Cientistas mapearam os genes da mulher que nunca sente dor

Os genes de uma mulher que não sente dor foram mapeados pela ciência. As descobertas são promissoras e podem ajudar no desenvolvimento de novos medicamentos.

Os cientistas parecem ter descoberto a razão pela qual há pessoas que não sentem dor. Trata-se de um mecanismo desencadeado por uma mutação genética rara.

A pesquisa foi baseada em células de uma mulher escocesa que apresentou essa mutação genética.

Jo Cameron despertou o interesse da comunidade científica, em 2013, depois de o seu médico ter reparado que, após duas cirurgias, não precisou de analgésicos.

A culpa era de uma mutação,FAAH-OUT, dada a conhecer num estudo publicado em 2019 no British Journal of Anaesthesia, que desliga o gene FAAH.

Joe Cameron apresentava uma mutação rara nesse gene, que fazia com que não sentisse dor. As suas cicatrizes também saravam muito mais depressa do que o normal, e era menos propensa a sentimentos de ansiedade e medo.

No novo estudo, publicado esta quarta-feira na revista Brain, os cientistas dizem ter descoberto a razão pela qual a mutação genética de Jo Cameron tem esse “poder”.

“A descoberta inicial da raiz genética do fenótipo único de Jo Cameron foi um momento extremamente emocionante, mas é com estas descobertas recentes que as coisas começam, realmente, a ficar interessantes”, diz o professor James Cox, autor principal do estudo e investigador da University College London.

A equipa descobriu que a mutação FAAH-OUT regula a forma como o gene FAAH se expressa. Ou seja, quando a mutação de Jo Cameron atua, ela faz reduzir as enzimas produzidas e usadas pelo FAAH, desativando o gene.

Foi também descoberto que a mutação FAAH-OUT ativou mais 797 genes e desativou 348 – nos quais se incluíam genes relacionados com a cicatrização de feridas, humor, ansiedade e medo.

Isto explica a razão pela qual Jo Cameron não tinha medo, não sentia ansiedade e tinha feridas que cicatrizavam tão rápido, dizem os autores do estudo, que consideram que estas conclusões abriram caminhos muito importantes.

“Ao entender precisamente o que está a acontecer ao nível molecular, podemos começar a entender a biologia envolvida, e isso abre possibilidades para a descoberta de medicamentos, que um dia poderão ter impactos positivos de longo alcance, para os pacientes”, afirma James Cox.

Os cientistas esperam agora conseguir desenvolver novas aplicações médicas, incluindo tratamento da dor, cicatrização de feridas e quadros depressivos.

“Além da base molecular para a ausência de dor, essas explorações identificaram caminhos moleculares que afetam a cicatrização de feridas e o humor, todos eles influenciados pela mutação FAAH-OUT”, referiu Andrei Okorokov, um dos autores do estudo, também pesquisador da University College London.

“O gene FAAH é apenas um pequeno canto de um vasto continente, que este estudo começou a mapear”, prometeu Andrei Okorokov.

Miguel Esteves, ZAP //

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