Resíduos plásticos podem ser alimento para bactérias. Mas isso não é tão bom como parece

Ralph Pace, CC BY-ND

Anualmente, mais de 8 milhões de toneladas de polímeros sintéticos entram no oceano. Desses, alguns afundam, outros regressam à costa, mas uma parte significativa não é contabilizada.

Embora não se tenha a certeza, investigadores acreditam que algum desse plástico pode estar a servir de alimento para bactérias. Uma experiência realizada recentemente em laboratório mostrou que a bactéria marinha Rhodococcus ruber pode decompor-se lentamente e digerir o plástico feito de polietileno.

O polietileno é usado em grande parte em embalagens, sendo o tipo de plástico mais produzido no mundo. Embora não seja claro se a Rhodococcus ruber está, de facto, a alimentar-se desses resíduos, a nova investigação, publicada recentemente no Marine Pollution Bulletin, confirma que tal é possível.

Segundo avançou o Science Alert, estudos anteriores encontraram estirpes dessa bactéria a flutuar em densos filmes celulares, nas superfícies de plásticos. Além disso, uma investigação de 2006 sugeria que o plástico por baixo da bactéria estava a decompor-se a um ritmo mais acelerado do que o normal. O novo estudo confirma esse resultado.

“Esta é a primeira vez que provamos que as bactérias digerem realmente o plástico em CO2 e noutras moléculas”, indicou o ecologista microbiano Maaike Goudriaan, do Royal Netherlands Institute for Sea Research (NIOZ).

Para chegar a estes resultados, a equipa expôs amostras de plástico à luz UV e colocaram-nas em água do mar artificial. “o tratamento com luz UV foi necessário porque já sabemos que a luz solar decompõe parcialmente o plástico em pedaços do tamanho de uma mordida para bactérias”, explicou o investigador.

De seguida, a equipa introduziu uma estirpe da bactéria no local. Ao medir os níveis de um isótopo designado por carbono-13, os autores estimaram que os polímeros nas suas experiências desintegravam-se a uma taxa de cerca de 1,2% ao ano.

Os investigadores não conseguiram determinar a influência da lâmpada UV na deterioração do plástico em comparação com a atividade dos micróbios, mas as bactérias estavam claramente a desempenhar um papel. As amostras bacterianas após a experiência mostraram membranas de ácidos gordos que foram enriquecidas com carbono-13.

A taxa identificada de decomposição do plástico no estudo atual é demasiado lenta para resolver o problema da poluição nos oceanos, mas indica para onde poderá ter ido uma parte dos resíduos em falta.

“Os nossos dados mostram que a luz solar pode ter degradado uma quantidade substancial de todo o plástico flutuante que tem sido depositado nos oceanos desde os anos 50”, indicou a microbiologista Annalisa Delre. Os micróbios podem ter digerido alguns dos restos deixados pelo Sol.

Desde 2013, os investigadores têm advertido que os micróbios estão provavelmente a prosperar em manchas de plástico no oceano, formando um ecossistema sintético. Há até provas de que algumas dessas comunidades microbianas estão a adaptar-se à ingestão de diferentes plásticos.

Em estudos anteriores foram também identificadas bactérias e fungos específicos, em terra e no mar, que parecem comer plástico. Embora esse conhecimento possa ajudar a reciclar melhor os resíduos antes que esses acabem na natureza, as suas outras utilizações são controversas.

Alguns cientistas propuseram que libertássemos equivalentes de plástico em pontos quentes de poluição. Outros não estão tão seguros de que isso seria uma boa ideia. Enzimas e bactérias de engenharia que decompõem o plástico podem parecer uma ótima forma de fazer desaparecer os resíduos, mas alguns especialistas estão preocupados com os efeitos secundários não intencionais nos ecossistemas naturais e nas teias alimentares.

Ate porque, no final de contas, a decomposição do plástico não é necessariamente uma coisa boa. Os microplásticos são muito mais difíceis de limpar do que peças maiores e esses pequenos restos podem infiltrar-se nas teias alimentares.

Num estudo realizado em 2020, cada amostra de marisco testada num mercado da Austrália continha microplásticos. O que isso está a causar à saúde humana e animal é desconhecido.

“Muito melhor do que limpar, é prevenir. E só nós, humanos, podemos fazer isso”, referiu ainda Maaike Goudriaan.

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