Pobreza energética: 315 testemunhos entregues ao Governo. Doenças, humidade e bolor na lista

A entrega dos testemunhos faz parte da campanha “Casa Quente para Toda a Gente”. Pobreza energética afeta cerca de 20% da população portuguesa.

Humidade, bolor ou infiltrações estão, além do desconforto térmico causado pelo frio, entre os problemas enunciados em 315 testemunhos sobre pobreza energética que a associação ambientalista Zero vai entregar esta terça-feira ao Governo.

A entrega dos testemunhos faz parte da campanha “Casa Quente para Toda a Gente”, que decorre há alguns meses, para alertar e sensibilizar a população para a pobreza energética em Portugal.

Entre os 315 testemunhos, oriundos de 118 concelhos do país, houve quem se queixasse de que as lareiras não combatem o frio, que o preço do gás é incomportável para uma família de classe média com dois filhos, quem revelasse que tem problemas respiratórios e passa o inverno doente ou ainda que o frio que sente em casa dá origem a contraturas musculares, o que se reflete em perda de produtividade no trabalho.

À agência Lusa, o presidente da Zero adiantou que entre os problemas mais destacados pelas pessoas que participaram num inquérito online estavam a humidade, o bolor, as infiltrações, problemas relacionados com o facto de o país ter “muitas construções muito antigas, com fraco isolamento térmico, com janelas antigas”.

“Há aqui um peso absolutamente fundamental da qualidade da construção”, salientou Francisco Ferreira, apontando que o desconforto térmico associado ao frio “tem um peso muito grande”, apesar de os meses mais quentes também influenciarem o conforto térmico das habitações.

Acrescentou que a maior parte dos inquiridos referiu que tem de recorrer à climatização artificial para aquecer a casa durante o inverno, apesar de muitas delas não terem capacidade financeira para o fazer, com “uma substancial maioria” a utilizar aquecimento elétrico, como radiadores a óleo, “que são muito ineficientes”, mas também o aquecimento a gás.

“Passamos pela roupa quente, pelos cobertores, pelas mantas. É, portanto, uma difícil gestão daquilo que é tentar ultrapassar estas situações de frio que durante o inverno surgem”, adiantou.

Segundo Francisco Ferreira, o objetivo da campanha é alertar o Governo e destacar a falta de qualidade geral dos edifícios, razão pela qual a Zero vai entregar os 315 testemunhos nos ministérios do Ambiente e Ação Climática, e da Habitação.

Francisco Ferreira disse que a pobreza energética afeta cerca de 20% da população portuguesa e lembrou que um dos alertas da associação, que será repetido esta terça-feira, é a exigência de uma estratégia nacional de longo prazo para o combate ao fenómeno, “um elemento essencial a ser aprovado e implementado”.

Para o presidente da Zero, tanto esta estratégia como a de longo prazo para a renovação de edifícios são “elementos fundamentais para as populações mais vulneráveis que realmente não conseguem lidar com a questão difícil e complicada da pobreza energética”.

Francisco Ferreira apontou que o preço da energia é um elemento muito importante quando se pensa em soluções para o combate à pobreza energética, “mas não é estruturante”, defendendo que seja feito um levantamento de todas as famílias que “efetivamente estão em situações mais dramáticas de pobreza energética” e que sejam feitas obras nos edifícios.

“Isso é que é verdadeiramente estruturante e isso são muitos milhares de euros”, apontou.

Na opinião do presidente da Zero, trabalhar por uma climatização ativa é uma ajuda, mas não é aquilo que depois se traduz numa melhoria do conforto térmico, quando se olha do ponto de vista da sustentabilidade em termos de habitação.

Importa, por isso, trabalhar pela melhoria do conforto térmico no longo prazo, com intervenções ao nível das janelas, no tipo de isolamento e no que leva a gastar menos energia no futuro para garantir conforto térmico.

Referiu que os casos mais preocupantes estão nas zonas centro e norte interior do país, entre as populações com menos rendimentos ou com menos capacidade de intervenção, e nas construções datadas dos anos 1970 e 1980 do século passado, para os quais é preciso “encontrar soluções mais rapidamente”.

Com a entrega dos testemunhos nos dois ministérios, a Zero espera ajudar a tomar consciência de que não basta uma casa para viver, é preciso garantir que todas as pessoas conseguem usufruir de conforto térmico, e que os concursos de financiamento em matéria de habitação passem a ser mais céleres.

// Lusa

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