“Micróbios da morte” revelam quando um corpo congelado morreu

Mário Cruz / Lusa

Obter uma estimativa precisa da morte de alguém é uma parte crítica das investigações forenses, mas, em condições extremamente frias, a biologia molecular pode fornecer informações impercetíveis a olho nu.

Estimar o tempo da morte, também conhecido como intervalo post-mortem, é uma tarefa complexa que desempenha um papel importante em investigações forenses, na medida em que permite apurar a linha do tempo de eventos que levaram ao falecimento de uma pessoa.

Normalmente, os especialistas estimam o tempo da morte através da observação de mudanças físicas e biológicas post-mortem no corpo, como enrijecimento, acumulação de fluidos e arrefecimento. No entanto, estes métodos são limitados pela sua variabilidade e dependência de fatores externos.

Segundo o Live Science, calcular o intervalo post-mortem tornou-se mais preciso com o advento da biologia molecular, mas ainda é uma tarefa desafiante, especialmente em condições climáticas extremamente frias.

Recentemente, uma equipa de cientistas forenses usou biologia molecular e bioinformática para desenvolver ferramentas para ajudar os investigadores a estimar com mais precisão o intervalo post-mortem.

A investigação, cujo artigo científico foi recentemente publicado na Frontiers in Microbiology, permitiu descobrir que estudar os micróbios envolvidos na decomposição pode ajudar a prever, com alta precisão, o tempo decorrido desde a morte de uma pessoa em condições de frio extremo.

O estudo foi realizado em Grand Forks, na Dakota do Norte, uma das cidades mais frias dos Estados Unidos, onde os invernos são caracterizados por temperaturas que podem atingir os -40 graus Celsius e ventos fortes.

Neste ambiente extremamente frio, os métodos tradicionais podem não ser suficientes para avaliar a decomposição e estimar o tempo da morte, isto porque o corpo arrefece muito mais rápido, podendo distorcer as estimativas baseadas na temperatura corporal.

Além disso, este tipo de ambientes pode atrasar o início e a duração do rigor mortis, ou enrijecimento do corpo, assim como o processo de decomposição.

É neste âmbito que técnicas moleculares avançadas, como a análise do microbioma, a expressão genética e a degradação de proteínas, podem ajudar a fornecer informações sobre a cena do crime.

Cada organismo tem características microbianas distintas que agem como uma impressão digital. O necrobioma, uma comunidade de micróbios associada a restos em decomposição, desempenha um papel determinante neste processo.

Há micróbios específicos presentes durante diferentes fases de decomposição, que contribuem para a quebra de tecidos e a reciclagem de nutrientes. Os investigadores forenses podem recolher amostras destes micróbios para deduzir há quanto tempo uma pessoa morreu com base na composição da população microbiana.

A investigação concentrou-se na análise de padrões nas mudanças microbianas que ocorrem durante a decomposição em ambientes extremamente frios. Durante um período de 23 semanas, a equipa recolheu e analisou 393 amostras de micróbios de dentro e de fora dos narizes de porcos mortos cobertos de neve.

Estes animais decompõem-se de forma semelhante aos humanos e são muito usados ​​em pesquisas forenses.

Depois de desenvolverem modelos para estimar o intervalo post-mortem, através da comparação de dados genéticos microbianos com dados ambientais, os cientistas descobriram que as espécies bacterianas Psychrobacter, Pseudomonas e Carnobacterium podem prever melhor o tempo após a morte em condições extremas de inverno, até seis meses após o falecimento de uma pessoa, com uma margem de erro de pouco mais de nove dias.

Além disso, a equipa descobriu que algumas  espécies bacterianas são mais abundantes em diferentes intervalos de tempo. Os níveis de Psychrobacter, por exemplo, aumentam cinco semanas após a morte e são mais abundantes em 10 semanas, enquanto os níveis de Pseudomonas aumentam entre as cinco e as nove semanas e atingem um pico nas 18 semanas.

As principais espécies microbianas que os investigadores identificaram no estudo serviram como biomarcadores de morte, permitindo desenvolver modelos que os especialistas podem usar para superar as limitações inerentes à examinação visual dos restos mortais.

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