Os nossos cérebros sofrem mudanças à medida que envelhecemos. Um novo estudo revelou que em pessoas com problemas de adição de cocaína essas alterações acontecem a um ritmo mais acelerado.
A cocaína é uma das substâncias que mais causam vício, interferindo com as vias de recompensa do cérebro e forçando as células a bombear sinais agradáveis até que a droga se desgaste. Estimativas norte-americanas, relatou o Science Alert, sugerem que uma em cada cinco pessoas que consomem cocaína desenvolvem o vício.
A forma como a cocaína evoca comportamentos viciantes ao interferir com as células cerebrais, que por sua vez, criam o abuso de substâncias, é uma cadeia de eventos que os investigadores ainda estão a tentar compreender.
Uma possibilidade reside nas modificações não codificantes feitas ao ADN dentro das células do cérebro, o que altera a forma como os seus genes são ligados e desligados. Nesta investigação, a equipa analisou os padrões destas alterações epigenéticas numa região cerebral desiganda por Área 9 de Brodmann (BA9) .
Situada no córtex pré-frontal – a parte frontal do cérebro, por trás da testa -, acredita-se que a BA9 é essencial para o auto-conhecimento e controlo inibitório; duas coisas que ficam confusas quando há consumo de substâncias.
Muito do que se sabe sobre os efeitos da cocaína nas células cerebrais provém de estudos em ratos. Poucas investigações analisaram os efeitos duradouros da cocaína no tecido cerebral humano. Dois estudos detetaram regiões de ADN que mostram uma metilação excessiva no cérebro de pessoas com dependência.
Neste novo estudo, publicado recentemente na Frontiers in Psychiatry, os investigadores analisaram os tecidos cerebrais humanos recuperados post-mortem, tendo encontrado o mesmo padrão: os consumidores de cocaína tinham secções de ADN festonadas com grupos metilo na BA9.
Essas reações são alterações químicas que se acumular com a idade e em doenças relacionadas com a idade.
Para chegar a estes resultados, os investigadores compararam os níveis de metilação do ADN em amostras de tecido cerebral de 21 pessoas que tinham distúrbios provocados pela cocaína e outras 21 que não tinham.
A metilação do ADN é considerada uma das marcas moleculares do envelhecimento. Tipicamente, a presença de mais grupos metilo diminui a atividade dos genes próximos porque a maquinaria da célula já não pode aceder às instruções genéticas contidas no seu interior.
Sabendo como os grupos metilo se ligam ao ADN ao longo do tempo, a metilação do ADN pode ser utilizada como um “relógio epigenético” para ver se os tecidos envelhecem mais depressa ou mais lentamente em comparação com a idade cronológica.
Neste estudo, os investigadores utilizaram dois relógios epigenéticos diferentes para contabilizar as variações.
“Detetámos uma tendência para um envelhecimento biológico mais forte no cérebro em indivíduos com distúrbio provocado pelo uso da cocaína em comparação com indivíduos sem distúrbio”, disse Stephanie Witt, uma das autoraa do estudo e bióloga molecular do Instituto Central de Saúde Mental, na Alemanha.
“Isto pode ser causado por doenças no cérebro relacionadas com a cocaína, tais como inflamação ou morte celular”, continuou.
Os investigadores consideram que estas alterações moleculares podem contribuir para as mudanças funcionais e estruturais de alto nível observadas no cérebro das pessoas com dependência de cocaína e, por sua vez, para os aspectos comportamentais da toxicodependência.
Entre as sequências que mostraram as mais fortes alterações na metilação do ADN neste estudo encontram-se dois genes que, de acordo com investigações anteriores, regulam os aspetos comportamentais da ingestão da droga em ratos.
No entanto, os investigadores reconhecem que o seu estudo foi pequeno e que é necessária mais investigação.
“Como a estimativa da idade biológica é um conceito muito recente na investigação da dependência e é influenciada por muitos factores, são necessários mais estudos para investigar este fenómeno, com amostras maiores”, indicou Stephanie Witt.
Estudos maiores também ajudariam a afastar os efeitos de outras condições, tais como perturbações do humor, que frequentemente acompanham as perturbações do uso de substâncias. Muitos dos doadores falecidos neste estudo sofreram de depressão, o que pode ter alterado a sua função cerebral de outras formas.
Os investigadores também tiveram em consideração se os doadores estavam intoxicados quando morreram ou se tinham usado medicamentos para tratar a depressão ou outras condições.