Holocausto: profissionais de saúde deveriam estudar o que os médicos fizeram

Dnalor 01 / Wikimedia

Campo de concentração de Auschwitz

A ideia é reforçar a sua educação e ética médica. Há “equívocos que circulam há muito tempo” para minimizar a responsabilidade da profissão.

O papel desempenhado pela medicina no Holocausto durante o nazismo deve ser estudado pelos atuais profissionais de saúde para reforçar a sua educação e ética médica, segundo um estudo divulgado por uma comissão da revista científica The Lancet.

Os crimes não foram cometidos apenas por médicos extremistas” ou “sob coação”, segundo os resultados deste estudo publicado na revista científica britânica, que afasta “equívocos que circulam há muito tempo” para minimizar a responsabilidade da profissão.

Em 1945, 50 a 65% dos médicos alemães não-judeus aderiram ao partido nazi. Uma proporção “muito superior a qualquer outra profissão académica”, segundo este documento de cerca de 80 páginas baseado em fontes universitárias, descrito como “o mais completo” produzido até à data “sobre as atrocidades cometidas”.

No total, os programas de eugenia e eutanásia e “experiências humanas brutais” realizadas em ambiente médico causaram “pelo menos 230.000 mortes“, entre deficientes, pacientes judeus e deportados, incluindo 7.000 a 10.000 crianças. Foram realizadas cerca de 300 mil esterilizações forçadas.

“Ao contrário da crença popular”, a “medicina na Alemanha nazi não era uma pseudociência” e a “investigação nazi” por vezes “tornou-se parte integrante do cânone do conhecimento médico”, observa o relatório, citado pela agência France-Presse (AFP).

Por exemplo, “a compreensão atual dos efeitos do tabaco e do álcool no corpo foi alimentada por pesquisas realizadas durante a era nazi”.

Alguns criminosos alcançaram fama duradoura após a guerra, sem nunca revelar o contexto das suas investigações, como o reitor da Universidade de Viena, Eduard Pernkopf.

O seu atlas anatómico de referência, publicado em diversos países e utilizado sem polémica até à década de 1990, foi produzido a partir de cadáveres de pessoas assassinadas.

Uma fundadora da psiquiatria infantil, Elisabeth Hecker, também foi celebrada durante décadas, com a Alemanha a conceder-lhe a Ordem do Mérito em 1979, apesar de ter enviado numerosos menores, colocados sob a sua autoridade, para a morte.

Além disso, “os métodos desenvolvidos” entre 1939 e 1941 para matar pacientes com gás foram depois reutilizados em grande escala “nos campos de extermínio na Polónia”, recorda o estudo.

Os autores recomendam que estes factos históricos sejam integrados nos currículos de formação dos profissionais de saúde, porque é “muitas vezes surpreendente quão limitado é o seu conhecimento” atualmente, independentemente de uma vaga noção das experiências de Josef Mengele em Auschwitz.

Mas também vão mais longe, afirmando que este dever de memória deve permitir aos médicos aprender a opor-se às diretivas que colocam dilemas éticos.

O relatório cita cuidadores que supervisionam os interrogatórios de terroristas, aqueles que praticam triagem em hospitais durante fluxos em massa de pacientes ou que supervisionam o fim da vida.

Esta investigação foi realizada no âmbito de uma comissão da Lancet que reuniu pela primeira vez cerca de vinte especialistas internacionais para abordar a história da medicina.

// Lusa

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