Sem utilizar proteínas naturais, uma equipa de investigadores criou células com citoesqueletos funcionais que podem mudar de forma e reagir ao ambiente que as rodeia.
Num novo estudo, uma equipa de investigadores da Universidade da Carolina do Norte (UNC), nos EUA, manipularam ADN e proteínas, os blocos de construção essenciais da vida, para criar células que se parecem com e agem como células do corpo.
Os resultados do estudo, liderado pela professora da UNC Ronit Freeman, foram apresentados num artigo publicado esta terça-feira na revista Nature Chemistry.
A proeza, inédita neste domínio, tem implicações para os esforços em matéria de medicina regenerativa, sistemas de administração de medicamentos e ferramentas de diagnóstico.
“Com esta descoberta, podemos pensar em engenharia tecidos, que nos permitiria criar tecidos que podem ser sensíveis a mudanças no seu ambiente e comportar-se de forma dinâmica”, diz Freeman, em comunicado da universidade publicado no EurekAlert.
As células e os tecidos são constituídos por proteínas que se juntam para realizar tarefas e criar estruturas. As proteínas são essenciais para formar a estrutura de uma célula, chamada citoesqueleto.
O citoesqueleto permite que as células sejam flexíveis, tanto na forma como na resposta ao seu ambiente. Sem ele, as células não seriam capazes de funcionar.
Sem usar proteínas naturais, o Laboratório Freeman construiu células com citoesqueletos funcionais que podem mudar de forma e reagir ao ambiente que as rodeia.
Para o fazer, usaram uma nova tecnologia programável de péptido-ADN que orienta os peptídeos — os blocos de construção das proteínas — e material genético adaptado, para trabalharem em conjunto na formação de um citoesqueleto.
“O ADN não aparece normalmente num citoesqueleto“, diz Freeman. “Reprogramámos sequências de ADN para que atuasse como um material arquitetónico, ligando os peptídeos entre si. Quando este material programado foi colocado numa gota de água, as estruturas ganharam forma“.
A capacidade de programar o ADN desta forma significa que os cientistas podem criar células para servir funções específicas e até afinar a resposta de uma célula a fatores de stress externos.
Embora as células vivas sejam mais complexas do que as células sintéticas criadas pelo Laboratório Freeman, são também mais imprevisíveis e mais susceptíveis a ambientes hostis, como as temperaturas elevadas.
“As células sintéticas mantiveram-se estáveis mesmo a temperaturas de 50°C, abrindo a possibilidade de fabricar células com capacidades extraordinárias em ambientes normalmente inadequados à vida humana”, afirma Freeman.
Estes tecidos, explica Freeman, não são feitos para durar: são desenhados para desempenhar uma função específica — e depois modificam-se para servir uma nova função. A sua aplicação pode ser personalizada através da adição de diferentes peptídeos ou ADN para programar células.
Estes novos materiais podem integrar-se noutras tecnologias de células sintéticas, todas com aplicações potenciais — que podem revolucionar domínios como a biotecnologia e a medicina.
“Esta investigação ajuda-nos a compreender o que faz a vida“, afirma Freeman. “Esta tecnologia de células sintéticas não só nos permitirá reproduzir o que a natureza faz, como também fabricar materiais que ultrapassam a biologia.”