíram as mutações protetora que tinham sido encontradas nos dois outros doentes que tinham resistido à doença de Alzheimer contra as suas probabilidades genéticas.

Embora o seu cérebro estivesse repleto de amiloide aos 61 anos, como seria de esperar de alguém com a mutação PSEN2, apresentava drasticamente menos inflamação do que os doentes de Alzheimer.

As proteínas taus detetadas estavam confinadas ao lobo occipital, “o que explica potencialmente a preservação das funções cognitivas”, referem os autores.

Para alguém com Alzheimer, a tau estaria normalmente muito mais disseminada e nem sequer parecia ter impacto nos resultados visuais ou espaciais dos testes.

“Este padrão de deposição restrita de tau é semelhante aos casos de resiliência extrema relatados anteriormente”, observam os autores. “Esta contenção da patologia da tau, uma característica comum nos indivíduos extremamente resilientes atualmente conhecidos, pode ser um fator crítico para atrasar o aparecimento dos sintomas de Alzheimer”.

O estudo de caso abre algumas linhas de investigação, sendo a mais importante o facto de uma abundância de amiloide não parecer conferir a doença de Alzheimer a este homem em particular.

Os autores suspeitam que, em casos como este, em que os depósitos de tau são impedidos de se espelharem, a sequência que conduz aos sintomas típicos da doença de Alzheimer pode ser ser interrompida, ou significativamente abrandada, independentemente da amiloide.

O homem tinha nove variantes genéticas que estavam ausentes nos seus familiares afetados pelo PSEN2. Seis destas variantes nunca tinham sido associadas à doença de Alzheimer, mas estão envolvidas na inflamação do cérebro e na dobragem de proteínas.

A equipa pensa que uma combinação improvável destes genes e os anos de exposição do homem a altas temperaturas, enquanto trabalhava como mecânico num navio de marinha com motor a diesel, podem tê-lo desviado do caminho normal do PSEN2.

“A exposição crónica a este tipo de stress pode ativar as vias celulares envolvidas na resposta ao choque térmico e na dobragem de proteínas, que têm sido implicadas na resiliência celular em doenças neurodegenerativas”, afirmam os cientistas.

“Compreender os mecanismos que restringem a disseminação da tau neste indivíduo pode fornecer informações cruciais sobre potenciais alvos terapêuticos para prevenir ou retardar a progressão da doença de Alzheimer”, concluem.

Teresa Oliveira Campos, ZAP //

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